POLÍTICA EXTERNA DO GRANDE BRASIL DE PEQUENAS RELAÇÕES COM OS PALOP: uma resenha crítica da tese  

POLÍTICA EXTERNA DO GRANDE BRASIL DE PEQUENAS RELAÇÕES COM OS PALOP: uma resenha crítica da tese  

RIZZI, Kamilla Raquel. O grande Brasil e os pequenos Palop: política externa brasileira para Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe (1974-2010). Tese de Doutorado em Ciência Política, UFRGS, Brasil, Porta Alegre: 2012, pág. 301.

Ricardino Jacinto Dumas Teixeira

Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira

Avenida da Abolição, CE 62790-000, Brasil

ricardino@unilab.edu.br

Introdução

Esta resenha buscou dialogar com a tese “o grande Brasil e os pequenos PALOP: a política externa brasileira para Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe”, apresentada pela pesquisadora brasileira Kamilla Raquel Rizzi ao Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, no Brasil.

A análise foi estruturada em três momentos: (I) o contexto da pesquisa e o caminho metodológico seguido para a construção do corpus; (II) a análise da política externa do Brasil para Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe e (III) as considerações finais sobre questões analisados, a fim de proporcionar um espaço para o estreitamento de diálogo entre os pesquisadores e tornar a tese acessível ao público leitor.

Contexto e o caminho metodológico

Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tome e Príncipe são países ex-colônias de Portugal em África, recentemente independentes (anos de 1970), com uma longa história de relacionamento comum com o Brasil, marcado, particularmente, pela presença portuguesa. No contexto apresentado pela autora, o Brasil emerge como estado central na tese, enquanto Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe, em conjunto, foram considerados “pequenos Palop” ou Estados periféricos na dinâmica da política externa.

Conceitualmente, a política externa foi assumida como resultado de uma combinação das necessidades internas com os interesses externos que definem uma configuração particular, onde os Estados promovem suas alianças e influem, de modo distinto, no sentido de preservar ou equilibrar seu status quo na arena internacional (pág. 15). Aqui, a unidade de análise foi a geopolítica do sistema-mundo, de acordo com a configuração das necessidades do sistema capitalista vivenciado pelos Estados em suas políticas externas. Foram configuradas três formas de uma política externa: a) a primeira forma é a cooperação; b) a segunda é a coerção; e a c) terceira é a integração ou intercâmbio entre Estados, com os quais um Estado central estabelece com outro Estado periférico.

A tese seguiu uma linha cronológica: anos de 1974 a 1990, marcado pela bipolaridade; anos 1990 a 2002, caracterizado por mudanças na conjuntura global e anos de 2003 a 2010, marcados por multilateralismo, reforçado no âmbito das relações do Sul.

Para coletado de dados, foram consultados o Arquivo Histórico do Centro de Documentação oficial do Itamaraty e da Embaixada de Cabo Verde, ambos em Brasília, no Brasil. Levou-se em consideração a identificação de discursos, acordos, tratados e visitas relacionados à rotina burocrática do serviço diplomático. Os dados foram ampliados com entrevistas ao representante brasileiro, em Praia, embaixador Vitor Candido Pain Gobato, e ao representante cabo-verdiano, em Brasília, embaixador Daniel Pereira e através de contatos por e-mail com os encarregados de negócios. Os quais, suponho, sejam os de Guiné-Bissau e de São Tomé e Príncipe que, por alguma razão, seus depoimentos não apareceram na tese.

Da bibliografia utilizada, periódicos, documentos oficiosos, acordos, tratados, discursos, visitas, comunicados, telegramas e entrevistas, resultou no corpus da tese, que serviu se de base para a análise a partir da identificação de pautas diplomáticas, demandas, exportações e importações que pareceram na análise da política externa entre esses países.

Análise da política externa brasileira para Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe

A análise de dados se iniciou no contexto do chamado “mundo lusófono”, cujo eixo articulador foi o comércio, aliado à escravização, à evangelização e à colonização,

no contexto do tráfico transatlântico de pessoas e migração forçada de africanos, tendo o Brasil como seu principal destino.

Cabo Verde e São Tomé e Príncipe emergiram como Estados a partir de um projeto colonial, baseado no discurso da mestiçagem e da criolização, com forte tendência cristã. Em Cabo Verde, à época, os principais produtos de exportação foram urzela, coros, algodão, aguardente, sebo e açúcar, sustentados por uma economia de exportação controlada por proprietários de terra, geralmente, portugueses e seus descendentes.

Em São Tomé e Príncipe se predominou a produção de cana-de-açúcar e cacau, introduzidos no país pelos portugueses. Já em Guiné-Bissau distinguiram-se os lançados e grumetes, grupos envolvidos no comércio e nos movimentos cívicos, além de grupos étnicos, cuja mão-de-obra foi introduzida no trabalho forçado e na produção do amendoim, arroz, algodão e a entrega coercitiva das colheitas e melhores terras ao Estado colonial.

A busca pelo “desenvolvimento” foi a base sobre a qual se assentou a política externa do Brasil para África. Em Cabo Verde (anos de 1974 a 1990) as relações com o Brasil acentuaram-se na formação de quadros da Administração Pública, cuja “falta de quadros qualificados nas instituições públicas eram um dos principais empecilhos para o fortalecimento de Cabo Verde” (pág. 181).

Outro setor priorizado foi o de transporte aéreo, tendo em conta as condições geográficas do país, constituído por dez ilhas. “Cabo Verde chegou a oferecer ao Brasil um entreposto no Aeroporto Internacional de Sal para a Embraer” (um conglomerado transnacional brasileiro), para a criação de uma linha área regular que recolhesse cargas no Brasil para vários destinos, incluindo destinos africanos, passando por Cabo Verde.

No campo do comércio exterior, nas relações entre o Brasil e Cabo Verde, destacou-se o refino de petróleo de Angola, por parte da empresa brasileira de combustíveis (Petrobras). Com a democratização (anos de 1990), a pauta de demanda se intensificou, na qual “a eficácia da gestão da ajuda pública e privada para o desenvolvimento permitiu que Cabo Verde figurasse entre os países que receberam mais ajuda per capita (pág. 159), reforçando, assim, sua inserção no mercado. “A valorização do mercado, presente no III Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), de Cabo Verde, foi o instrumento dessa dinamização de gestão de recursos para seu desenvolvimento”. Da parte brasileira, a pauta do Atlântico Sul sempre foi um ativo da política externa do Brasil para Cabo Verde. Houve que considerar a localização estratégica de Cabo Verde, como ponto nodal no comércio transatlântico.

Distintamente de Cabo Verde, a política externa do Brasil para Guiné-Bissau esteve diretamente vinculada à instabilidade política, em decorrência de sucessivos golpes de Estado. Enquanto Cabo Verde priorizou a formação dos seus funcionários da administração pública e investimento em transporte de navegação aérea, Guiné-Bissau, sob o risco de perpetuar a política de golpe de Estado, privilegiou, nas relações com o Brasil, a formação militar no âmbito das reformas das Forças Armadas e das Forças Polícias.

No campo de ensino superior, Guiné-Bissau compartilhou com Cabo Verde algumas similitudes. Suas demandas pelo Programa de Estudantes Convênio de Graduação (PEC-G) e Pós-Graduação (PEC-PG) nas relações de cooperação com o Brasil. Outro ponto comum entre Cabo Verde e Guiné-Bissau foram as linhas de créditos liberados por instituições financeiras brasileiras (a exemplo do Banco do Brasil), por intermédio da Agência Brasileira de Cooperação. Contudo, a política de cooperação externa com Brasil revelou problemas estruturais de dependência externa. Isso porque a política de linha de crédito beneficiava literalmente o Brasil, enquanto país central, reproduzindo, em outras formas, a cooperação tradicional.

Por exemplo, a empresa brasileira Yamaha se beneficiou do crédito para exportar quatrocentos motos RX-80 para a Guiné-Bissau”. No que se refere às relações comerciais guineenses, apenas nos anos de 1990, houve as primeiras importações por parte do Brasil, num “valor muito simbólico”. Contudo, anos 1990, ainda que residual, o comércio exterior da Guiné-Bissau para o Brasil era muito significativo, em comparação com o período atual. Os principais produtos importados de Guiné-Bissau pelo Brasil foram cerâmicos e derivados de alumínios, caldeiras e reatores para uso industrial, plásticos e, em menor grau, importação de produtos básicos, bem alimentícios, como açúcar, arroz, café e carnes (pág. 164).

Bastante semelhante foi a média de exportações do Brasil para África, também considerado residual do ponto de vista comercial: oscilou se de 4,9% (anos 1974 a 1979) para 6,7% (anos 1979 a 1985). Desse porcentual, depreendeu-se duas consequências da política externa brasileira: sua natureza precária, dada pela incipiente presença nas relações com África; e sua natureza contraditória, na medida em que, discursivamente, a política externa brasileira fundamentou-se, ao longo dos anos, nos pressupostos da cooperação do Sul, mas com pouco resultado em suas relações externas de cooperação.

Em Cabo Verde, a presença de Portugal foi mais significativa. Isso se deveu a experiência colonial no arquipélago e, mais recentemente, da diáspora cabo-verdiana em Portugal que fez com que o governo português usasse dessa presença como um instrumento de pressão política nas negociações com Cabo Verde, com mais de trinta mil cabo-verdianos em território português, cujas remessas financeiras contribuíram para o sustento de quase cem mil famílias cabo-verdianas que vivem nas diversas ilhas.

Em São Tomé e Príncipe (de 1975 a 1990) se privilegiou as relações com Brasil no setor da agricultura e pecuária, em especial na produção de cacau, centrada até então na monocultura de uma economia de plantation, em que o Estado se assumiu como empresário. A questão militar aproximaria São Tomé e Príncipe de Guiné-Bissau, mais acentuada no caso guineense, marcado por sucessivos golpes de Estado. Outra característica foi a centralização do poder na figura do presidente Manuel Pinto da Costa e tentativas de golpes de estado na construção de sua nacionalidade e no processo de transição política para a democracia, em que a África reassumiu a importância para a defesa e segurança do Atlântico Sul.

Também foi um período no qual se verificou uma forte retração econômica, na América Latina, no governo Sarney e Collor (no Brasil), anos de 1980. Com a crise dos anos de 1980, na América Latina, com implicações em África, o Movimento de Libertação de São Tomé e Príncipe (MLSTP, hoje partido) reorientou, gradualmente, sua política externa, deslocando-a do antigo bloco soviético para Ocidente (p.195). Isso resultou “em empréstimos com o Banco Mundial (BM) e com o Fundo Monetário Internacional (FMI), principalmente para reabilitação das plantações de cacau santomense, através de gestão estrangeira por créditos multilaterais de financiamento”.

O Estado brasileiro, em função da crise, foi obrigado a redirecionar a base de sua política externa para o setor de educação para África, por meio de concessão de vagas e bolsas de estudos de ensino superior para formação de uma elite nativa africana que pudesse ser favorável às relações com o Brasil.

A análise que se possa fazer dessa política externa brasileira teve duas implicações substantivas. Em primeiro lugar, foi com base na política educacional de ensino superior que o Brasil encontrou justificativas para reforçar sua influência político, através de discurso do “destino comum” e “fundamentos históricos”, em detrimento de relações comerciais e políticas efetivas.  Em segundo lugar, foi através da política de cooperação de ensino superior que o Brasil encontrou os “fundamentos ideológicos” de sua política externa na arena internacional e no âmbito da cooperação do Sul, em que o discurso de “solidariedade” e da “horizontalidade com a África ganhou centralidade nesse período.

Houve um elemento contraditório introduzido nessa política externa, que tem a ver com o descompasso entre o discurso de “horizontalidade” e de “responsabilidade” pelos fracassos de acordos de cooperação. Isso porque na documentação diplomática da representação brasileira, em São Tomé e Príncipe, aliada aos fracassos, foram frequentes expressões como “desorganização do governo santomense” e “inexistência de profissionais aptos para finalizar os projetos”, que nunca saíram do papel. Entendeu-se, então, que a responsabilidade pelo fracasso da política externa brasileira foi estritamente do governo santomense, pela ausência de condições técnicas, não do governo brasileiro.

Essa responsabilização, unilateral, tem algumas consequências: a primeira se houvesse sucesso da cooperação seria atribuído a liderança brasileira no âmbito da cooperação do Sul, mas, como houve fracasso, a responsabilização pendeu-se sobre os ombros de “um estado disfuncional santomense”; já a segunda implicação é o fato de que o discurso da desresponsabilização tentou negar o próprio fundamento da “cooperação solidária” a partir da qual o Brasil baseou discursivamente sua política externa para África em geral e São Tomé e Príncipe, em particular. Observou-se, aqui, uma outra contradição: a “horizontalidade” foi utilizada para depois negá-la, sobretudo, em casos em que ações externas da cooperação brasileira se fracassaram.

Nesta ótica, o discurso de uma comunidade de sangue, da cultura e da história, supostamente compartilhada pela presença portuguesa, passou a ser um significante vazio, sem correspondência em ações concretas no encaminhamento de soluções adequadas, efetivas e urgentes nas relações entre o Brasil e a África para resolução de problemas. Caberia perguntar até que ponto a fraca presença brasileira em ações substantivas de sua política externa nos “pequenos Palop” dificultou sua inserção na arena internacional. Isto porque a redução de cooperação Sul-Sul com os países africanos acabou por reforçar a dependência do Brasil da cooperação Norte-Sul.

Entendo que a justificativa que o Brasil pode ter encontrado para se afastar da África e aprofundar relações Norte-Sul se justificaria por razões políticas e econômicas, nesse período. No primeiro caso – razões políticas – tem a ver com a visão hegemônica que se tinha/tem da África no Brasil, marcado pela lógica escravista, ditada por um contexto de marginalização. No segundo caso – razões econômicas – a crise de 1980 na América-latina, com repercussões mundiais, resultou na diminuição de exportações e importações do Brasil com países objetos de analise nessa tese. A saída encontrada pelo Estado brasileiro foi a de reforçar a política de solidariedade com África e de cooperação com os países de Norte para tentar superar a crise.

No caso da política externa de São Tomé e Príncipe para o Brasil, houve que realçar o centralismo em que o poder político e administrativo foi aglutinado na figura do ex-presidente santomense Manuel Pinto da Costa, que liderou seu país de 1975 até 1991 e de 2011 até 2016. Embora São Tomé e Príncipe tenha sido o primeiro país ex-colônia de Portugal em África a iniciar o processo de transição política para a democracia, com a realização de suas primeiras eleições multipartidárias em 1991, o processo de democratização ficou solapado pela ingerência militar na política doméstica, através de sucessivos tentativas de golpes de Estado registrados no país: as de 1995, 1998, 2003 e 2009, o que distanciaria São Tomé Príncipe de Cabo Verde, sem experiência de intervenção militar no seu processo de transição política.

Uma análise da postura centralizadora adotada pelo então presidente santomense Manuel Pinto da Costa aproximaria da postura assumida pelo então presidente guineense, João Bernaldo Vieira, tanto no regime de partido único oficioso, quanto no processo de transição política para a democracia.

Também o Estado de Cabo Verde procurou redimensionar sua política externa de cooperação internacional para dar respostas imediatas a crise financeira, através de promoção de investimento da China na construção de infraestruturas: construção da Assembleia Nacional Popular, barragens, pontes, estradas, promoção de turismo e desenvolvimento marítimo e, recentemente, construção da Universidade Pública de Cabo Verde. A Região Administrativa Especial de Macau da República Popular da China, um importante entreposto comercial chinês, tem servido de ponto nodal da presença chinesa em África, cujos países contaram, há décadas, com o apoio da China para suas independências. Relações com a China não foram objeto da tese, mas me pareceu oportuno aponta-las, para se demarcar da presença brasileira.

A recuperação econômica, nos anos 1990, tanto no Brasil, quanto nos países africanos, beneficiou uma retomada gradativa nas relações entre o Brasil e a África, também no que se refere a política externa, em que o Brasil procurou se adaptar à nova geopolítica internacional, em nome daquilo que se convencionou chamar de “multilateralismo” da política externa brasileira.

Anos de 2003 a 2010 ficaram marcadas por uma nova guinada na política externa do Brasil para Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe, em um contexto internacional de democratização dos Estados nacionais, altamente competitivo do ponto de vista político e econômico. Outro dado ausente na tese, no caso africano, entre 2000 e 2016, houve forte crescimento econômico no Continente, em média 4,6% ao ano, superior à América Latina e Caraíbas, em média 2,9% (base de dados de UNDESA, 2017). Isto possibilitou novas reconfigurações da política externa brasileira, pois, foi à luz desse crescimento da África, que o Brasil renegociou sua posição e discurso com o Continente.

O governo do presidente Luís Inácio Lula da Silva (de 2003 até 2010), em seus dois mandatos, imprimiu, sem dúvida, um novo conteúdo à política externa do Brasil, diferentemente dos governos antecedentes e precedentes. Considerado pragmático, carismático e nacionalista (pág. 260), suas ações basearam-se no entendimento de uma ordem mundial multipolar, fazendo alianças no nível dos países do Sul e contestando a hegemonia dos países centrais desenvolvidos. Segundo Kamilla Raquel Rizzi (pág. 209), em política externa, Lula reintroduziu o Estado como negociador, incorporando, deste modo, alguns instrumentos introduzidos em segundo plano durante os dois mandatos do governo de Fenando Henrique Cardoso, tanto do ponto de vista econômico quanto político. Aqui, haveria uma aproximação com São Tomé e Príncipe, quando o Estado assumiu o papel de empresário, centrada na figura do presidente Manuel Pinto da Costa.

No campo econômico, houve um crescimento exponencial: um crescimento médio de 325% entre o início e o final dos dois mandatos do presidente Lula. A nível mundial, com 0,99% das exportações, em 2003, esse percentual aumentou para 1,35%, em 2010 (pág. 214). Um elemento importante aqui foi uma tentativa de diminuir a dependência externa do Brasil da cooperação Norte-Sul.

No campo da cooperação técnica, base da política brasileira para os países africanos, houve um visível crescimento em todas as áreas, com uma atuação mais concreta da agência Brasileira de Cooperação (ABC), coadjuvado pelo Ministério das Relações Exteriores. As principais áreas de cooperação com o Brasil foram educação, cultura, comércio exterior, agricultura, pecuária, ciência e tecnologia. A capacidade de Lula da Silva representar as diretrizes da política externa fez com que ele conseguisse transitar livremente em vários países africanos. Como destacou Kamilla Raquel Rizzi (215) “nenhum governo na história do Brasil tenha empreendido qualitativamente e quantitativamente sua ação externa dessa maneira para África, como ocorreu no governo do ex-presidente Lula, em questões multilaterais”.

No setor da educação de ensino superior, por exemplo, no final do ano de 2010, havia aproximadamente cinco mil alunos estrangeiros em instituições brasileiras, incluindo, principalmente, os estudantes da África e da América-Latina. No caso especifico dos países africanos, especialmente Palop, houve ampliação de formação de quadros nacionais, forjados no campo ideológico brasileiro. Um dos instrumentos dessa ampliação foi a Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (Unilab). “A Unilab caracterizou sua atuação na cooperação internacional e intercâmbio acadêmico e solidário com os Estados membros da Comunidade dos Países da Língua Oficial Portuguesa (pág. 209). Com a finalidade de realça-lo, aprofundou-se o discurso de “solidariedade”, um conceito de valor político que reforçou a inserção de Lula em África e no cenário internacional.

Embora possuísse presença em África em diversas esferas de sua política externa, o governo Lula manteve relações estreitas de cooperação com países centrais, como Estados Unidos, Europa e antiga metrópole, como foi indicado na tese.

Na atualidade, a posição brasileira no cenário internacional, no sentido de garantir sua autonomia, ficou comprometida com as mudanças de governo assumidas por Jair Bolsonaro, eleito presidente do Brasil em outubro de 2018. A marginalização do Brasil no exterior, a exemplo de sua política externa para África, recuou em todos os aspectos.

Embora, teoricamente, se tratasse de uma política externa de Estado, o distanciamento do Brasil nas relações diplomáticas com os países africanos foi condicionado pela dinâmica governamental e partidária, com implicações substantivas na mudança de governo. Houve, assim, condicionamentos políticos com implicações econômicas do Brasil para Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe, vice-versa, que vão para além de questões meramente técnicas da cooperação internacional no âmbito da política externa do grande Brasil, mas de pequenas relações com os Palop.

A minha singela homenagem ao Professor Doutor Leopoldo Amado

Foi na madrugada do passado dia 25 de Janeiro que recebi a triste notícia do falecimento em Dacar-Senegal, do Ilustre Filho da Guiné-Bissau, nosso Brilhante Académico, Historiador; um dos melhores investigadores que a Guiné-Bissau gerou e que nos deixa um legado científico vasto e por explorar, não só na sua área de formação, mas numa diversidade complementar de tantas áreas Académicas das Ciências Sociais, sobretudo.

Do Brilhantismo de um Intelectual como tu, recordo-me das nossas divergências, em momentos distintos de conjunturas políticas na nossa Guiné-Bissau; as tais divergências que ajudam a amadurecer pessoas de mente aberta, e a elucidar consciências.

Sim, estivemos de costas voltadas várias vezes, porque cada um de nós fez sempre questão de sustentar, com teimosia, seus pontos de vista, entre evidências e, ou a falta delas, face à situação política da nossa Guiné-Bissau. Não importa, agora, de que lado estava a razão, face às disputas que tivemos, mas sim, reconhecer que as nossas confrontações intelectuais ajudaram-nos a conhecer melhor a realidade histórica, política, social e cultural da nossa Guiné-Bissau, capacitando-nos para melhores contributos ao nosso País.

Porém, foram mais e de maior registo, os momentos bons da nossa convivência patriótica, fraterna e de amizade!

Do que guardarei de ti, sempre, é a certeza de que foste, até ao teu falecimento, o único Académico Guineense a reconhecer, promover, e a valorizar todos os teus compatriotas, motivando-os a fazerem mais e melhor pela nossa Guiné-Bissau!

Onde quer que estejas, sei que me autorizas a partilhar uma das nossas mensagens, para sustentar o reconhecimento, a admiração e a estima que sempre tive por ti.

de: Leopoldo Amado leopoldo.amado@gmail.com
para: Fernando Casimiro <didinhocasimiro@gmail.com>
data: 15/12/2016, 23:16

Caro Casimiro

Li com bastante atenção e deleite o admirável texto de apresentação do teu/nosso livro. Não podias ter melhor apresentação que, alias, remete-nos, a um tempo, para a literariedade subjacente e o realismo envolventes da obra. Que admirável assertividade! Para mais, o texto vem escrito numa linguagem simples, mas carregada de imagens, de afectos e de advertências, estas ultimas, curiosamente, bem calibradas. Bom, mais não digo sobre este quase divino texto, algo arrancado, esteticamente falando, das profundezas do nosso sentir patriótico (algo profundo, simultaneamente ontológico e complexo, ainda por se estudar), mas também das labirínticas circunvoluções mentais que a mítica e mística África (Guiné-Bissau, incluido) suscita no imaginário colectivo dos não-africanos. No caso em apreço, esta “approch”, quiçá involuntária, galgou os limites do belo da natureza e da magnificência do nosso profundo sentir. Dir-se-ia mesmo que este texto, simplório ate demais, mas profundo ate dizer chega (!), marcara de forma indelével o porvir de uma nova forma de literariedade política, de resto, muito em gestação galopante entre os guineenses, sobretudo da diáspora.
Tudo isso para te dizer, caro Didinho e primo (que o somos!, depois explico-te como, se bem que para o caso isso pouco importa) que esta obra, de três volumes,  interessa-me sobremaneira, pelo seu putativo potencial contributivo e, igualmente, pela substancia que encerra, independentemente dos juízos de valor do autor que aqui e acolá comporta,  e com o qual podemos ou não concordar (isso são outros quinhentos!).
Assim, convido-te a poderares comigo a possibilidade de o lançarmos a tua obra no INEP, na tua terra (Nha Tchon), com distinta e elevada solenidade, porque mereces, bastando para tal a evocação da tua entrega total à sua laboração, aliás, também confirmada pela autora de serviço do belíssimo texto de apresentação da mesma.
Parabéns Casimiro, bem-haja Didinho.
Melhores saudações.
Leopoldo Amado, Ph.D

Director-Geral do INEP –  Instituto Nacional de Estudos e Pesquisa
Tel. +245 95968410 ou +245966601731
e-mail: leopoldo.amado@gmail.com
Nome Skype: leopoldo.amado45
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Mesmo com tanto para fazer, lias tudo, de todos, ignorando que o dia tem 24 horas e que entre o dormir e o acordar, também precisavas de te dedicar a ti e à tua família.

A Academia preencheu a tua vida, enriquecendo-te com conhecimentos, que se transformaram igualmente em sabedorias, de uma vida vivida com encanto e sem arrependimentos, certamente, digo eu…

Pena que tenhas partido tão cedo, quando tinhas muito para dar à tua família, à nossa Guiné-Bissau, à nossa África, e ao nosso Mundo…

Parafraseando  Fréderic François,

“Il faut dire je t’aime
À tous ceux qu’on aime
Tant qu’ils sont vivants, vivants
Il faut dire je t’aime
À tous ceux qu’on aime
Tant qu’il en est temps, encore temps”

Professor Doutor Leopoldo Amado “Poio”, meu estimado primo e amigo, descansa em Paz!

Didinho 14.02.2021


UM TRABALHO DE EXCELÊNCIA – ENTREVISTA DO JORNAL O DEMOCRATA AO PROFESSOR DOUTOR LEOPOLDO AMADO

DA EMBRIOLOGIA NACIONALISTA À GUERRA DE LIBERTAÇÃO NA GUINÉ-BISSAU

Simbólica de Pindjiguiti na óptica libertária da Guiné-Bissau

Elegia ao Professor Pinto Bull

OS G’s que decidiram o final do Império colonial

A HISTÓRIA DA VACINA DA POLIOMIELITE

A HISTÓRIA DA VACINA DA POLIOMIELITE

Com todo o interesse na discussão da investigação da vacina oral da pólio para prevenir a Covid 19, pensei que valia a pena fazer um resumo da história por detrás desta vacina que salvou milhões de vidas.

O vírus da poliomielite é um enterovírus da família do picornavírus, responsável pela lesão do neurónio motor inferior que, por seu turno, causa paralisia flácida assimétrica.

                 Dr. Jonas Salk

A primeira vacina da pólio – IPV (vacina inactivada da pólio), injectada via intramuscular, foi produzida pelo Dr. Jonas Salk, usando o vírus que cultivou nas células renais de chimpanzés e que inativou com formalina.

Em 1954 esta vacina foi testada simultaneamente no Canadá, Estados Unidos e Finlândia em 1.6 milhões de crianças e foi aprovada para uso nos Estados Unidos em Abril de 1955.

As estirpes do vírus usadas para a vacina foram: Mahoney (tipo 1), MEF-I (tipo 2), e Saukett (tipo 3).

                        Dr. Albert Sabin

Em 1960 o Dr. Albert Sabin descreveu no JAMA (revista da associação médica americana), os resultados de um estudo de investigação feito em 26,033 crianças numa cidade da América do Sul, usando uma vacina oral contra a pólio.

Esta vacina, contrariamente à vacina do Dr. Salk, é uma vacina que utiliza um vírus vivo, mas atenuado.

As estirpes usadas nesta vacina oral: P1, P2, P3.

A vacina oral foi usada em Cuba em 1962.

Como a vacina inativada do Dr. Salk já estava a ser usada, de início houve muita relutância em usar uma vacina oral com vírus vivo atenuado nos Estados Unidos.

O Dr. Sabin deu as amostras a um casal da então União Soviética (Dr. Mikhail Chumakov e Dra. Voroshilova) que administraram a vacina oral primeiro neles próprios, depois nos filhos e, depois, convenceram as autoridades soviéticas a usá-la em milhões de crianças na Estónia e na Lituânia.

Depois destas experiências, a vacina oral (viva, atenuada) da Pólio foi aprovada nos Estados Unidos e usada até 1979; agora, somente a vacina inativada é usada.

Devido ao custo e eficácia, a vacina viva atenuada oral (OPV) ainda é usada nos países em vias de desenvolvimento.

Entre 1968 e 1975 a Dra. Voroshilova, numa investigação envolvendo 320 pessoas observou que havia menos mortalidade resultante da Influenza em pessoas imunizadas com outras vacinas, incluindo a OPV.

Embora a OPV seja muito eficaz e quase sem efeitos nocivos, há 3 síndromas que podem resultar da sua aplicação:

1VAPP (poliomielite paralítica associada com a vacina) – somente 1 em 2.7 milhões de indivíduos. Acontece mais com a primeira dose.

2VDPV (vírus da poliomielite resultante da vacina oral).
Este vírus é uma  mutação da estirpe do vírus atenuado da OPV e pode causar paralisia em seres humanos.

3cVDPV (vírus da poliomielite resultante da vacina oral e que circula no ambiente).

Nos últimos 10 anos, 24 surtos de cVDPV ocorreram em 21 países, resultando em 750 casos de paralisia.

É deste pano de fundo que chegamos ao momento atual: USO DA VACINA ORAL DA PÓLIO (OPV) para prevenir ou reduzir o risco de mortalidade pelo coronavírus:

Por um lado, cientistas eminentes como o Dr. Robert Gallo (co-descobridor, juntamente com o Dr. Luc Montagnier – France – do vírus da SIDA), e o Dr. Peter Chumakov (sim, o filho do cientista russo que juntamente com a esposa fez a investigação da OPV na União Soviética) estão a puxar para a investigação da OPV contra o coronavírus, teorizando que redirecionar vacinas é o tópico mais quente no mundo da imunologia e mesmo que a OPV confira imunidade contra a Covid 19 por somente um mês, podia salvar muitas vidas.

Por outro lado, a maioria dos cientistas está muito relutante em começar esta investigação, por motivos que enumeramos em artigos anteriores e acima neste artigo.

No presente, o ponto da situação é este:

A Rússia (620,794 casos de coronavírus e 8,781 mortos), aprovou o estudo.

O Irão (217,724 casos e 10,239 mortos), e a Guiné-Bissau (1,556 casos e 19 mortos), planeiam, ou estão em vias de começar o estudo.

Como podem ver, a polémica, por motivos que podem elicitar neste e noutros textos anteriores, é válida e justificável.

A nossa apreciação por uma das investigadoras (Amabélia Rodrigues – desculpa por não pôr nenhum título associado ao nome, mas não o puseram no artigo que li – DW), por ouvir as nossas preocupações e prometer ir com a vontade da população…

Todos nós, guineenses por nacionalidade, ou guineenses por naturalidade, queremos o bem-estar da população guineense, e é muito bom ter esta plataforma para opinar e discutir assuntos importantes como este.

Agora, cabe às populações e ao governo, depois de se digerir todas as opiniões e informações, decidir se os benefícios ultrapassam /outweigh, os riscos da investigação.

Um pingo de sabedoria:

Tento, pelo menos uma vez por mês telefonar para os Senhores: Dr. Francisco Gaspar dos Santos (Chico Fos), um dos poucos médicos especializados em Imunologia; quase impossível de encontrar, mesmo aqui nos Estados Unidos; Dr. Pedro Cunha (Pipi Cunha) e Dr. João Procópio Landim Augusto  Pinhel (Gungo de Mana Chambu Tchutcha), não só por amizade e respeito que tenho por eles, mas para “pick their brain “- explorar os seus conhecimentos/sabedoria!

Porque, por mais que estudes, investigues, não há substituto para a experiência! Sempre saio mais sábio depois de cada conversa que tenho com eles. Temos que aproveitar a opinião destas raridades!

PARA OS JOVENS MÉDICOS E OUTROS PROFISSIONAIS DE SAÚDE GUINEENSES: HÁ MUITO QUE PODEMOS APRENDER COM ESTES SÁBIOS E EVITAR ERROS DO PASSADO.

É SÓ TELEFONAR OU ENVIAR UM EMAIL! NÃO CUSTA MUITO…

O que teria sido o futuro do mundo aquando da segunda guerra mundial, se não fosse por haver líderes maduros como o Roosevelt, Churchill ou Stalin?

Claro que quando metemos o Donald Trump na equação, toda esta teoria vai por água abaixo, mas fomos nós que o elegemos, agora estamos no purgatório da Divina Comédia de Dante Alighieri com ele …!

Desculpem por este longo artigo, mas hoje estou de folga, angariando forças para resumir as tarefas de lidar com doentes com Covid-19 nas unidades de cuidados intensivos – a infecção está outra vez a subir (nenhuma surpresa, com um presidente que se recusa a pôr uma máscara…!

Djoca

26.06.2020

AINDA MAIS CONFUSO…

AINDA MAIS CONFUSO…

Quando Um Homem Surdo Oferece para Ajudar um Homem Cego a encontrar o caminho Certo…

Parece que a cada dia que passa, quanto mais explicaçōes, mais confusão na minha mente…!

Acabei de ler uma notícia publicada pela DW sobre uma entrevista conduzida pela Agência LUSA, que um amigo meu me enviou, na qual um membro do Comité de Ética da Guiné-Bissau, teve a cortesia de nos explicar e clarificar sobre a investigação da vacina oral da Pólio!

1Um membro do Comité de Ética da Saúde na Guiné-Bissau diz que estudo não é para testar uma forma de prevenir a Covid-19. Investigação servirá para avaliar possível reforço da imunidade”!

No dia 11 de Junho de 2020, no jornal do Instituto de Virologia Humana (da Universidade de Maryland, Escola de Medicina), peço a vossa atenção para a seguinte passagem:

– Estudos em países sub-desenvolvidos têm mostrado que a Vacina Oral contra a Polio (OPV) está associada a reduções enormes de mortalidade, mesmo sem a existência de vírus da Poliomielite circulando no sangue (Segundo Dr. Christine Benn e Dr. Peter Aaby-da Dinamarca). Na Dinamarca, concluímos que crianças vacinadas com OPV têm menos risco de hospitalização por infeçōes de vias respiratórias. PENSAMOS QUE A OPV TEM A POSSIBILIDADE DE TER OS MESMOS BENEFÍCIOS NÃO ESPECÍFICOS NOS ADULTOS. NÓS VAMOS INICIAR EM BREVE UMA INVESTIGAÇÃO RANDOMIZADA, INCLUINDO 3400 ADULTOS COM MAIS DE 50 ANOS DE IDADE NA GUINÉ-BISSAU PARA VER SE A OPV PODE REDUZIR O RISCO DE CONTRAIR O COVID-19 E OUTRAS INFEÇŌES!

O ESTUDO É PARA TESTAR UMA FORMA DE PREVENIR A COVID-19

– Se a observação foi feita em crianças na Dinamarca, porque não tentar provar o mesmo em adultos, na Dinamarca?

O que penso é que com esta corrida a ver quem descobre a vacina contra a Covid-19 em primeiro lugar beneficiando de muitas regalias, iria ser muito mais difícil encontrar 3400 “voluntários” num curto espaço de tempo e, para além disso, muitos obstáculos iriam ser criados por Comités de Ética na Dinamarca!

2 – “Vários ativistas sociais e médicos guineenses insurgiram-se contra o estudo, frisando estar a ser feito sem que os padrōes internacionais estejam a ser respeitados, nomeadamente a comunicação pública prévia. É uma polémica desnecessária, mas que não ocorre com outros ensaios clínicos, até recomendados pela OMS na busca de tratamentos contra o Covid-19”.

É uma polémica absolutamente necessária, sim, por razōes que, eu, o Dr. Jorge Herbert e outros enumeraram em artigos anteriores: Por mais inócuo que seja o produto investigado, há que explicar detalhadamente ao sujeito investigado as potenciais consequências: hiperestimulação do Sistema imunológico, superinfecção em indivíduos tomando imunossupressores ou com orgãos transplantados etc., existência de instalaçōes adequadas para emergências que podem ocorrer durante o estudo.

3 – “disse não compreender que as mesmas vozes não se levantem contra o uso da hidroxicloroquina no tratamento da covid-19 na Guiné-Bissau”.

– Esta é uma surpresa para mim! Depois de estudos na Europa e nos Estados Unidos mostrarem que os riscos associados ao uso da hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19 ultrapassam os benefícios do seu uso, ainda há colegas usando hidroxicloroquina para o tratamento da Covid-19 na Guiné-Bissau?
Se for esse o caso, então AQUI LEVANTO A MINHA VOZ CONTRA O SEU USO!

4 – Segundo o responsável, a vacina contra a poliomielite foi criada nos anos 1950 —– e aplicada em milhōes de pessoas SEM QUALQUER EFEITO COLATERAL.

– Respeitosamente discordo!

Casos de paralisia, convulsōes etc., embora raros, estão descritos!

5 – “Não é a primeira vez que o Projecto de Saúde de Bandim realiza um estudo do género!

– Gostaria que nos fornecessem uma lista desses estudos; acredito que foram publicados em jornais de investigação – seria um motivo de orgulho meu rever e partilhar esses estudos com colegas meus.

Estamos a discutir este estudo porque lemos o anúncio da sua publicação através de jornais estrangeiros…

Junto vai um artigo da Iniciativa Global para Erradicação da Pólio.

Use-of-OPV-and-COVID-20200421

Investigação ainda em discussão, por causa de todas as preocupaçōes acima referidas.

DE NOTAR QUE A OPV (VACINA ORAL VIVA ATENUADA) NÃO TEM SIDO USADA NOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA DESDE 1979; SOMENTE A VACINA INATIVADA (IPV) ESTÁ DISPONÍVEL E USADA DESDE 1987 E CIENTISTAS ESTÃO PREOCUPADOS COM A REINTRODUÇÃO DO OPV SE INVESTIGAÇŌES FOREM APROVADAS NOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA, PARTICULARMENTE EM DOENTES IMUNODEFICIENTES.

COMO TEMOS VINDO A REALÇAR EM ARTIGOS ANTERIORES, A LÓGICA PARA O ESTUDO É PLAUSÍVEL, MAS O LUGAR E AS CONDIÇŌES ADEQUADAS PARA EMERGÊNCIAS E A POTENCIAL RAPIDEZ COM QUE O ESTUDO FOI APROVADO, NÃO!

Joaquim Tavares (Djoca)

24.06.2020

A TRANSPARÊNCIA DA INVESTIGAÇÃO

A Transparência da Investigação

Recebi hoje de manhã uma notícia relativamente à Guiné-Bissau, anunciando uma investigação do uso da vacina contra a Pólio para prevenir o Coronavírus.

Dias atrás, revi um artigo em que o Dr. Robert Gallo debruçou sobre este assunto: vacina oral contra a Poliomielite (Oral Poliovirus Vaccine-OPV) ajudou a reduzir a mortalidade pela infecção gripal Influenza e outras infecçōes virais: “porque não experimentar esta vacina no Coronavirus”?

Embora a teoria suportando esta investigação seja plausível, muitas questōes merecem respostas.

1 Porquê a Guiné-Bissau?

País com escassos recursos hospitalares, falta de oxigénio, carência de cuidados intensivos: se um dos investigados apanha uma reação adversa, vai ser transportado para a Dinamarca ou deixado morrer em casa?….

Por mais inócua que seja a vacina, o efeito desejado (objectivo da investigação) é aumentar a imunidade do sujeito investigado; O corpo humano reage diferentemente de pessoa para pessoa (em vez do esperado nível de imunidade, o que pode acontecer se o indivíduo desenvolve um excesso de imunidade, causando doenças como a hypersensitivity pneumonitis?

Temos capacidade para tratar estas consequências?

Investigaçōes deste tipo devem ser começadas (se não completamente conduzidas) em países com condiçōes para lidar com emergências ligadas aos produtos investigados.

A minha modesta opinião: comecem a investigação na Dinamarca (parece-me que os Lead investigadores são dinamarqueses) e depois de dados iniciais positivos, então podem “ajudar” o povo irmão da Guiné-Bissau!

2Atempadamente, ou seja, antes de iniciar esta investigação, houve anúncios nas rádios, nos jornais, na TV e outros canais de comunicação social, a informar o público sobre esta investigação?

3Sendo um estudo experimental, aos sujeitos do estudo foram fornecidos um formulário para consentir voluntariamente a investigação?

4Quando é que os líderes da investigação submeteram a proposta de estudo, e depois de aprovado, será que partilharam o resumo do estudo planeado com os potenciais sujeitos da investigação?

Em 1993 quando fui à Guiné para o funeral do meu pai, troquei impressões com alguns cientistas e estudantes dinamarqueses em Bissau, respeito muito a vontade de ajudar; o espírito de altruísmo que mostraram em relação ao povo guineense, mas estou muito preocupado com esta investigação: não com o objectivo da investigação em si, mas com o lugar da investigação, e se os sujeitos a ser investigados estarão devidamente informados antes de assinar o contrato.

É importante nunca esquecer o Código de Nuremberga:

1Consentimento Voluntário é essencial.

2Os resultados da investigação devem ser para o BEM da Sociedade.

3A Investigação em Humanos deve ser baseada em resultados de investigaçōes prévias em animais.

4As Investigaçōes devem ser conduzidas evitando sofrimento/lesão Física e Mental.

5Nenhuma Investigação deve ser conduzida se pensamos que pode causar morte/invalidez.

6Os riscos não podem exceder os benefícios.

7Facilidades adequadas (ex: Hospitais) devem ser usadas para proteger os sujeitos da investigação.

8As Investigaçōes devem ser conduzidas somente por cientistas qualificados.

9Os sujeitos da investigação podem optar por sair da investigação a qualquer momento.

10O Líder da Investigação deve estar preparado para terminar a investigação quando acontece uma lesão, Invalidez, ou morte do sujeito investigado.

Numa nota sobre o coronavirus, um trabalho de investigação foi divulgado nas últimas 24 horas (“oriundo da Inglaterra e feito em residentes na Inglaterra!!!): a dexametasona (um esteroide que andamos a usar por mais de 20 anos nos cuidados intensivos) na dose de 6mg/dia, pode reduzir a mortalidade nos doentes intubados (de 40% para 20%), ou doentes que necessitam de muito oxigénio (reduzindo o risco de morte de 25% para 20% – não tão impressivo neste caso).

Joaquim Tavares (Djoca)

16.06.2020

MD, FACP, FCCP, DABSM, FAASM, RPSGT, EDIC
EUROPEAN DIPLOMATE IN INTENSIVE CARE