A PROPÓSITO DE "OPRESSORES DE NÓS MESMOS"

 

 

M’bana N’tchigna

 

M´bana N´tchigna

 

mbatchi@yahoo.com.br

01.06.2008

Brasil

 

Estimados amigos e cidadãos guineenses,

Caro Fernando Casimiro (Didinho)

O menino Samuel Reis fala bonito e deixa gosto de querer ouvi-lo mais vezes.

Sou leitor assíduo do sítio do Projecto Contributo.

De momento, estou encantado com o menino Samuel Reis. Pelo que vejo, ele surgiu há pouco tempo no Projecto CONTRIBUTO e já fala com uma consciência sobre  o que somos enquanto filhos da Guiné-Bissau e de África em geral. Hoje li o seu artigo intitulado "OPRESSORES DE NÓS MESMOS", lançado ontem (dia 30.05.2008).

A mensagem do Samuel Reis está cheia de frases refletivas tão iguais a essa: Chegamos ao ponto em que não precisamos de opressor algum. Oprimimo-nos uns aos outros, aqui e em África, com inofensivos estudantes de liceu... Essa frase me remete a lembrar o que eu passei quando criança. Quando comecei a ir à escola os meus colegas e alguns professores queriam que eu mudasse de nome. O nome que constava na lista de chamada é o meu nome até hoje e orgulho-me dele. O nome em questão é: M’bana N’tchigna.

Para a turma esse nome não era fácil de pronunciar, não era nome de cidade, não era nome de pessoa civilizada. Só faltava dizer que não era nome de um ser humano. Esta forma de ver e de pensar, persiste em muitos guineenses e africanos. É claro que depois que sofremos a maldita colonização é que começou a negação de quem somos. Os nomes europeus ou árabes (semitas), começaram a aparecer como sendo mais bonitos do que nomes africanos.

 Um dia um dos meus colegas  abordou-me, começando a sugerir nomes para mim. Entre os nomes que me lembro até hoje, sugeriu os seguintes: António, Vasco, Júlio, Armando, Fernando e outros. Rejeitei-os todos. Mas insistentemente, foi sugerindo mais dizendo:

- Olha M’bana para não perderes totalmente o nome que o teu pai te deu, ele poderia ficar assim: António M’bana, Vasco M’bana, Júlio M’bana, Armando M’bana , Fernando M’bana, etc.  Rejeitei de novo todos estes nomes sugeridos por ele.

Perguntei-lhe o que esses nomes que  ele estava sugerindo para mim significavam e ele não soube me explicar. Como sou guineense, da etnia balanta e os balantas raramente colocam nomes aos filhos sem terem significado, falei para ele:

- Olha, eu sei o significado do meu nome e sei porque é que o meu pai me colocou  este nome, por isso, jamais o trocaria por outro que não sei o significado, só por ser um nome europeu ou semita. Ele olhou para mim e respondeu. Abó i di matu propi. Ou seja:  você é do mato mesmo.

Então Samuel Reis, como você bem contribuiu desta vez e vem contribuído sempre, tomara que nós guineenses ou africanos, comecemos a olhar para nós e a acharmo-nos bonitos e inteligentes como qualquer outro povo do mundo. Jamais podemos continuar a fazer o papel do colonizador contra nós mesmos. Se continuarmos a agir dessa maneira estaremos a dar razão à idéia salazarista. Salazar e os seus agentes da colonização achavam que os pretos não possuíam nada de valor, eram menos inteligentes e, consequentemente, menos humanos.

Essa forma de ver as coisas levou Salazar a pensar que a Guiné-Bissau  deveria ser colonizada da forma que Portugal bem entendesse na época. Presentemente, essa função vergonhosa de colonização é feita pelos “nossos” irmãos de sangue.

Voltando à questão do meu nome,  no ato de registro foi escrito de forma errada, como muitos nomes africanos (sempre escritos da maneira que não deviam ser). A grafia correta do meu nome deveria ser: MBANÃ NA TCHIKKNA que significa em dialecto balanta: A Prosperidade chegou.   O que hoje ficou é  M’bana N’tchigna.

Para terminar quero encorajar o Samuel Reis, aos demais guineenses e africanos a falarmos de nós mesmos. Não deixemos que alguém fale de nós, por nós. Muito menos que nos corrijam. Este papel, cabe a nós mesmos. 

 

ESPAÇO PARA COMENTÁRIOS AOS DIVERSOS ARTIGOS DO NÔ DJUNTA MON -- PARTICIPE!


A TER SEMPRE EM CONTA: Objectivos do Milénio

PROJECTO GUINÉ-BISSAU: CONTRIBUTO - LOGOTIPO

VAMOS CONTINUAR A TRABALHAR!

Projecto Guiné-Bissau: CONTRIBUTO

www.didinho.org