Uma viagem especial*



 

 

Padre Celso Corbioli

 

celsocorbioli@msn.com

 

13.05.2009

 

Pe. Celso CorbioliDizer que no trajecto Dakar-Bissau, acontecem imprevistos não é dar uma grande novidade: sabe-se que ao longo daquela estrada pode acontecer de tudo.

 

Não são assim muitos quilómetros, cerca de 650. Mas é preciso atravessar três países: o Senegal, a Gâmbia, novamente o Senegal e, finalmente, a Guiné-Bissau. Anexo um pequeno mapa para facilitar a compreensão.

 

Na manhã de 8 de Maio, saímos muito cedo de Dakar, por volta das 4h30. A minha intenção era chegar à minha missão de N'Dame, na Guiné-Bissau, porque no dia seguinte tinha um compromisso. Estava acompanhado por dois jovens voluntários senegaleses, Etienne e Jean-Marie. Viajava com a viatura deles, em direcção a Temente, a missão deles. Foi lá que na ida tinha deixado a minha velha viatura.

 

Não nos foi preciso muito tempo para chegar à fronteira com a Gâmbia (4 horas e meia). Nem as formalidades administrativas  (passaportes, alfândega ...) nos levaram muito tempo, porque o Etienne sabia como fazer. Eu estava contente, porque foi mais rápido do que previsto. Mas quando chegámos à jangada, perdemos todo o tempo que tínhamos ganho por causa de um camião que não conseguia entrar. E assim, passaram-se algumas horas. Mas finalmente chegou a nossa vez e atravessámos. Uma vez do outro lado, teríamos que percorrer ainda 20 km para sairmos da Gâmbia e voltar a entrar no Senegal. Passou-se tudo bem no controlo, graças ao nosso Etienne. Num curto espaço de tempo chegámos perto da fronteira, a uns 50 metros dela. Último controlo da polícia da Gâmbia. Desta vez, porém, de forma mais detalhada: faróis, pisca-pisca, carta de condução e ... buzina. Era eu que conduzia.

 

“A buzina funciona? Perguntou o polícia.

 

"Como não!" (Funcionou sempre!). Mas afinal não funcionava! Eu apoiava cada vez com mais força, mas nada. O Etienne também me ajudou, mas não saiu nenhum som. Olhei para o polícia e disse:

 

"Garanto-lhe, que funcionava até há bem pouco tempo”.

 

O policia olhava para mim (com uma certa satisfação). Parecia querer dizer: a quem quer ele fazer acreditar? Repeti:

 

"Pode parecer estranho, mas só agora, à sua frente, é que não funciona”.

 

Continuava a olhar para mim, mas nada convencido; parecia pensar: só dizem tolices! Era inútil insistir. Disse-me que encostasse o carro e que o seguisse. Entrámos num hangar coberto com ramagens. Disse-me claramente que era uma infracção grave e que, se eu tivesse que pagar a multa, custar-me-ia muito caro em tempo (teríamos que voltar a passar por aquela estrada cheia de buracos para chegar à Central da Polícia) e em dinheiro . Mas havia outra maneira: chegar a um acordo com ele. Fingi não entender e disse-lhe que em toda a minha vida de condutor nunca me acontecera uma coisa daquelas. Isso pareceu impressioná-lo, mas não a ponto de fazê-lo mudar de ideia. Disse-lhe ainda:

 

"Peço-lhe, simplesmente, que nos deixe ir. Assim que chegar ao mecânico, farei arranjar a buzina". Nada a fazer. Claro, teria sido muito mais fácil dar-lhe alguma coisa e partir, especialmente porque estávamos atrasados. Mas não disse nada. E, depois, naquela estrada poeirenta, eu tinha notado um aviso: "say no to bribery” ("não ao suborno). (A língua nacional da Gâmbia é o inglês, do Senegal o francês e da Guiné-Bissau o português).
Vendo que eu não tinha intenções de ceder, disse-me que esperasse pelo chefe. Este veio pouco depois. Era um homem dos seus cinquenta, de aspecto afável.

 

“Here is the boss.” (Aqui está o chefe, disse-me.


"Escute chefe, tenho um problema", disse-lhe eu sorrindo, "a buzina não funciona ...." (era inútil repetir-lhe a história toda, que primeiro funcionava etc.). "Peço-lhe apenas que me deixe partir.

Arranjaremos isso assim que chegarmos ao mecânico.”  "
 

"Sim, mas só se você nos der alguma coisa ..."

 

"Não tenho o costume de fazer essas coisas, chefe. Trabalho como missionário na Guiné-Bissau, e não estamos lá para fazer negócios, mas sim para ajudar. Porque você também não ajuda? ".
 

Olhou-nos de face e, após uma breve reflexão, fez um sinal de afirmação. E disse:

 

“Está bem, pode seguir, boa viagem”

 

“Obrigado chefe”

 

Entrámos no Senegal e poucas horas depois estávamos em Ziguinchor, a capital do Senegal do Sul (a dita Casamança). Como prometido, fomos ao mecânico. A trombeta da buzina tinha soltado e foi necessário soldá-la. Assim se passou mais um tempo. Chegámos a Temente às 7 da noite.

 

A estrada que levava a N’Dame não era assim tão longa (115 km), mas era preciso passar por uma estrada e atravessar a fronteira, numa zona de savana e floresta. Também na Guiné era preciso apanhar uma jangada que parava às 7h30 da noite (foi construída uma ponte, financiada pela União Europeia e que será inaugurada brevemente).

 

Sabendo que para além da fronteira havia uma missão (Ingoré), eu poderia lá chegar e continuar a viagem na manhã seguinte muito cedo, para apanhar a primeira jangada. Os meus confrades concordaram com esta ideia e assim recuperei a velha viatura que tinha deixado na ida (o papamoblie, para os que já ouviram falar dele) e dirigi-me para o mato. Como disse, é uma zona fronteiriça entre o Senegal e a Guiné, fácil de passar, por não haver controlos. Aos soldados senegaleses que encontrávamos de vez em quando, explicávamos quem éramos e deixavam-nos passar. Nessa noite não encontrei nenhum

 

Em África, a noite chega em poucos minutos, coisa que já eu sabia. Às 7h15 ainda se podia ver, mas às 7h30 já era escuro. Assim, após alguns km tive que acender as luzes. Recordava-me da estrada por tê-la feito em outras viagens. A um certo ponto encontrei um grupo de rapazes: pediam com insistência uma boleia. Decidi ajudá-los, uma vez que pareciam ir na mesma direcção que eu. Continuámos a viagem. Sabia que a certa altura, depois de uma pequena igreja, tinha que virar na primeira à esquerda. Tudo bem. Além disso, também sabia que deveria tomar a estrada seguinte à esquerda, mas quando lá chegámos gritaram dizendo que não era aquela a estrada que devíamos tomar.  

 

"Querem ver que não me recordo bem?" Disse. E continuámos em frente. Mas depois de algumas centenas de metros não sabia onde estava. Nunca tinha andado por aquela estrada. Chegámos a uma aldeia (nova para mim) e disseram-me:

 

“Nós paramos aqui”

 

"Mas eu tenho que ir a Ingoré. É esta a estrada?"
 

"Ah, não. Mas volta para trás e verás uma rua à direita, toma-a e vais encontrar o caminho.”

 

Fiz marcha atrás, virei e tomei a estrada indicada. Mas quanto mais avançava, mais confuso ficava. Não sabia onde estava. Havia outras estradas em todas as direções. Qual seria a correcta? Estava a perder paciência (comigo) e disse: "É o que se ganha quando se ajuda os outros! Se me tivessem deixado ir pela minha estrada...”  Era noite avançada. O forte canto do grilo e dos vários insectos que apreciei com prazer nas outras vezes, não me disse nada. Comecei a preocupar-me; tive vontade de voltar a Temente, mas arriscaria a não encontrar o caminho. A um dado momento pensei: tenho a certeza que vou conseguir desenvencilhar-me, pois sei para Quem estou a trabalhar”. E fiquei confiante; pouco depois cheguei a uma nova aldeia; apareceram primeiro os mais corajosos (os jovens) e, pouco a pouco, as mulheres, os velhos e as crianças, atraídos pelo motor e pelas luzes dos faróis do carro. Rodearam a viatura. Então perguntei-lhes:

 

“Tenho que ir para Ingoré, é esta a estrada?”

 

Um deles disse-me:

 

“Também tenho que lá ir, mas só amanhã. Se continuares em frente encontrarás uma outra aldeia. Lá explicar-te-ão”.

 

E então continuei. Pouco depois cheguei a um cruzamento de estradas. E coisa estranha, parecia-me um lugar familiar; na verdade era a estrada que conhecia. E a partir daí não me preocupei mais. Cheguei à aldeia, mas já não foi preciso ficar. E continuei contente. Por volta das 9 estava em Ingoré. Entrei em casa das Irmãs e disse:

 

“Sei que não são horas de cá chegar, mas...”

 

“Aqui, qualquer hora é boa para se chegar!” disseram-me. E arranjaram-me logo um lugar à mesa.



Anexos:

 

1 - o mapa, em que se destaca a estrada percorrida    

 

  

2 - A nova ponte, depois de Ingoré.

 

* Versão traduzida do italiano para o português por Filomena Embaló

 

 

Un viaggio particolare - Versão  original

 

Dire che nel tragitto Dakar-Bissau accadano degli imprevisti non è affermare una grande novità: si sa bene che lungo quella strada può capitare di tutto.

I chilometri in verità non sono tantissimi, circa 650. Ma si deve sapere che occorre passare attraverso tre paesi: il Senegal, il Gambia, ancora il Senegal, e finalmente la Guinea Bissau. In allegato c’è una cartina per facilitarne la comprensione.

La mattina del 8 Maggio siamo partiti molto presto da Dakar, verso le 4,30. La mia intenzione era di arrivare alla mia Missione di N’Dame, in Guinea Bissau, perché il giorno dopo avevo un impegno. Ero in compagnia di due giovani oblati senegalesi, Etienne e Jean-Marie. Viaggiavo con la loro macchina, in direzione di Temento, la loro missione. Era là che, all’andata, avevo lasciato la mia vecchia macchina.

Non ci è voluto tanto tempo raggiungere la frontiera con il Gambia (4 ore e mezzo). Nemmeno le pratiche (passaporti, dogana…) ci hanno portato via molto tempo, perché Etienne ci sapeva fare. Ero contento perché le cose andavano più veloci del previsto. Quando però siamo arrivati al traghetto, abbiamo perso tutto il tempo che avevamo guadagnato, a causa di un camion che non riusciva ad entrare. E così passarono alcune ore. Ma finalmente arrivò il nostro turno e attraversammo. Arrivati di là, c’erano da fare altri 20 km in terra battuta per uscire dal Gambia e rientrare nel Senegal. Tutto bene per i controlli, grazie al nostro Etienne. In poco tempo arrivammo vicino alla frontiera, mancavano ancora 50 metri. Ultimo controllo della Polizia del Gambia. Questa volta però più minuzioso: luci, frecce, patente e… clacson. Ero io alla guida.

“Il clacson funziona?” Mi chiese il poliziotto.

“Come no!” (Aveva sempre funzionato!). E invece no! Continuavo a pigiare,  con sempre più forza, ma niente. Anche Etienne mi aiutò, ma non ne usciva nessun suono. Guardai in faccia il poliziotto, dicendo:

“Le assicuro, funzionava fino a poco fa!”.

  Il poliziotto mi guardava (con una certa soddisfazione). Sembrava voler dire: a chi la vuoi far credere? Ripetei:

 “Può sembrar strano, ma solo ora, qui davanti a lei, non funziona”.

   Mi guardava ancora, per nulla convinto; sembrava che pensasse: dicono tutti così! Era inutile insistere. Mi disse di accostare a lato e di seguirlo. Entrammo sotto una tettoia coperta di frasche. Mi disse chiaramente che era un’infrazione grave, e che se avessi dovuto pagare la multa, mi sarebbe costata molto cara, in tempo (avremmo dovuto tornare indietro, per quella pista piena di buche, fino alla centrale della Polizia), e in denaro. Però ci sarebbe stato un altro modo: mettermi d’accordo con lui. Feci finta di non capire, e gli dissi che in  tutta la mia vita di guida non mi era mai capitata una cosa del genere. Questo sembrava impressionarlo, ma non al punto da fargli cambiare idea. Gli dissi ancora:

“Ti chiedo semplicemente di lasciarci andare. Appena arriveremo dal meccanico, metteremo a posto il clacson”. Niente da fare. Certo, sarebbe stato molto più semplice dargli qualcosa e partire, tanto più che eravamo in ritardo. Ma non me la sentivo proprio. E poi in quella strada polverosa avevo notato un cartello: “say no to bribery” (di’ no alla corruzione). (La lingua nazionale in Gambia è l’inglese, in Senegal il francese e in Guinea Bissau il portoghese).

Visto che non avevo intenzione di cedere, mi disse di aspettare il capo. Costui venne dopo un po’. Era un uomo sulla cinquantina, dall’aspetto bonario.

 “Here is the boss” (ecco il capo), mi disse.

“Senti capo, ho un problema”, gli dissi sorridendo, “il clacson non funziona…”. (Inutile ripetergli tutta la storia, che prima funzionava ecc.). “Ti chiedo semplicemente di lasciarci partire. Lo aggiusteremo appena arriveremo dal meccanico”.

 “Sì, però se ci dai qualcosa…”.

 “Non sono abituato a fare queste cose, capo. Lavoro come missionario in Guinea, e non sono là per fare commercio, ma per aiutare. Perché non aiutate anche voi?”.

 Si guardarono in faccia e, dopo una breve riflessione, fecero un cenno di affermazione. E disse:

 “Va bene, potete andare, buon viaggio”.

 “Grazie capo!”. 

Entrammo in Senegal, e dopo un paio di ore eravamo a Zinguenchor, la capitale del Senegal del Sud (la cosidetta Casamance). Come promesso, andammo dal meccanico. La tromba del clacson si era staccata e fu necessario saldarla. Così passò altro tempo. Arrivammo a Temento alle 7 di sera.

La strada che rimaneva per arrivare a N’Dame non era tantissima (115 km), ma bisognava prendere una pista e passare attraverso la frontiera, in una zona di savana e di foresta. Inoltre in Guinea ci sarebbe stato un altro traghetto che alle 7,30 di sera si fermava (è appena stato costruito un ponte, finanziato dalla comunità europea. Sarà presto inaugurato).

Pensando però che al di là della frontiera c’era una missione (Ingorè), avrei potuto arrivare fino là, e ripartire la mattina seguente molto presto per prendere il primo traghetto. I miei confratelli erano d’accordo su quest’idea, e così presi la vecchia macchina che avevo lasciato all’andata (la papamobile, per chi ne ha sentito parlare), e mi avviai verso il “mato” (la foresta). Come detto, è una zona di confine tra Senegal e Guinea; è facile passare perché non ci sono controlli. Ai soldati senegalesi che incontriamo di tanto in tanto spieghiamo chi siamo, e ci lasciano andare. Quella sera non incontrai nessuno.

In Africa la notte arriva in pochi minuti, questo lo sapevo bene. Alle 7,15 ci si vedeva ancora, ma alle 7,30 era già buio. Così, dopo pochi km dovetti accendere le luci. Mi ricordavo però la pista per averla fatta altre volte. A un certo punto incontrai un gruppo di ragazzi: chiedevano con insistenza un passaggio. Pensai di aiutarli, dal momento che sembravano andare nella mia stessa direzione. Continuammo il cammino.  Sapevo che a un certo punto, dopo una chiesetta, dovevo prendere la prima a sinistra. Tutto bene. Sapevo anche che avrei dovuto prendere la pista seguente pure a sinistra, ma arrivato là mi gridarono che non è quella la strada giusta.

“Vuoi vedere che non mi ricordo bene?” mi dissi. E allora avanti. Ma dopo poche centinaia di metri non mi ritrovavo più. Quella strada non l’avevo mai fatta. Arrivammo in un villaggio (nuovo per me), e mi dicono:

“Noi ci fermiamo qui”.

“Ma io devo andare a Ingoré. E’ questa la strada?”

“Ah, no. Ma se torni un po’ più indietro ne vedrai una a destra, prendi quella e ti ritroverai”.

Faccio retromarcia, ritorno e prendo la strada indicata. Ma più mi vado avanti, più mi trovo confuso. Non so più dove sono. Ci sono altre piste, in tutte la direzioni. Quale sarà quella giusta? Sto perdendo la pazienza (con me) e mi dico: “Ecco che cosa ci si guadagna ad aiutare gli altri! Se mi lasciavano andare per la mia strada…”. E’ notte fonda. Il forte canto dei grilli e dei vari insetti che altre volte seguivo con piacere, non mi dice nulla. Comincio a preoccuparmi. Mi viene la voglia di tornare a Temento, ma rischierei di non trovare nemmeno quella strada. A un certo punto mi dico: “Sono certo che ne uscirò, perché so per Chi sto lavorando”. E riprendo sicurezza. Dopo un po’ arrivo a un nuovo villaggio. Escono all’inizio i più coraggiosi (i giovanotti) e via via donne, anziani e bambini, attratti dal rumore del motore e dalla luce dei fari. Sono tutti intorno alla macchina. Chiedo anche a loro:

 “Devo andare a Ingoré, è questa la strada?”

   Uno mi dice:

 “Dovrei andarci anch’io, ma solo domani. Se continui diritto incontrerai un altro villaggio.  Lì ti spiegheranno”.

E allora avanti ancora. Dopo un po’ arrivo a un incrocio di piste. E, cosa strana, mi sembra una zona familiare. In effetti sono nella strada che conosco. E allora non mi preoccupo più. Arrivo al villaggio, ma non è più necessario chiedere. E continuo contento.

   Verso le 9 sono a Ingoré. Entro nella casa delle Suore, e dico:

 “Capisco che non sono queste le ore per arrivare qui, ma…”

 “Qui va bene venire in tutte le ore!” Mi dicono.  E mi fanno subito un posto a tavola.

 

 


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