Setembro, Mês dos Guineenses

 

Flaviano Mindela, artista plástico da Guiné-Bissau com o antigo Presidente de Portugal, Dr.Jorge Sampaio

 

Flaviano Mindela com Jorge Sampaio

 

 

Por: Flaviano Mindela

 28.09.2006

 

 

 

Este ano, celebramos o 33º aniversário da nossa famigerada independência, sem no entanto sentirmos um pouco mais conformados com o facto. Basta tomarmos em linha de conta, a lastimável degradação das nossas estruturas sociais.

 

Caros compatriotas, a culpa de tudo isso, é de todos nós, na medida das responsabilidades que cabe a cada um desempenhar.

A acção tem sempre um responsável, e faz a diferença, assim como a omissão tem sempre um responsável, e também faz a diferença.

 

É urgente começarmos a praticar os valores da justiça e da segurança, se de facto ambicionamos uma sociedade de homens livres. Se de facto ambicionamos um Estado de Direito.

Muitos teimam em apontar o dedo à alta taxa de analfabetismo da nossa população. Tudo bem. Isso para mim também, é preocupante. Mas julgo que, para conhecermos os nossos males primários, que põem mesmo em causa a nossa sobrevivência enquanto país, portanto a eminência do caos total, e termos a coragem suficiente de evita-los, combatendo as suas causas. Não é necessário sermos todos letrados.

 

Um exemplo muito prático, e que de certeza alguns de vós já tenha constatado:

 - Uma manada de búfalos numa savana, procura sempre organizar-se, de modo a proteger os mais jovens, dos seus predadores. Quando são perseguidos, fogem, mas adoptando uma formação que permite com que as suas crias fiquem no meio do grupo. Isto por uma razão muito óbvia. Assegurar o futuro da comunidade, sacrificando os velhos e doentes.

Outro exemplo:

 - Num grupo de macacos, existe sempre um dos membros que vai fazendo de guarda. Durante esse curto período, quase que não alimenta, para melhor desempenhar a função. Logo que detectar qualquer sinal de perigo, emite um som de alerta, minimizando assim as perdas, para o bem da sua Comunidade.

 

 Vão me dizer que, esses seres vivos não sabem ler e escrever. Claro que não. É tudo só uma questão de saber organizar-se e, sobrepor os interesses da comunidade aos interesses do indivíduo. Mas a pensar na realização do próprio indivíduo como parte essencial do grupo, para o bem e para o mal.

 

São comportamentos guiados pelo instinto? Pois então, também nós, somos animais. Que tal deixarmo-nos orientar por esses bons instintos?

Se querem saber? Eu já abandonei, há algum tempo a esta parte, a ideia de que só os humanos são inteligentes. Porque para mim, todos os seres vivos são inteligentes.

A inteligência, na minha óptica, não passa da capacidade de nos adaptarmos e, vivermos com sucesso, num determinado meio, sem provocar grandes alterações.

 

Sei que é muito complicado de se entender. Mas como já mencionei, é mesmo assim que encaro a vida.

Já agora, com isso lembrei-me de uma outra realidade, até repugnante.

 - Quando chegada certa altura, uma leoa envelhecer, sem forças para participar nas caçadas e, deixar de poder ter crias, é atacada pelo próprio resto do grupo, inclusive prováveis filhos. E uma vez morta, é abandonada aos lobos, livrando-se assim de um elemento prejudicial ao sucesso da espécie.

Querem mais?

 

Meus camaradas, essa nossa atitude perante as adversidades, e durante essas três décadas, tem um nome, e chama-se, cobardia.

Todos nós, outros mais, outros menos, temos sido cobardes, optando pelo individualismo no lugar de comunitarismo. Os nossos problemas são sempre resolver o nosso problema.

Agora está muito na moda responsabilizar os militares por tudo o que vai mal. Mas esses, coitados, também só querem resolver os seus problemas, como todos nós. Acontece que, o instrumento que usam para tal mata depressa. Os políticos, para não variar, usam o poder para resolverem os seus problemas, encorajando a corrupção e, matando, ainda que de forma indirecta e lenta, muita gente. Os diplomados usam o diploma para terem acesso aos canais dos fundos de Estado, desviando-os para resolverem os seus problemas, e desta maneira, causam miséria e morte lenta a muita gente. Também nós do povo, com o abdicar do nosso papel no exercício da cidadania, nha boka ka sta la resolvemos os nossos problemas, contribuindo assim para o estado da desgraça. Pois é, desde que ninguém nos chateie…

 

Na verdade minha gente. Isso, só pode ser um puro engano.

Sempre que o nosso vizinho está pior, é porque estamos mal. Se está bem, é porque estamos melhor. Se está melhor, é porque estamos óptimos.

Para sermos uma sociedade justa e segura, temos que combater de forma bastante corajosa, as causas que levam à injustiça, e as causas que levam à insegurança. Para isso, basta não sermos injustos para com os outros, assim como não ameaçar a segurança dos outros.

Quero orientar-me sempre por esse pensamento, e poder partilhá-lo com o maior número  possível de pessoas. Porque acredito plenamente que, quem pratica o bem, sente-se melhor e vive de forma tendencialmente óptima.

 

Todos os países prósperos por este Mundo fora, só demonstram que há uma esmagadora maioria dos seus cidadãos, que têm como primeira preocupação, praticar o bem em prol da Comunidade. Não vou negar que podem também existir factores exteriores, capazes de contribuir e, contribuem para a felicidade, ou infelicidade dos povos. Mas a questão, meus senhores, reside na vontade de combater esses factores, caso forem desfavoráveis, e aproveitá-los ao máximo, caso forem favoráveis. Ou seja, fazendo mal, ou bem.

 

A liberdade constitui um conjunto muito vasto de valores, que comportam os direitos, os deveres e as obrigações que temos de observar no nosso quotidiano, para que, cada vez mais, tenhamos uma sociedade justa e segura.

Temos que praticar os valores adequados a uma sociedade que se queira realmente independente. Temos que exercer os nossos direitos, e cumprir com os nossos deveres e obrigações.

 

Afinal somos uma Democracia, temos o dever de praticar o exercício democrático. Caso contrário, podemos perder a prática, e deixar pura e simplesmente de ser uma Democracia. A nossa Constituição atribuiu-nos direitos, deveres, liberdades e garantias, na forma de lei fundamental. Portanto, temos que fazer funcionar, atribuindo eficácia a essa nossa Constituição Democrática. Até porque uma das modalidades para a extinção de uma lei, é o desuso.

 

Muitos de nós, conseguiram fugir fisicamente. Confesso que às vezes, me envergonho profundamente com essa situação. Mas também já vimos que de pouco adianta.

Os nossos acolhedores também tiveram problemas e ainda têm. Mas organizaram-se, e muita gente saltou para a linha da frente. Tanto assim que hoje, estão em condições pelo menos de nos receber.

 

A nossa apetência e grande capacidade para modificar o rumo das coisas, existiu sempre, como sempre existirá. Portanto, o que salva uma determinada época é a atitude correcta do ser humano perante os fenómenos naturais e sociais. Viver em tempos duros, de profundas turbulências, não deveria de maneira nenhuma, significar uma tragédia, mas sim elevar os motivos para as nossas auto exigências.

 

Guineenses, temos que continuar a luta, 33 anos, são muitos anos na vida de qualquer homem, no nosso caso então, é quase uma vida, se tomarmos em consideração a média relativa à nossa esperança de vida.

Os 33 anos de infelicidade, é o que nós todos já experimentámos, pelos motivos óbvios, não nos agradou nada. Não vamos com a nossa cobardia disfarçada de um certo egoísmo, legar uma sociedade imprópria para sentenciar os nossos filhos e netos.

 

 

Ser, Conhecer, Compreender e Partilhar.

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