O RECADO DA CATANA

 

 

Por: Flaviano Mindela dos Santos

 

 

flavianomindela@hotmail.com

 

11.06.2009

 

Algum tempo a esta parte, absorvido por assuntos pessoais e familiares, optei por concentrar todas as despesas das minhas energias, que mesmo assim ainda faltam, em proporcionar melhores dias a tudo e todos que disso dependem, de forma directa.

Esboçado o motivo da minha curta ausência neste espaço, que alguns fizeram questão de reclamar através de incentivos diferenciados, o que só demonstra a importância duma conjunta, frontal e corajosa, mas também ponderada luta que se deve travar, para o afastamento definitivo das nossas piores maleitas.

Voltei mais pela delicadeza do momento, e pelo que acima referi. Mas aproveito para dizer também que este será o meu derradeiro contributo neste espaço em particular, porque por tempo indeterminado, pretendo queimar os neurónios mais na satisfação das necessidades familiares, e na concretização dos meus vários projectos artísticos e literários.

Como todos nós infelizmente sabemos, desde a nossa independência, a perseguição e a morte, vêm perseguindo e matando incontáveis almas guineenses, assim como outras, por razões que a própria razão por vezes não consegue explicar.

Foi sendo assim, até à eclosão da evitável e estúpida guerra civil que o país conheceu, em que a morte conseguiu tomar proporções assustadoras, quando decimou vidas inocentes, entre uma população já de si bastante castigada pela negligente incompetência e pura malvadez dos sempre mesmos governantes, e consequente miséria a que isso lhes reservou.

A grande fatia da culpa de tudo isso, ficou pelas mãos do então Presidente da República, pela inerente importância dos cargos, e dos anos durante os quais esteve nos seus exercícios. Tanto assim era, que o fim efectivo do referido conflito, tinha como uma das condições básicas, a sua saída do território.

Pelas consequências do pós-conflito: piorou-se a situação sociopolítica do país, renovaram-se as esperanças, mobilizaram-se diferentes vontades, e despenderam-se múltiplos esforços, para recomeçar quase tudo.

Quando começaram a aparecer alguns resultados favoráveis, sendo que poderia ser de outra maneira, aterra na nossa capital um helicóptero de guerra, para o mundo inteiro assistir e registar, com os últimos defuntos como uns dos principais coniventes do feito inédito, contra a vontade das nossas autoridades eleitas e competentes, logo contra a nossa vontade, e a favor da humilhação colectiva.

Depressa, as (in)convenientes mexidas na estrutura do poder acordaram os ódios adormecidos por interesses pessoais, até que nos primeiros dias do último mês de Março, foi deixada uma catana em jeito de recado, para que todos nós percebêssemos o quanto ninguém é assim tão seguro ou invulnerável.

Quero, às tantas, lembrar-vos que, os executantes dessa noite fatídica, apesar de terem encontrado mais pessoas na residência, limitaram-se a matar somente uma delas. E de maneira como estão as coisas ainda hoje, deixa-nos claro que, nessa mesma noite, eles podiam sair numa rusga a matar mais pessoas afectas ao regime, mas voltaram logo ao silêncio do anonimato, numa clara proposta ao fim de tudo, se assim o país quiser.

Foi com uma enorme angústia que há muito constatei esse duro facto, e com o mesmo estado angustiante, vou dizer o seguinte:

Morreu o líder de um regime que foi alguns aspectos repressivo, com ele está também a morrer, e ainda bem, o próprio regime. Para tal, quem teimar em alimentar saudosismos, só conseguirá realizar essa manha no encontro de uma morte prematura, e ainda contribuir para o surgimento de um novo regime mais repressivo.

Nada tem importância sem as devidas garantias; e a mais sólida garantia entre todas as demais, e só a conseguiremos através duma reedificação, com a colaboração patriótica e genuína de todos os membros, de uma sociedade capaz de assegurar de forma efectiva o bem-estar, na sua total dimensão.

A construção de uma nação, sempre foi e sempre será um assunto sério. E se olharmos atentamente para a história das várias nações espalhadas pelo globo, vamos verificar com certeza que, ao longo das etapas das suas formações, houve derramamentos de sangue, quase sempre que os defensores da mentira tentaram subjugar os defensores da verdade.

A natureza no seu todo é tão complexa, e por vezes tão cruel que, de uma vida, não devia depender uma morte ou várias; assim como, de uma morte, não devia depender uma vida ou várias.

Matar, no fundo, é causar um profundo sofrimento e muito sacrifício aos relativos da vítima; e porque não também ao próprio agressor?!

Portanto, quero continuar a acreditar durante a minha vida inteira, que ninguém, em condições normais, desejaria simplesmente matar outrem. Quero continuar a acreditar durante a minha vida inteira, que são um conjunto de factores, muitas das vezes impossíveis de entender e explicar, que acabam por determinar a morte de alguém por uma outra suposta pessoa.

Que ninguém finja para enganar, porque todos nós somos capazes de matar, ou podemos ser apologistas da matança! Sendo que, para o bem da humanidade, só alguns o fazem pelo sucesso da mentira, e muitos mais o fazem pelo sucesso da verdade. Caso contrário, nunca conservaríamos simpatia alguma pelos percursos heróicos dos nossos velhos combatentes, nem orgulharíamos de ter conseguido no fim dos tempos, erguer a estátua do nosso saudoso Amílcar Lopes Cabral. Porque embora seja pelo triunfo da nossa verdade, foram obrigados a matar muitas pessoas, que também dos seus lados, foram obrigados a defender uma outra verdade.

Uma vez que pela nobre dedicação e altos sacrifícios de todos os nossos heróis vivos ou mortos, sem excepção, conseguimos descobrir a nossa verdade, que não passa da simples obrigação de trilharmos com as mãos bem dadas, o longo caminho do progresso, sem aquela preocupação de saber se o dono da mão que nos calhou segurar é ricu ou pobri; se é fidju di tchon ou burmedju; se é criston ou musulmanu; e se é dutur ou labradur.

Em desacordo com as muitas e respeitáveis opiniões a circular, de que o país precisa com urgência de uma força internacional, vou lembrar que a maioria dos nossos militares não conhece sequer, o significado dos tratados e acordos internacionais; e para mais, dificilmente tolerariam a tal solução, pelos seguintes propósitos:

­- Na aplicação duma das fundamentais estratégias para o sucesso da nossa luta de libertação nacional, essas pessoas viram-se envolvidas, e quase que obrigadas a pegar em armas, deixando a pacata vida que levavam nas respectivas tabancas. Assim que hoje, ser militar para eles, mais do que um modo de vida, é um modo de sobrevivência;

- Para essas pessoas que conheço relativamente bem, e sei que reagem de pronto ao pequeno sinal de humilhação, ainda que por vezes equivocados, qualquer presença de militares estrangeiros, significará para eles uma submissão vergonhosa, e portanto meio caminho para entre os pares, possa aparecer um mais ganancioso, e liderar uma revolta com largos custos, que poderá ser cíclica, mesmo que for rapidamente esmagada;

- E por fim, os excessos e abusos característicos das forças de interposição, com as suas indesejáveis consequências no tecido social nos lugares onde já foram instalados. E é de ter em conta que, alguns dos parceiros que na hipótese poderão disponibilizar meios humanos, à semelhança das nossas, também lidam com desorganização e corrupção nas suas Forças Armadas.

Por este último aspecto, até eu anteciparia logo o meu provável regresso às fileiras das Forças Armadas!

Caros compatriotas, nenhum país da nossa amizade mobilizará os seus preciosos homens para uma qualquer missão no nosso território, em troca do baixíssimo significado que ainda representamos nos corredores dos mercados internacionais, conhecendo a famigerada ferocidade dos nossos magros guerrilheiros, quando se trata de expulsar um estranho.

A tarefa primordial na resolução dos nossos problemas, deve ser da nossa exclusiva responsabilidade, e ser realizada com bases no respeito mútuo, na promoção pela competência, e no reconhecimento dos melhores.

Resta, para acabar, lembrar aos actuais detentores dos já enfraquecidos poderes institucionais de que, quanto mais necessidade de demonstrar e usar e abusar do poder da força tiverem, mais enfraquecidos ficarão.

 

Ser, Conhecer, Compreender e Partilhar.

 

 

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