O Sector da Saúde

 

2.1 Organização do Sector

 

 

O sistema sanitário está estruturado em três níveis de acordo com a divisão administrativa do território nacional, a saber nível central, nível regional e nível local.

 

A nível central são elaboradas as políticas, as estratégias e é montado todo o sistema de acompanhamento, mobilização e coordenação dos financiamentos e ajudas destinadas ao sector.

 

A divisão regional do sistema sanitário respeita a divisão administrativa do território nacional, com a excepção de Bolama e Cacheu. As principais tarefas a este nível resumem-se na operacionalização das orientações traçadas ao nível central, tendo em conta as estruturas existentes nas regiões.

 

Ao nível local são os Centros de Saúde que se responsabilizam por uma área geográfica, cuja população gravita entre 7.000 e 12.000 habitantes. Actualmente, uma parte considerável dos postos de saúde não funciona, ou por falta de pessoal, ou por falta de medicamentos.

 

Em algumas aldeias isoladas, existem infra-estruturas sanitárias comunitárias (conhecidas por Unidades de Saúde de Base ou U.S.B.) para prestar serviços mínimos tais como os curativos, preventivos e informativos. De realçar que os servidores que prestam serviço nestas estruturas, não sendo funcionários, não dependem do Ministério da Saúde Publica, mas sim da comunidade que através de apoios diversos mantêm tais estruturas. Contudo dados da Direcção dos Cuidados Primários de Saúde em 2001, permitem afirmar que duma sondagem em 345 das 693 existentes só se deparou com 99 (29%) de tais estruturas que estejam a funcionar actualmente.

 

2.2 Recursos Físicos e Humanos & Capacidade de Oferta de Serviços

 

As principais estruturas de referência na área da saúde são: o Hospital Nacional Simão Mendes (HNSM), o Hospital Raoul Follereau para tratamento da tuberculose, o Hospital de Cumura, especializado no tratamento da lepra, o Centro Mental e o Centro de Reabilitação Motora, os quais cobrem todo o país. À excepção do Hospital de Cumura, todos os outros estão localizados em Bissau, e foram estes últimos danificados ou completamente ou parcialmente em decorrência do conflito político-militar de 1998, ficando alguns por reconstruir.

 

Apesar da organização do sistema de saúde prever a existência de hospitais regionais, tal não acontece pelo menos em todas as regiões por questões de racionalidade dos recursos ora existentes. Assim, prevê-se adicionalmente um hospital regional em Mansôa, para a região de Oio. As regiões de Bolama e Biombo passaram a depender das estruturas de Bissau e a região de Quinara da região de Tombali.

 

As infra-estruturas de saúde existentes são insuficientes para fazer face às necessidades das populações, particularmente no Sector Autónomo de Bissau. As que estão em funcionamento, encontram-se grandemente degradadas e sem os meios humanos e materiais necessários. Os 5 hospitais regionais, funcionam com muitas limitações. Neste momento estima-se que 71% de Unidades de Saúde de Base não se encontram operacionais. Os Quadros nºs 7 e 8 apresentam um panorama do n. de hospitais existentes, bem assim dos recursos humanos que prestam serviço no sector da saúde.

 

Relativamente aos recursos humanos os dados do Ministério da Saúde apontam como muito elevado os rácios entre a população e cada categoria profissional de saúde por região sanitária. Ao nível nacional, o rácio de população por médico é de 11.664. Em Bissau, este rácio duplica-se passando a 24.412, em função da grande concentração populacional que, todavia não se faz acompanhar do aumento do número de médicos. Estando relativamente bem servida em termos de algumas especialidades, mas mal servida em termos do número de médicos, a nível do SAB a polivalência ainda se põe como no interior do país. O Gráfico n.16 ilustra esta diferença de rácio. Em Bafatá o rácio é de 25.009/1 e Quinara é de 12. 793/1.

 

Gr. n. 16- Rácio População/Médico Bissau comparativamente à Média Nacional

Fonte : Ministério da Saúde, PNDS 2000

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A oferta dos serviços de saúde, embora com muitos condicionalismos, é mais acentuada nos centros urbanos e semi-urbanos em detrimento da periferia e do interior do país, verificando-se uma maior concentração dos recursos humanos (virtualmente), financeiros e das infra-estruturas físicas nos centros urbanos. Esta particularidade caracteriza-se pela expansão rápida dos serviços privados e recursos não contabilizados nos cálculos oficiais dos rácios, pois a título de exemplo, é quase exclusivamente o mesmo pessoal servindo no público que faz as prestações no privado.

 

O sector público não é o único interveniente na rede de prestação de serviço no domínio da saúde médica e medicamentosa. A deficiente qualidade do serviço prestado ao nível das estruturas públicas, associada a um número elevado de pacientes por médico, levou ao desenvolvimento de uma rede de prestação de cuidados de saúde a nível de clínicas particulares em várias valências.

 

Este serviço de carácter privado esta mais localizado ao nível dos centros urbanos, variando o preço de uma consulta médica entre os 3000 a 10000 FCFA, sem incluir os exames complementares. Por despacho do Governo, formalizou-se a autorização para a abertura das clínicas privadas, persistindo, contudo a necessidade de uma legislação e regulamentação na matéria.

 

Paralelamente a este serviço o país dispõe igualmente de farmácias e postos de venda de medicamentos pertencentes a privados. O sistema de fiscalização existente a nível desta rede de prestação de serviços (clínicas, farmácias e postos de venda de medicamentos) merece ser reforçado, ainda mais num contexto em que a população por vezes se automedica sem um controlo médico-farmacêutico, havendo inclusive informações relativamente à venda de medicamentos fora do prazo e de antibióticos e outros de igual ou superior teor nas feiras públicas.

 

Apesar de existir um órgão a nível do Ministério da Saúde encarregue da fiscalização das clínicas e farmácias e de uma legislação na matéria, a falta de meios tem condicionado a sua actuação fiscalizadora e a inspecção da rede de clínicas privadas, limitando-se a intervir nas situações em que ocorrem casos de extrema gravidade.

 

2.3 Principais Indicadores de Saúde

 

Segundo o MICS-2000, a mortalidade infantil ronda os 121 por 1000 e, dentre todas as regiões, Bafatá regista a mais alta taxa com 169 por 1000, depois do Sector Autónomo de Bissau (SAB) com 158 por 1000. A região de Cacheu regista a mais baixa taxa com 41 crianças por 1000. No que diz respeito à mortalidade das menores de cinco anos, o Sector Autônomo de Bissau (SAB) e a região de Bafatá mostram índices muito elevados com, respectivamente, 272 e 295 por 1000.

 

Nos últimos dez anos alguns indicadores apresentaram melhorias, como foram os casos da taxa de mortalidade infantil que baixou de 146 por 1000 para 124 por mil nados-vivos, e o aumento da proporção das crianças imunizadas contra a difteria, a pólio e a tuberculose (documento preliminar sobre a iniciativa PPTE da Guiné-Bissau,2000, pag. 10).

 

Gráfico n. 17 – Taxa de Mortalidade Infantil por Região

Fonte: MICS, Bissau 2000

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Em decorrência do conflito político-militar, o estado de saúde da população foi seriamente afectado com maior incidência nas crianças e mulheres, devido à paralisação das actividades preventivas e promocionais em todos níveis da pirâmide sanitária e do fornecimento regular em água potável. As principais doenças enfrentadas no sector da saúde são o paludismo, com 58% das consultas, doenças respiratórias agudas com 10%, diarreias com 8% e as DST com 5% das consultas nos adultos. A taxa de mortalidade global do paludismo ronda os 16%, constituindo uma das principais causas da mortalidade infantil. O HIV1 conheceu um crescimento acentuado o que tem preocupado as autoridades sanitárias atendendo à rapidez e à sua forma de transmissão. Todos estes factores fazem com que os indicadores do sector de saúde sejam muito baixos, mesmo comparados com os da África sub-sahariana.

 

2.4 Constrangimentos e Propostas

 

O sector passa por carências várias, que vão desde o número insuficiente de recursos humanos a vários níveis técnicos de qualificação e de especialização, as instalações de prestação de cuidados encontram-se muito degradadas e sem uma manutenção ainda que temporária, a falta de medicamentos e meios auxiliares de diagnóstico e de intervenção, a desmotivação do pessoal em função dos baixos salários e que não são pagos atempadamente, além de falta de recursos financeiros para suportar certas despesas correntes.

 

Para melhorar o desempenho do sector sanitário o Governo preconizou através do PNDS ecom bases na equidade e racionalidade, dar ênfase aos serviços primários de saúde e especialmente às mulheres e crianças, aumentando o uso e a cobertura eficaz dos serviços de cuidados primários de saúde e dos centros de saúde, implementando a recuperação de custos ao nível dos centros de saúde nas áreas rurais e nos hospitais das cidades, fortalecendo a capacidade institucional e de coordenação inter-sectorial a todos os níveis. Por outro, pretende incentivar o papel das ONG e das comunidades na prestação de serviços na área da saúde.

 

A materialização dos objectivos acima referidos, esta necessariamente condicionada pela situação em que se encontram as finanças públicas do país, pela fraqueza institucional do sector em mobilizar e gerir de forma adequada os recursos externos que lhe são destinados e o retraimento cada vez maior dos parceiros de desenvolvimento no que diz respeito ao desbloqueamento de fundos.

 

3. Situação Nutricional

 

O estado nutricional de uma população depende fundamentalmente dos seus hábitos e costumes, do seu nível de informação e do acesso aos géneros alimentícios.

 

Segundo os dados do MICS-2000 (pag. 20) "..uma em cada dez crianças menores de cinco (5) anos, na Guiné-Bissau sofre de insuficiência ponderada (25% das crianças), e 6,5% das crianças de insuficiência ponderada severa, 30,4% apresentam um atraso de crescimento ou são muito pequenas para a sua idade e 10,3% são magras ou muito delgadas para a sua altura".

 

Na região de Oio existe uma maior propensão para o registro de taxas mais altas de emaciação e de atraso de crescimento, isto é, cerca de 33,1% das crianças nesta localidade apresentam emaciação e atraso no crescimento, comparativamente às crianças da mesma idade e de outras regiões.

 

O Sector Autónomo de Bissau regista a maior taxa de crianças com emaciação, uma percentagem maior de crianças com idade entre 12 e 23 meses, comparativamente às mais novas e mais velhas apresentam subnutrição, decorrente da interrupção da amamentação e da introdução de alimentos e água nem sempre bem tratados.

 

Gráfico n. 18 - Taxa de Aleitamento Materno

Fonte: MICS,Bissau 2000

 

 

 

 

 

 

 

De acordo com os mesmos dados, 41,5% das crianças são exclusivamente amamentadas até a idade dos 4 meses, de acordo com a definição MICS de amamentação exclusiva.. Mesmo continuando com a amamentação, são introduzidos outros alimentos sólidos e não sólidos. Mesmo com a introdução de outros alimentos até aos quinze meses 95% continuam a ser amamentadas, diminuindo esta percentagem para 67% ao fim dos 23 meses, como ilustra o Quadro n. 18.

Do ponto de vista da protecção da criança é de se registar como extremamente positiva a continuidade da amamentação da criança ainda, que em carácter decrescente e combinado com outros alimentos até aos 23 meses, sabendo-se da deficiente qualidade da alimentação normalmente introduzida, tanto em termos proteicos como vitaminosos e das inúmeras doenças a ela associadas, devido à qualidade da água utilizada na sua confecção, como nos cuidados tidos normalmente na sua preparação.

 

Outro aspecto a se ter em conta, refere-se à iodização do sal, factor que interfere grandemente no desenvolvimento intelectual da criança. Constata-se que a percentagem do sal iodado é muito baixa, devido a sua pouca comercialização além da inexistência de uma política nesta matéria. Dados do MICS-2000 apontam a título ilustrativo, que dos agregados familiares testados, a percentagem de iodo variou de 0,01% em Biombo e Cacheu até 4,5% na região de Bolama. Somente 1% dos agregado urbanos dispunha de sal devidamente iodado, em contraste com o meio rural em que esta percentagem aumentou para 2%. Por forma a fazer face a esta situação deu-se inicio durante o ano 2000 a um projecto de iodização do sal, cujos trabalhos encontram-se em andamento.

 

A deficiência em Vitamina A (DVA), destaca-se como outro importante problema nutricional com um forte impacto no desenvolvimento das crianças, enfraquecendo o seu sistema imunitário, podendo aumentar o risco de morte por doenças próprias da infância. A sua deficiência no organismo, prejudica igualmente a saúde das grávidas e lactantes, podendo ainda causar transtornos de visão ou até mesmo a cegueira. A deficiência em vitamina A surge associada por vezes à desinformação e ao baixo nível de instrução, principalmente das mães, à situação de pobreza que leva as famílias a venderem os seus produtos agrícolas em detrimento do seu consumo, além dos maus hábitos alimentares que conduzem ao consumo de alimentos incapazes de suprir as necessidades do organismo com esta vitamina. Este problema não é ressentido directamente como motivos em procurar cuidados de saúde pela parte da população pelo que nem sempre é inventariado.

 

Regista-se actualmente um esforço conjugado Governo/UNICEF/OMS na distribuição da vitamina A às crianças com idade compreendida entre os 6 a 59 meses, tendo-se verificado em decorrência desta campanha em Jornadas Nacionais de Vacinação (JNV)um aumento no seu consumo de 27% para 30% principalmente nas crianças de 12 a 23 meses, diminuindo esta percentagem até atingir 26,4% entre as crianças mais velhas. Nas jornadas nacionais de vacinação, em 2000 fez-se uma suplementação com vitamina A com uma taxa de cobertura de 91%.

 

A Par desta situação depara-se ainda com as más práticas culturais em termos da dieta alimentar, principalmente da sua composição à base de carboidratos, pobre em proteínas e vitaminas, e na sua repartição desigual no seio familiar, nem sempre priorizando as crianças e mulheres grávidas e lactantes.

 

4. Habitat, Água Potável, Saneamento

 

No meio urbano e principalmente na cidade de Bissau, a problemática do habitat é grave na medida em que a procura é de longe superior à oferta. Com uma qualidade que varia desde os que possuem boas condições de habitabilidade até os que não possuem as condições mínimas, sendo esses a maioria, com uma ventilação e luminosidade fraca, um número elevado de pessoas no mesmo espaço físico proporcionando a promiscuidade a falta de higiene, factores que interferem na qualidade de saúde.

 

O lixo circunda a céu aberto a cidade de Bissau, não sendo removido atempadamente, cria necessariamente focos de doença, além do péssimo aspecto que dá ao meio ambiente circundante, principalmente nas valas, nos terrenos baldios e em casas desabitadas em estado de degradação, constituindo focos de doença, como difteria, cólera, entre outras.

 

No que respeita ao saneamento os dados do MICS apontam que 62,8% da população vive em unidades habitacionais com sistemas de tratamento de esgoto, sendo 95,2% no meio urbano e de 44,4% no meio rural. Tais sistemas vão desde autoclismo ligado a um esgoto ou a uma fossa séptica, outras formas de autoclismo, latrinas melhoradas, latrina tradicional ou cerco.

 

No meio rural, os alojamentos não dispõe de electricidade, nem de água canalizada ou de condições adequadas de evacuação de dejectos, as condições de habitabilidade reflectem o nível de pobreza das populações, com um agregado familiar composto por uma média de sete a nove pessoas compartilhando o mesmo espaço físico. As casas na sua maioria são cobertas de colmo, com pouca ventilação e pouca luminosidade.

 

 

No que respeita a água potável, conforme os dados do MICS 13,6% da população tem acesso a água potável, sendo destes 36,4,2% no meio urbano e 0,7% no meio rural. De uma maneira geral, 13,6% da população tem acesso a agua potável, sendo que 65,8% da população usa água de fontes protegidas e não protegidas e 17,6% usa água proveniente de fontanários e furos, e 2,9% usa água dos rios, conforme os dados do gráfico n .19 abaixo apresentado.

 

A cidade de Bissau é a região na qual 52,4% da população usa água canalizada em sua residência, contrastando por exemplo com Oio, onde só 0,13% da população obtém água canalizada, sendo maioritariamente utilizada a água de poço e fonte não protegida (58,2%).

 

Em todas as outras regiões é usada na sua maioria a água das fontes protegidas e não protegidas.

 

O conceito de água potável e da água canalizada é discutível na medida em que o sistema de distribuição de água é irregular e deficiente, estando a rede em estado obsoleto. Por outro lado, sem um controle laboratorial de qualidade da água, não se pode afirmar com garantia que a proveniente de fontanários, ou de poços, fontes e nascentes protegidas, ou até mesmo a canalizada possa ser potável, não comportando riscos à saúde das populações. O transporte da água no meio rural é feito geralmente por mulheres e crianças, sendo por vezes a longas distâncias, factor que condiciona o acesso das meninas à escola, principalmente as raparigas.

 

Gráfico n.19- Acesso a Agua Potável no Meio Rural e Urbano

Fonte : MICS, Bissau 2000

 

 

 

 

 

 

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