MINDJERIS DI PANO PRETO

Isabel Romano Vieira, viúva do assassinado Presidente da República da Guiné-Bissau, General João Bernardo "Nino" Vieira

 Mindjeris di pano preto - Zé Carlos Schwarz

 

 

Fernando Casimiro (Didinho)

didinho@sapo.pt

15.10.2009

Fernando Casimiro (Didinho)A meio da manhã de Domingo, 11 de Outubro, desloquei-me ao aeroporto de Lisboa, para receber o jornalista e realizador francês Stephane Bentura, que viajou propositadamente de Paris para me entrevistar sobre questões delicadas da África Ocidental em geral e da Guiné-Bissau em particular, uma entrevista para uma importante estação de televisão francesa, que contamos partilhar no nosso site assim que for disponibilizada ao público.

Casualmente, no mesmo voo de Paris/Lisboa, viajou a Senhora Isabel Romano Vieira, viúva do assassinado Presidente da Guiné-Bissau, João Bernardo Vieira.

Quando cheguei ao aeroporto, dei conta da presença na área das chegadas, do casal Godinho Gomes, o Dr. Pedro e a Dra. Henriqueta, ambos, ilustres figuras da governação na Guiné-Bissau, sendo inclusive, amicíssimos do casal Bernardo Vieira.

Não havia nenhum voo para ou de Bissau, por isso, pensei que estivessem à espera de algum familiar proveniente de outras paragens.

Alguns minutos depois da chegada do avião da Air France, eis que vejo sair João Romano Ferreira, Cônsul da República da Guiné-Bissau em Lisboa, acompanhando sua irmã, Isabel Romano Vieira.

Olhei para trás e vi o casal Godinho Gomes dirigir-se para eles, compreendi que se tinham deslocado ao aeroporto para receberem Isabel Romano Vieira.

Entre abraços e conversas fui-me aproximando na direcção de Isabel Romano Vieira, que desde o assassinato do marido se tornou também numa "mindjer di pano preto".

Quando fiquei de frente para ela, olhou-me com ar desconfiado, mas olhou-me olhos nos olhos, não sei se ela estava ciente de quem tinha à sua frente. Estendi-lhe a mão dizendo: Bom dia minha senhora, quero-lhe apresentar os meus sentidos pêsames!

Deu-me a mão, agradecendo.

Virei as costas, afastando-me, pois o Stephane já me tinha enviado uma mensagem a confirmar que já estava despachado.

Repito, não sei se a senhora Isabel Romano Vieira sabia quem eu era, mas o irmão, João Romano Ferreira, o ainda Cônsul todo poderoso da Guiné-Bissau em Lisboa, sabia.

Isabel Vieira continua de preto, confesso que entristece-me ver pessoas enlutadas, seja por mortes naturais de familiares, seja por barbáries, como foram os casos de João Bernardo Vieira e Tagme Na Waie em Março deste ano e de tantos outros filhos da Guiné-Bissau ao longo dos anos.

Aquando das cerimónias fúnebres de Nino Vieira, uma das suas filhas comoveu os guineenses, quando num sentido e profundo desabafo de sua boca saíram "palavras de outro mundo": paremos de nos matar!

Ninguém de bom senso poderia ficar indiferente ao apelo lançado. Na Guiné-Bissau, infelizmente, há muito que uns quantos pensavam ser imortais e, por via disso, sentiam-se absolutamente poderosos, ao ponto de desprezarem vidas humanas, matando ou mandando matar por tudo e por nada.

Talvez se algum familiar do assassinado Presidente João Bernardo Vieira tivesse sensibilidade, respeito e consideração pelas vidas humanas sacrificadas ao longo dos 22 anos que esteve no poder, dizendo-lhe as verdades que os "amigos", na verdade inimigos, jamais lhe disseram, certamente muitos erros teriam sido corrigidos e, se é verdade que não seriam devolvidas as vidas ceifadas, provavelmente, não haveria mais matanças.

A Guiné-Bissau transformou-se na terra das "Mindjeris di pano preto", esquecendo-se os que se achavam imortais que, tal como se diz na Pátria de Cabral, "Tchur i caneca di midi".

Depois do assassinato do Presidente João Bernardo Vieira, algumas pessoas apelidaram-me de cínico, porque interpretaram erradamente o meu Humanismo, na forma como condenei quer o seu assassinato, quer o do ex- Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas da Guiné-Bissau, Tagme Na Waie.

Para essas pessoas, eu estava a ser um fingido, pois que sempre me tinha posicionado contra ambos.

Sim, critiquei duramente o falecido Presidente João Bernardo Vieira e tenho pena que ele não tivesse tomado em consideração a objectividade e o alcance dessas críticas para a sua requalificação como homem e estadista, o que certamente iria beneficiar a Guiné-Bissau e os guineenses!

Sou um humanista, não bato palmas aos assassinos, nem festejo a morte de nenhum ser humano, mesmo daqueles que, como o falecido Presidente, também mataram ou mandaram matar alguém, por isso, me ter posicionado contra a barbárie que o vitimou!

Que ninguém espere ouvir elogios da minha parte em relação a Nino Vieira, pois aí sim, teriam motivos para me apelidarem de cínico.

À senhora Isabel Romano Vieira  em particular e à família do falecido Presidente João Bernardo Vieira, em geral, quero dizer o seguinte:

Aceitem as evidências de um percurso inglório, do qual directa ou indirectamente participaram. Não tenham o povo guineense como inimigo.

Permitam ser perdoados, libertando-se dos pesadelos de um passado negro através da verdade.

É legítimo exigirem investigações e Justiça para a barbárie que vitimou Nino Vieira, mas também, tenham a coragem de se solidarizarem com todos aqueles a quem foi negado esse direito pelo vosso ente-querido ao longo dos anos.

Reconciliemo-nos, com a verdade, com a Justiça e com o perdão, para assim, todos vivermos em harmonia!

 SIM, PAREMOS DE NOS MATAR!

SIM, LIBERTEMO-NOS DO ÓDIO!

SIM, À VERDADE, À JUSTIÇA!

SIM, SAIBAMOS PERDOAR UNS AOS OUTROS!

Vamos continuar a trabalhar!

Isabel Romano Vieira, viúva do assassinado Presidente da República da Guiné-Bissau, General João Bernardo "Nino" Vieira, na companhia do Presidente interino Raimundo Pereira

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