FUNDAMENTOS DA DEMOCRACIA

 

 

 

 

 

 

Por: Camba Mar

 

 

Londres, 18 Janeiro, 2007

 

Não preciso de ser sismógrafo para me inteirar do terramoto político que o regresso do Generalíssimo tem causado ao sofrido mas firme país de todos nós: Guiné-Bissau.

 

Quero começar pela forma muito pouco transparente como o próprio regresso se processou. O Senhor General, como se sabe, deixou a Guiné na sequência de um golpe que há muito era esperado e, sobretudo, desejado. Por isso, mais do que um golpe militar, o referido afastamento foi uma manifestação popular. Mas para não perder o fio à meada, e retomando ao assunto, dizia que, à moda do nosso país, o regresso do General foi feito duma forma a todos os aspectos estranha à democracia e à transparência. Não é que, como cidadão, não tivesse todo o direito de retornar ao seu próprio país, mas tal como toda a gente esperava, havia certos requisitos que tinham de ser observados para que o retorno se efectivasse duma forma clara e legal. No entanto, para mal de todos nós, o regresso foi e é uma realidade nua e  crua, para além de muito dolorosa.

 

Parece que o Senhor, na altura em que deixou a Guiné, se comprometeu a certos condicionantes. Um dos quais residia na impossibilidade de se candidatar a cargos políticos por um período determinado, muito para além dos seis anos em que ele esteve exilado em Portugal. Ou será que, conforme a lei de exilo, o seu movimento só se confinou ao território português durante esses seis anos?

 

Por outro lado, lembro-me perfeitamente de, na altura, um dos principais críticos do General ser o Senhor Francisco Fadul, precisamente o seu principal apoiante na segunda volta das eleições de 2005. O Senhor Fadul, então Primeiro-Ministro do governo de transição, defendia a necessidade de o General ser trazido à justiça para ser julgado, nem que sob uma pena simbólica, de modo a seguir em frente no âmbito de um possível processo de reconciliação entre todos os guineenses. Ainda segundo a ‘gelatina’ política que é o Fadul, um pretenso julgamento do Senhor general, além de contribuir para a erradicação do clima de impunidade reinante na Guiné-Bissau, ajudaria muito para destruir uma certa regra de ‘intocabilidade’ em relação à figuras proeminentes da nossa praça. Paradoxalmente foi este Senhor, contra todas as expectativas, um dos principais responsáveis da situação de penúria em que todos os guineenses se encontram actualmente, por ter contribuído grandemente para o regresso dos vícios do passado.

 

E como se isso não bastasse, o Senhor Fadul, ou a referida ‘gelatina’ política, além do apoio inequívoco - não sei a troco de quê - dado ao General, foi um dos impulsionadores da queda do governo legitimamente eleito, do Senhor Carlos Gomes Jr., talvez o melhor primeiro-ministro que a Guiné teve desde sempre.

 

Mudando um pouco de direcção, de lembrar que a 12 de Março de 1947, o presidente americano, Henry Truman, proferiu um memorável discurso ao Congresso americano, tido como um dos momentos mais marcantes da ‘Guerra Fria’, denunciando as pretensões e, consequentes movimentações russas (na Turquia, Itália e Grécia), anunciava aquilo que deve ser os fundamentos de qualquer regime democrático. É um excerto que vou tentar traduzir, correndo os riscos habituais de trair o original. Faço-o simplesmente como um alerta ao défice democrático reinante no actual governo e na presidência guineense. Assim:

 

· O dever das nações mais influentes é o de socorrer os povos vítimas de opressão, de arbitrariedades e totalitarismos de dirigentes tiranos no seio das respectivas sociedades.

 

· É importante que os povos se insurjam contra arbitrariedades dos seus respectivos dirigentes políticos, e que resistam à políticas susceptíveis de ser lesivas para o seu bem estar e prosperidades.

 

· Aos povos devem ser dadas oportunidades de escolher livremente entre alternativas. Essas alternativas devem ser respeitadas pelo poder político, já que toda a legitimidade política parte do povo. Na Guiné-Bissau, a vontade do povo não foi  nem tem sido respeitada.

 

· Uma forma de legalidade política é aquela que é baseada na vontade da maioria, e marcada por instituições e órgãos de soberania livres, governos representativos da vontade da maioria, eleições livres, garantias de liberdades individuais, liberdade de expressão e de crenças, além duma inequívoca condenação à opressão política.

 

· Uma outra forma democrática é aquela em que a vontade da maioria deve prevalecer sobre a vontade da minoria.

 

· Um regime democrático é também aquele em que o povo é livre de qualquer clima de opressão ou constrangimentos. Onde a liberdade da imprensa escrita, da rádio e de qualquer outro meio de comunicação social constituem parte dos princípios sagrados a defender.

 

· A democracia fundamenta-se, igualmente, em eleições livres, não condicionadas e transparentes.

 

Ora, partindo destes pressupostos, a mim não me parece que a Guiné-Bissau seja um país legal.

 

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