Entre a Esperança e o Regresso ao Passado     

 

Francelino Alfa    

 

08.07.2005

                               

Na sequência da contribuição valiosa que todos têm dado para a edificação do nosso país e resgatar a nossa auto – estima muito afectada durante largos anos, junto a minha voz – uma questão de cidadania – para contribuir na sensibilização e fazermos do nosso país um país respeitável e respeitado no concerto das nações. Para que os guineenses não mais sejam vistos como coitadinhos e incapazes. Existem guineenses notáveis mas numa “luta” ou num equilíbrio de forças desta natureza não representam nada.

Para que, a partir do dia 24 de Julho, sejamos vistos de outra maneira perante os nossos vizinhos e da Comunidade internacional “Devemos pensar pelas nossas próprias cabeças”, CABRAL.

Bacai Sanhá ou Nino Vieira? Eis a questão!

São os dois iguais? Por quê? Qual é a alternativa que se nos oferece? Nenhuma. Portanto, estamos perante um facto consumado? Sim. Todavia, perante duas faces da mesma moeda há diferenças? Concerteza. Ambos são descendentes da “Pátria de Boé” mas Nino Vieira prometeu-nos Mundos e Fundos. Que tudo vinha de Madina de Boé!

Verdade seja dita: a Deus o que é de Deus e a de Nino o que é dele.

Fundos, sim. Vieram muitos fundos, milhões mesmo para o processo de Reconstrução da Pátria, contudo, foram para si e para a sua nomenclatura, hoje, alguns nas ruas da Amargura de SAUBI. Prometeu hospitais novos, vemos degradação dos antigos; prometeu liberdade, implantou Lei Marcial; prometeu Educação a toda a gente, assistimos bloqueamento e degradação de todo o aparelho Educativo com elevada taxa de analfabetismo ainda na ordem de 60/70% com uma ileteracia de pasmar.

Prometeu Justiça, praticou injustiças; prometeu infra estruturação do País, saneamento básico e cobertura nacional de rede eléctrica, vemos um País sem infra-estruturas, sem luz eléctrica e água potável onde a cólera tornou-se uma doença endémica; falou que a agricultura seria a prioridade das prioridades, facilitou o mercantilismo fácil e êxodo das populações rurais principalmente para SAUBI e pequenas e médias cidades, onde a monocultura da castanha de caju remetendo-nos à memória da época da monocultura de mancara (amendoim);

prometeu dignidade à pessoa humana, semeou mortes e tristezas; prometeu trabalho, dignificou a preguiça incentivando a ladroagem onde os contribuintes não valem; prometeu igualdade de oportunidades, assistimos graves desigualdades sociais; onde está a previdência social? A reforma? Depois dos nossos pais trabalharem a vida inteira!? E a nós o que nos espera? O que é feito do nosso desporto e da nossa Cultura Nacional? Onde está a habitação social prometida aos mais necessitados?

Antes a palavra de honra era a concórdia e harmonia nacional, assistimos discórdia, intolerâncias e tribalismos; a emigração forçada que raramente fazia parte das cogitações das pessoas de repente tornara uma realidade nua e crua e o desespero tomou conta dos guineenses, etc., etc., etc.

A industrialização do país que tinha sido começado no tempo do outro senhor, arrasou com ela e mandou tudo para as calendas gregas. Onde pára o “ex. - libris” do nosso turismo, ilhas dos Bijagós, Património Mundial da Biosfera? Destruída e desmantelada.

Hoje, diz que tem vergonha mas não tem medo. Este senhor jamais proferiu a palavra ARREPENDIMENTO. Pensem nisso meus caros compatriotas! Indignem-se e é legítimo e não aceitem serem enganados de novo!

Por tudo isto e por outras mais é que devem comparar estas duas figuras. Da diáspora nem querem ouvir falar, fingindo esquecer das nossas importantes e gigantescas remessas financeiras para o equilíbrio da nossa desgraçada Balança de Pagamentos.

A história podia começar assim. Era uma vez um menino que não quis ser presidente e que tinha um sonho: salvar o mundo. Veio de Sunculum e tinha liberdade, igualdade, fraternidade e justiça no coração e tropa foi a sua opção. O povo não o conhecia e o tempo também e, o menino foi crescendo até que se fez homem. Nessa altura, pensava que tinha a missão divina de “Salvador da Pátria”. Como não tinha cabeça para estudos, resolvera fazer-se ao mar à procura do destino que lhe fora incumbida por DEUS. Como era bastante trapalhão, levou muito tempo a avistar o porto de abrigo. Chegado ao local, ei-lo tomando rédeas da embarcação até que se assentou.

Qual espanto qual quê, a notícia do povo fez-se saber que o menino fora raptado e levado para longe, para um lugar desconhecido. Outras vozes falavam que fora apanhado a fim de ir cumprir serviço militar obrigatório, pois, andava nas ruas de SAUBI sem beira nem eira e com algumas práticas de vandalismo pondo em perigo as instituições de Estado.

O sururu instalara-se durante algum tempo sem que ninguém ousasse levantar a voz. Passaram dias, meses, anos e o silêncio tomara conta das conversas do povo. Cada qual se interrogava do eventual paradeiro de ABSOLOM, nome dado pelo “pai”. Afinal, era o único rapaz num agregado familiar de 5 pessoas.

Passado um ano, quando ninguém esperava, eis que chegara a notícia que dava conta de que o jovem ABSOLOM alistara na frente de combate no sul de Sunculum. SAUBI era e continua a ser uma cidade pequenina e rapidamente o povo ficou a saber, mas ninguém o admite e muito menos em voz alta porque as paredes falavam e, qualquer espaço era antena parabólica e todo o objecto que se mexia, constituía uma ameaça devido ao perigo que espreitava a cada esquina. Esse perigo tinha um nome: PIDE – DGS (Polícia Internacional de Defesa do Estado) do Estado Novo, cuja prática era prender e torturar todos aqueles indivíduos de quem suspeitavam que possuíam 2º grau – hoje 4º ano do 1º ciclo em Portugal - e que “sabiam muito” e que podiam pôr em causa as leis da Pátria.

Mais anos passaram, no entanto, de quando em vez chegava as notícias das suas façanhas nas matas do sul. O ambiente em SAUBI e nas restantes cidades de Sunculum era de uma alegria triste consubstanciada na total falta de liberdade. Os que viviam no interior profundo, apesar de gente simples e trabalhadora eram considerados terroristas. Os que viviam nas cidades eram os agitadores natos à boa ordem pública e como tal, eram os indesejados.

Na tabanca (aldeia) que o adoptou, fora rebaptizado com o nome de SHAKA em homenagem ao rei ZULU dado a sua bravura. O ainda jovem SHAKA teve o privilégio de ir estudar para o estrangeiro. Após a sua formação militar intensiva voltou às origens para cumprir o que a missão divina o teria incumbido – anunciar a libertação do jugo dos “Colompés” nas sagradas colinas de Boé. O jovem tinha mesmo vocação para as armas. Era o prenúncio de um comandante em chefe

Ironia de destino: todos aqueles companheiros de armas que o ajudariam no seu sonho – um sonho impossível não fosse o apoio e lealdade dos mesmos, que sempre o aconselhavam e encorajavam-no a ter fé e esperança que um dia a sua opção seria recompensada - ou porque foram mortos ou porque foram “castrados”(!) ou porque estão completamente dementes.

Ao longo de 18 anos governou Sunculum com mão de ferro; instituiu um Estado - Polícia cuja estratégia era dividir para melhor reinar; implantou o medo, corrupção não a pequena corrupção mas aquela que levou a degradação total das instituições do Estado de Sunclum.

 Nepotismo e compadrio quanto baste; injustiças e a impunidade a “la palice”; fuga das pessoas mais qualificadas, promovendo a mediocridade e subserviência, destruindo as emergentes forças sociais. Resultado: Sunculum transforma-se num Estado Feudal, um modelo de autocracia pessoal.

Como há sempre alguém que diga que não, Sunculum entra em guerra e assiste-se estupefacto à rebelião entre irmãos em que o agora único general de 5 estrelas acompanhado por meia dúzia dos seus apaniguados, acantonam-se em SAUBI chamando as tropas expedicionárias de SENEGUI e de GUINECÓ em seu auxílio para matar o seu próprio POVO fazendo-nos lembrar MUSSOLINI e a “República de Saló”. Ao fim de 11 longos meses Sunculum fica completamente sitiada, saqueada, destruída e com muitos mortos ainda por apurar. O general dizia, guerra é guerra. São crianças sem pais, mulheres sem maridos, famílias inteiras mortas...

O general sem medo fugiu cobardemente a quatro pés pedindo asilo político ao país que em tempos fora alvo de acusações e ataques sem quaisquer contemplações. O asilo foi-lhe concedido em nome dos direitos fundamentais da pessoa humana - o direito à vida. Que cara de pau! Finalmente, o POVO volta a rejubilar-se de alegria e aclama LIBERDADE. Sol de pouca dura.

Vivia-se novamente poucos momentos de felicidade e a auto - estima estava novamente em alta.

Sete anos volvidos, parece que toda a gente teve momentos de ataques de Amnésia recebendo – o triunfalmente num país profundamente dividido e marcado pelo sentimento do voto étnico e religioso. Sunculum nunca foi dessas coisas dizem muitos. Ideias feitas. É só para o inglês ouvir, dizem tantos outros.

Soubemos da notícia este fim-de-semana (2/3 de Julho de 2005) e na 2ª feira desta semana, Kumba Yala e Francisco Fadul ambos fugiam de Nino Vieira como o Diabo foge da Cruz, apoiam o General.

Provavelmente os ingénuos perguntarão por quê? Para aqueles cidadãos atentos à realidade do martirizado Sunculum, esta notícia não constitui qualquer surpresa facto que vem dar razão àqueles que vaticinavam este cenário. Dirão, ligações do passado?! Outros ainda, perguntarão o que prevaleceu? O primado do “político “ sobre qualquer outro primado? Onde está a coerência? O que terão em troca? Teremos que estar atentos!

Há várias possibilidades: uma delas é, em caso da vitória do general, este Primeiro-Ministro demite-se, já o tem afirmado, devido a difícil coabitação entre ambos e, Francisco Fadul poderá vir a ser o potencial Primeiro-Ministro de Sunculum. Ambição e Poder é a coisa que não lhe tem faltado. A ver vamos! Pena, muita pena sentir-se-ão hoje, desilusão, provavelmente, até alguma raiva para àqueles que viam nele como dos poucos políticos locais com os “atributos” que nos levaria para o “Caminho da Glória”. Eu estou fora desse grupo por uma razão muito simples:

O seu estilo de fazer política...Oh (!) dá panos para manga!

A nossa vida política está cheio de exemplos desta natureza, só para citar um de um “renomado” jornalista da nossa praça que em tempos fora um acérrimo adversário de Kumba e eram como dois galos num poleiro, e dizia cobras e lagartos contra o ex. – Presidente mas acabou por se vender (!) por um lugarzinho de secretário de uma coisa (!) qualquer e hoje, tem processos a correr no tribunal regional de SAUBI, acusado de desvios de avultadas somas de dinheiro do erário público.

Contudo, o que neste momento urge questionar é:

1 – Queremos um regresso ao passado em que toda a escória que não sabe fazer outra coisa se não a “política suja” querendo voltar aos “papéis da Lórdia”? Ou queremos um futuro com estabilidade, harmonia, justiça, paz, amor, progresso e desenvolvimento? Em que a palavra de ordem seja: guineenses, uni-vos e toca a trabalhar! – O que não abunda por aquelas paragens – para uma GUINÉ MELHOR.

2   Aqueles que fizeram o 7 de Junho e os seus apoiantes estão arrependidos incluindo Fadul? Kumba afirmou várias vezes que foi um dos mentores e apoiantes do levantamento militar contra o General; que não temia novamente o confronto com ele porque este é um "defunto político" fim de citação; Francisco Fadul disse que foi quem redigiu o "programa" maior (!) da junta militar. Afinal, quem é o responsável ou quem são os responsáveis pelas mortes e destruição do nosso país? Ninguém?! 

Guerra é guerra como dizia o general?!

É isto a nossa, vossa política? Estas são as alianças. Uma de um demente e tolo com outro cujas mãos estão cheias de sangue é um barril de pólvora que a qualquer momento pode ser accionada. No meio de tudo isto até onde irá a aliança de um “Hiper inteligente e Super-homem” com o mesmo general?

Como será esta combinação matemática de três variáveis e apenas uma equação? Claro que é uma solução impossível!!!

 O general depois de 18 anos de reinado absoluto, tem uma falta de conhecimento das atribuições de um Presidente da República que é de uma barbaridade atroz de arrepiar.

Revejam as palavras dele durante a 1ª campanha para a presidência, falando em coisas como fazer isto, fazer aquilo ou exigir isto ou exigir aquele outro... um grande embuste!

 Aqueles que votaram por pertença étnica ou aqueles que pensaram que votariam em Kumba (que não por pertença étnica e são muitos (!)) para que o general não ganhasse é chegado o momento sublinho novamente de pensarem com as vossas próprias cabeças, CABRAL.

Muitos dirão que as nossas tradições, enfim, a nossa cultura é diferente da do Ocidente. Concerteza. Mas não é esta a questão. A questão de fundo é a impunidade e falta de equidade e de transparência no tratamento de questões delicadas; da falta de justiça. Esse general com processo nos tribunais é considerado um traidor à Pátria e foi recebido com pompa e circunstância como se nada tivesse acontecido com ele. Não é ser-se muçulmano ou laico – cristão! Não há aqui o combate entre DAVID e GOLIAS, como muitos querem fazer crer, não! O que está em causa é o regresso de um passado triste e tenebroso onde o futuro poder-se-á tornar mais uma vez de desgraça e mortes.

Acabado de chegar do exílio com muito, muito dinheiro não se sabe como, contrariando as vozes que diziam que o general estava pobre. Já não tinha nada. E mais e mais aquilo... não é o que se vê. Num país pobre acaba por comprar a consciência das pessoas. Lembrem que Cabral não mobilizou ninguém para a luta de libertação com ofertas de motorizadas, telemóveis, televisões, dinheiro,....

Alguém dizia que Sunclum é um país anedótico mas estas alianças podem perder a sua base social de apoio se o que está em causa é o nosso futuro colectivo.

Num país normal é Concerteza o que deveria acontecer. É o futuro dos nossos filhos e netos que está em causa! Reflictamos! Lembrem desta frase no comício do general em Bafatá onde dizia num tom desafiador: “ É mis ti, É kamisti, vitória” – querem ou não querem a vitória será dele. Quem são eles? Pensem e reflictam sobre esta frase. É demasiadamente forte para este candidato que já fez o que fez e deixou marcas profundas na nossa sociedade. O general foi quem mais contribuiu para a degradação que a Guiné vive hoje. A todos os níveis!

O discurso destes 3 senhores subjazem o modelo do quero, posso e mando. Basta! Estamos fartos! Há sempre quem diga, chega! O medo deve ser definitivamente banido da nossa sociedade! A DEMOCRACIA não coaduna com MEDO

 Junto a voz àqueles que não são pessimistas quanto ao nosso futuro mas temo a nova desintegração social. Nunca fui e nunca serei apologista de uso de força sobretudo por via das armas para a resolução de quaisquer que fossem os problemas. Nós vimos que os confrontos armados dentro de sociedades marcadas por " extrema pobreza" (a cada um o seu conceito de pobreza) e por instituições muito frágeis, que é assumidamente o nosso caso, assumem um enorme grau de explosividade e irradiação. Estas três alianças só por si não podem ganhar estas eleições apesar ainda da ignorância da maior parte das nossas populações e da sua consequente manipulação!

A verdade é uma afirmação da liberdade sinónima da Democracia. Vale mais ser livre um dia nas ondas do rio Geba, rio Cacheu ou rio Corubal do que viver toda a vida pobre, triste, preso e escravo e sem perspectivas!

Parafraseando Mandela a vós jovens, particularmente que deixo esta mensagem: “Às vezes cabe a uma geração ser grande. Vocês podem ser essa grande geração”. Escolham com consciência meus irmãos e pensemos na Guiné. Salvemos a Guiné – Bissau! Com DIREITOS mas com DEVERES também! Nunca se esqueçam disto!

INSHALLAH, veremos a luz ao fundo do túnel.

SHALON! Bem – haja e um abraço fraterno.

PROJECTO GUINÉ-BISSAU: CONTRIBUTO - LOGOTIPO

VAMOS CONTINUAR A TRABALHAR!

Projecto Guiné-Bissau: CONTRIBUTO

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