Ditadura do consenso nacional

 

Djugudés - Abutres. Foto de Carlos Galveias

 

 

Francelino Alfa

18.11.2005

 

 

 

A Guiné-Bissau entrou numa nova fase. A fase da velocidade do cruzeiro. A fase das reformas draconianas; a fase da justiça social; a fase de combate à corrupção e da impunidade; a fase do fim de compadrios e nepotismos; a fase da competência profissional e do trabalho, de combate as mordomias (...) a fase da liberdade e da verdade; a fase de segurança e de estabilidade; a fase da paz social e espiritual; novamente a fase de concórdia nacional; a fase do progresso e do desenvolvimento.

 

Se me é difícil entender quais os critérios na formação deste governo de unidade nacional, já os métodos utilizados não oferecem quaisquer dúvidas.

 

O “timing” e o momento para a sua concretização, deixa-nos perplexos e leva-nos a questionar uma série de coisas básicas, nomeadamente, a legitimidade do acto e a “moralidade” de certas figuras que fazem parte deste governo.

 

Toda a gente sabe que o país está muito pobre e atrasado; abandonado e em agonia, por motivos óbvios que todos conhecem também. Se neste momento, estamos com todos os estrangulamentos derivados de males que algumas dessas figuras fizeram no passado recente, faz todo sentido questionarmos quem é quem e porquê. E o que prevaleceu?

 

Provavelmente, este será porventura o governo com “três” primeiros-ministros e mais ministros e secretários de estado que não tem paralelo em toda a nossa história como Estado-Nação. Ministérios com nomes pomposos.  “I kudi”!

 

Tacho para que te quero! São os novos velhos protagonistas. Recusamos o passado, agora estamos condenados a revivê-lo. O “clube dos poetas e dos professores doutores”; o clube das divergências da convergência!

 

Em tempo de “vacas magras” quem suporta este “clube de tachos”?

Ninguém sabe qual é a duração temporal deste governo. Ou melhor, não nos foi dito nada acerca disso.

 

Muitos afirmarão que, em vez de analisarmos sistematicamente as causas, devemos atacar já os problemas. Concerteza. Estou inteiramente de acordo mas outros tantos dirão que os problemas só se resolvem quando conhecemos as causas.  Nenhuma terapia faz efeito se o diagnóstico é errado!

 

Isto é importante porque ajuda-nos a perceber os contornos das crises cíclicas que o nosso país tem vivido nestes últimos anos. Desculpem meus senhores, grave, grave, são pessoas que não têm opinião nenhuma.

 

Normalizar” as pessoas é impedi-las de pensar, de raciocinar. Vamos todos dizer, que queremos pensar e queremos raciocinar!

 

Devíamos aprender com a história e com os erros, mas não! Estas mudanças vieram mexer novamente com o quadro macro-económico quase a ser conseguido que posteriormente reflectir-se-ia no melhoramento do quadro social em constante ebulição.

 

Estamos perante encruzilhadas e, num país onde o mérito causa inveja, então podemos dizer que temos um problema: “defeito de competência” no nosso país! Há imenso talento tanto interna como externamente mas o desperdício sobrepõe-se! Quem é competente, assiste-lhe constantemente degradação profissional.

 

Precisamos de políticos “profissionais” e de deputados, concerteza. Mas o máximo que certos personagens possam almejar é ser deputado. Aí sim, no parlamento, podem entrar mudos e sair calados durante 4 anos.  Fazer politiquice. Ah! Para ministros de propaganda e contra-informação, sim!  Não mais do que isso! O que irrita no nosso país e deixa os guineenses revoltados, é a cultura da impunidade, da bagunça e do desrespeito constante pelas leis e regras sociais. O desrespeito pelos  direitos humanos. É a cultura da força bruta.

 

Se há personagens neste governo em que a sua competência tecnico-profissional e a sua “moralidade” são indiscutíveis para determinados lugares, há outros que isto deixa muito a desejar. Outros, não porque não querem, mas porque não sabem e não podem. É tão simples como isso.

 

No passado não muito longínquo, alguns “nadaram” de “tacho em tacho” sem nos apresentarem quaisquer melhorias ou resultados concretos e mensuráveis no desempenho das suas altas funções. Outros, vão à experimentalismo leviano! Outros ainda, só roubaram e enriqueceram à custa do erário público. Que triste a nossa sina! Isto estava tudo preparado para que assim fosse!

 

O país está doente e as maleitas têm várias origens e uma delas é exactamente isto: incompetência e má fé.

 

Este governo é o governo das divergências da convergência com suporte institucional e à imagem do “rei” Shakazulu. É a dinastia Shakazulu em força!

 

Com isto poderemos assistir o regresso do autoritarismo suave mas que tenderá a muscular-se quando aparecem vozes discordantes. Onde criticar comportamentos e atitudes menos adequados e abonatórios dos nossos políticos, seremos severamente punidos com espancamentos, torturas, abusos de poder e (...)

 

Nisto, a comunicação social, os jornalistas, claro, (...) a sociedade civil em geral, têm responsabilidades acrescidas para denunciar todas as atrocidades,  barbaridades, enormidades, corrupção (...). “Água mole em pedra dura tanto bate até que fura”. O não se poder fazer nada, estimula a que não se faça nada.

 

A violência e inverdades comprometem seriamente o diálogo e a concórdia nacionais.

 

Se não há perspectivas de culpabilização, hoje e amanhã por parte de alguém, o sistema ou os vários sistemas mantêm várias situações de injustiças. Não vou agora enumerá-las aqui, pois, elas são sobejamente conhecidas por todos.

 

Assistimos a uma persistência de desigualdades de oportunidades e de discriminação que, para alguns, podem achar que não é importante. É preciso reflectir e rectificar a situação de “excluídos” na sociedade bissauguineense.

 

São guineenses que fogem do país e morrem na fronteira de Mellila em Espanha porque os nossos governantes não nos oferecem perspectivas de uma vida condigna. Uma vida com esperança no futuro.

 

Nós somos um povo combativo, resistente e criativo, por isso, perante esta situação, se não reformarmos o “Estado social” – combate à pobreza, que deve ser a mãe das nossas batalhas,  não tenho dúvidas que a instabilidade será o pão nosso de cada dia. De crise em crise: tais políticos, tal país.

 

Depois, andamos nisto: um país ingovernável.

 

O que precisamos neste momento é de um choque de cidadania para sensibilizar as pessoas para os problemas estruturais sérios e graves do nosso país.  Estamos a ficar cada vez mais para trás. Portanto, só com trabalho  é que as pessoas podem realizar e tornar o nosso país “grande”. É realmente disto que o país precisa!

 

Temos um atraso estrutural grande, comparativamente a todos os nossos parceiros da CEDEAO (Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental). É a ineficiência dos serviços públicos  que se limitam a administrar a miséria; (...) ; uma classe política que conhecemos; uns responsáveis pela educação e saúde adormecidos e desinteressados pelo futuro das nossas crianças e da nossa juventude, logo, pelo futuro da nossa terra.

 

Não é preciso ser gestor ou economista  para perceber que não há investimento que crie riqueza que valha e possa ser redistribuído, num ambiente de permanente instabilidade político-social. São governos de 6 meses, 1 ano, 1 ano e meio. Não há país que resista a isto. Resultado: pobreza.

 

Alguém dizia que somos bons a fazer a transição. Sabemos que há hábitos que se fazem “leis”, porém,  não queremos que esses (os hábitos) se transformem  em doutrina.

 

Os governos são eleitos para governar num determinando período temporal com o seu programa. Não vou discutir aqui os porquês  mas por mais que nos querem convencer, este governo foi constituído à imagem do PR.

 

Hoje, vivemos em mentiras e ter o defeito da competência e seriedade não vale. É a classe política de alcateia que temos. Já vai sendo tempo de darmos dignidade aos nossos cidadãos. Até quando teremos de continuar a ser um povo que teme a verdade?!...

 

Viva a ditadura do consenso nacional! Viva o governo de unidade nacional! Viva o governo das negociatas! Viva a Guiné-Bissau!

 

Um bem haja

 

Um abraço fraterno

 

PROJECTO GUINÉ-BISSAU: CONTRIBUTO - LOGOTIPO

VAMOS CONTINUAR A TRABALHAR!

Projecto Guiné-Bissau: CONTRIBUTO

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