Custo de Oportunidade

 

 

Cajú. Fruto e castanha - Foto de Carlos Galveias

 

Cajú: fruto e castanha -  foto de Carlos Galveias

 

 

Por: Francelino Alfa

 

 

06.09.2006

 

 

Cada espingarda que é produzida, cada barco de guerra que é lançado ao mar, cada granada que é disparada significa, em última instância um roubo a quem tem fome e não tem o que comerPresidente Dwight D. Eisenhower

 

 

Com estas palavras do ex-presidente dos EUA começo por questionar por que são alguns, poucos indivíduos ricos e outros, muitos são pobres? Por que é hoje difícil encontrar trabalho? Qual o efeito do desemprego e da inflação nas nossas vidas? Por que optamos por especializar só na produção de castanha de caju e não aumentar a diversificação para diferentes áreas? O que é o Orçamento Geral de Estado (OGE)? Para que serve? Qual ou quais o (s) benefício (s) efectivamente do regresso de muitos dos nossos emigrantes ao país?

 

Deve o salário mínimo nacional ser aumentado? Devem os governos ajudar aos pobres ou quanto deve o país despender com a defesa e a segurança? Quais são as causas do aumento da pobreza na nossa terra? Deve o défice do Estado ser reduzido através de impostos mais elevados ou de uma menor despesa? Qual seria a solução para a nossa desgraçada balança de pagamentos e para o nosso défice comercial? Qual seria a previsão do crescimento económico para este ano?

 

Por que razão certos países conseguem avançar mais rapidamente do que outros? Qual a forma ou a fórmula de o nosso país pobre poder iniciar a caminhada do desenvolvimento económico? O comércio internacional é justo? Quais são as responsabilidades do mundo desenvolvido? As preocupações científicas acerca do aquecimento global do planeta e do aumento da Sida são mais que legítimas? O que é um filantropo? (…), etc.

 

Não se encontram aqui respostas definitivas porque mais do que factos, envolvem princípios e valores morais. É precisamente destes assuntos que responde a economia e são resolvidas através de decisões políticas.

 

Portanto, a economia cobre todos os tipos de assuntos. Mas no essencial está dedicada a compreensão de como a sociedade faz a afectação dos seus recursos escassos para produzir bens com valor. Simultaneamente com o estudo das consequências da escassez (um facto central na economia), a economia tenta descobrir os 1001 puzzles da vida quotidiana e como os distribuem entre os seus diferentes membros.

 

Afinal, a forma como apercebemos os factos observados depende do enquadramento teórico que usamos. Talvez o maior obstáculo ao domínio de questões económicas derive da subjectividade que levamos para o estudo ou compreensão da realidade que nos rodeia. Quero aqui reconhecer a (necessária) subjectividade das minhas observações e teoria. A análise económica permite que os factos possam ser transformados em teses gerais. E as experiências permitem-nos testar diferentes hipóteses económicas. É importante a ligação entre a memória e a história. A memória (colectiva?!) é curta e as coisas duram enquanto duram. É o que é! Hoje, falo do custo de oportunidade derivado a problemática da campanha de castanha de caju deste ano e das externalidades que provocou.

 

Para os que não sabem, externalidades – significa actividades que afectam terceiros, positiva ou negativamente, sem que esses tenham de pagar ou serem compensados por essas actividades. Elas ocorrem quando os custos ou benefícios vão de uma para a outra entidade. Ou seja, as externalidades surgem quando não são incluídos nos preços de mercado todos os efeitos colaterais da produção ou consumo.

 

A vida está repleta de escolhas. Uma escolha pressupõe um custo de oportunidade porque escolher uma coisa num mundo de escassez significa prescindir de outra coisa qualquer.

 

Devido aos recursos serem escassos temos constantemente de decidir o que fazer com o rendimento e o tempo que possuímos em quantidade limitada. Devemos produzir mais castanhas de caju ou os governos acelerarem a industrialização à custa da agricultura? Devem os nossos governos investir mais no capital humano ou apostar na corrupção, na birra e no luxo que o país não suporta? Devem os nossos governos apostar na política de desenvolvimento regional ou centrar as suas atenções na capital, Bissau como tem estado a acontecer? 

Devemos obter, formação profissional, ou uma pós-graduação ou começar a trabalhar logo após a universidade?

 

Em cada um destes casos, temos de tomar uma decisão o que nos obriga a prescindir de alguma coisa.

 

A Guiné hoje, não é a Guiné do antes do conflito de 1998. A Guiné hoje, é um “mix” dos senhores da guerra, … e dos que serviram o poder sob a batuta do algoz. Aquele que um dia chamaram de carrasco! Todos estão calados. Um silêncio ensurdecedor. Indiferença!? A Guiné hoje, é um país virado às avessas! A política, a moral a ética está tudo adulterada. A Guiné hoje, está de tanga! A pergunta impõe-se: fazia sentido a guerra civil?

 

Portanto, o custo de oportunidade de uma determinada acção não é nada mais, nada menos aos custos suportados, pela realização dessa acção em vez da realização da sua melhor alternativa, ou seja, é o que se perde por optar por outra alternativa.

 

O custo de oportunidade do levantamento militar não trouxe nada de positivo à nossa sociedade pelo contrário Deixou marcas profundas. Semeou mais divisões e ódios entre nós. As instituições do Estado funcionam pessimamente; o país ficou mais atrasado e os guineenses estão mais pobres; não há trabalho; há um aumento do analfabetismo funcional; a ignorância, essa nem se fala; o desemprego aumentou exponencialmente para níveis insustentáveis; a nossa juventude (nem todos!) está indolente, indigente e perdida; as nossas mulheres são hoje, o pilar da família; a justiça e a segurança pioraram; a corrupção, a falsificação e a economia subterrânea (tais como o comércio de droga -, “ipatchari”!,  a prostituição e o jogo ilícito que hoje se verifica nas nossas ruas à vista das autoridades sem qualquer resposta) e tráfico de influência se institucionalizaram; o crime organizado é prática.  

 

A Guiné hoje, o custo de oportunidade é a sistemática violação das leis e dos direitos humanos e o desrespeito continuado das regras sociais; o Estado de letargia “engordou” e está ineficaz, os militares experimentam a reconciliação no seu seio, o bode expiatório das intrigas e guerras intestinais; o país está falido. É a confusão; os guineenses andam nervosos, deprimidos e agressivos e sem deslumbrarem perspectivas nas suas vidas; os novos actores e protagonistas são os donos da república, os novos-ricos. Estão arrogantes e insuportáveis. Tontos até! Fazem o que lhes vem à tona: compram a justiça, a segurança, a educação etc. Compram tudo!

 

Ora, a Guine hoje, apostou só e perigosamente na produção da castanha de caju em detrimento de todos os outros produtos. Sem dúvida, é essencial algum grau de especialização. Sabemos os ganhos económicos da especialização quer dentro de um país quer entre países, dado que a divisão do trabalho permite um grande aumento da quantidade e da variedade dos bens e dos serviços produzidos. Contudo, a especialização de um único bem económico pode tornar-se perigosa. Foi exactamente o que aconteceu este ano com o nosso “petróleo”, o nosso “diamante”.

 

As flutuações de preços no mercado internacional terão um grande efeito sobre a balança de comércio externo e sobre os rendimentos reais. Isto mostra claramente como a nossa economia ainda é uma “monocultura” isto é, tem das suas exportações concentradas num único produto. Isto leva-nos provavelmente a má memória da monocultura do amendoim.

 

A campanha da castanha de caju correu mal. O Estado, o governo, todos falharam. Quando o mal é da nação, nem a poder de sabão. Senão vejamos: na abertura oficial da campanha no leste do país, o Primeiro-Ministro na qualidade de chefe do governo, anunciara o preço de referência do mercado em 350 francos CFA o quilo; os intermediários/comerciantes alegaram o preço ter sido alto e boicotaram a compra da castanha junto dos agricultores/produtores justificando com elevados custos de transporte e da logística e, os agricultores/produtores, os mais fracos, totalmente dependentes deste bem económico, por sua vez, acharam por bem o valor de referência fixado pelo governo e, gerou-se o braço-de-ferro entre as duas classes. A situação tornou-se num impasse durante um mês e meio.

 

O governo na sua função de estabelecer as regras de jogo, decretando as leis e garantindo o cumprimento dos contratos e dos direitos de propriedade servindo-se até de “medianeiro” entre as partes, chamou a si a responsabilidade de criar uma empresa “ad hoc” (!) denominada “Guiné-Bissau Marketing”, uma espécie de sociedade anónima, uma empresa híbrida e fictícia com estatuto de responsabilidade limitada garantido pelo Estado que, providenciasse a compra de toda a castanha de caju junto dos agricultores/produtores e tratar da sua exportação. Essa tentativa sortiu em nada. Apenas fogo de artifício para animar as hostes.

 

Chegou entretanto a “rainha Margó” anunciando também que iria comprar toda a castanha de caju ao preço de referência fixado pelo governo no valor de 350 francos CFA. Os agricultores/produtores esfregavam as mãos de contentes mas deu em fumaça. Antes que conheças, não louves! Portanto, era a confusão e o diz que diz. No entanto, o assunto tornou-se tema de conversa, discussões e críticas na praça pública. Os agricultores/produtores sempre na expectativa de verem os seus produtos comprados/vendidos por um lado, e intermediários/comerciantes por outro, e o governo em lado nenhum. Na Guiné hoje, nas regiões, podemos comprar a castanha de caju ao preço de 50 francos CFA o quilo e as famílias a passarem fome.

 

O Estado tem um papel vital no estabelecimento e manutenção de um ambiente económico saudável. O governo tem de fazer respeitar a lei e manter a ordem, salvaguardar o cumprimento dos contratos e orientar as suas regulamentações no sentido da concorrência. Sabemos também que deve minimizar a sua intervenção ou controlo em sectores em que não haja vantagem comparativa.

 

É este o governo que temos (!) que tinha uma ideia clara da elasticidade da procura deste produto durante o período da campanha e que devia centrar os seus esforços em tentar corrigir os sinais claros das falhas do mercado e, devia também desmantelar os impedimentos regulamentadores do sector privado em áreas como esta em que o Estado teve claramente desvantagem comparativa para estimular a eficiência e não o fez.

 

Muitos questionam se vale a pena apostar neste produto. Outros tantos afirmam que, quem fala com surdos perde o seu latim. Ao recusar o nível básico de ajuda que era necessário, este governo está a deixar morrer milhares de agricultores e a pôr em perigo a nossa segurança alimentar.

 

Salientei os ganhos económicos da especialização com vantagens de custo que a mesma traz consigo mas quando um país está excessivamente especializado numa única mercadoria, a prudência sugere que sejam planeados esforços para aumentar a diversificação para diferentes áreas (em particular, áreas em que as oscilações dos preços sejam independentes ou até contrárias às da actual área de especialização).

 

Diziam os intermediários/comerciantes que os preços da castanha de caju no mercado internacional tinham baixado significativamente. Esse era o motivo maior para que não aceitassem o preço de referência fixado pelo governo. Portanto, se a procura e a oferta da castanha de caju são voláteis – temos a natureza que, ora num ano chove regularmente ora no outro quase que não chove (por exemplo, este ano, até este momento que escrevo este artigo, tem chovido pouco. Só a título de curiosidade e para a vossa informação, desde Maio, até 29 de Agosto, contabilizei 44 dias de chuva em Bissau. A região norte do país está pior) – e se podem ser encontradas boas oportunidades de investimento no sector agro-pecuário (produção de carne – temos boas condições) ou nas pescas seria bom para nós e limitar-nos-ia a tendência de mercado para a especialização somente na produção da castanha de caju.

 

O custo de oportunidade da produção e da campanha da castanha de caju este ano foi um fiasco!  

 

Como conclusão diria que é um desastre para países como o nosso, quando os preços das mercadorias primárias se reduzem. A campanha da castanha de caju correu mal, devido à incompetência deste governo. Um governo de lunáticos! A fanfarria sempre ao rubro. Um governo que nos fala na esperança, do dia da chegada de um tal paraíso da abundância! Boa! A ver  vamos!

 

Como vivemos sistematicamente das expensas e da caridade da comunidade internacional com a agravante das mesmas serem sistematicamente desviadas para o enriquecimento pessoal dos nossos governantes e dirigentes, o nosso custo de oportunidade é o ciclo vicioso da pobreza e do subdesenvolvimento onde o rendimento per capita é baixíssimo, logo, o país não consegue poupar e investir e ocupamos principalmente da produção agrícola de subsistência. Actualmente, a utilização das culturas agrícolas tradicionais não garante, na maioria dos casos, um rendimento satisfatório aos agricultores. Por isso, hoje, ninguém quer trabalhar no campo e a agricultura é praticada por uma população envelhecida, sem formação técnica e, geralmente, desanimada com a situação actual. Há muitas pessoas que apontam para o papel da sorte na determinação das circunstâncias económicas. Mas como dizia Louis Pasteur: “a sorte favorece somente os espíritos que estejam preparados”.

 

Francelino Alfa

 

Um bem haja

 

Mantenhas

 

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VAMOS CONTINUAR A TRABALHAR!

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