A dupla de generais

 

Por: Fernando Casimiro (Didinho)

04.04.2006

Nino Vieira e Tagme Na Waie - Foto de Jorge Neto

 

Para se fazer uma guerra, deve o país ser informado e, logicamente, com um pedido  de apoio para essa mesma guerra. A Guiné-Bissau é de todos os guineenses e ao povo guineense deve-se dar conhecimento de situações beligerantes, em que a vida de irmãos nossos são colocadas em risco e as estratégias de desenvolvimento são postas em causa pelas consequências dessa mesma guerra.

O país está em guerra e não houve nenhum discurso à Nação dando conta dessa guerra. O povo que é chamado a votar nas eleições, a quem se pede perdão quando convém, é simplesmente ignorado e desconsiderado quando os interesses pessoais estão acima dos interesses nacionais. E nesta guerra, uma vez mais, os interesses pessoais estão acima dos interesses nacionais!

 O (des) governo em funções na Guiné-Bissau não definiu o conflito armado contra os independentistas de Casamança como condição prioritária do seu programa de (des) governação.

Este mesmo (des) governo, até criou em Janeiro deste ano, uma comissão de análise, seguimento e avaliação permanente da situação na fronteira entre a Guiné-Bissau e o Senegal, com o objectivo de definir uma estratégia e elaborar um programa de acção por forma a estabelecer uma mediação através do diálogo, que proporcionasse uma solução pacífica e duradoura no conflito entre o Movimento das Forças Democráticas de Casamança e o governo do Senegal.

Este mesmo (des) governo em funções, sabe que a estabilidade política e social que cada vez mais se torna numa miragem para a Guiné-Bissau e para os guineenses, é condição essencial para se trilhar o caminho do desenvolvimento. Sem estabilidade política e social, não pode haver investimentos sérios no país.

Este mesmo (des) governo sabe que, a Guiné-Bissau vive de ajudas e financiamentos internacionais, portanto, não deve fomentar uma guerra e, por conseguinte, esbanjar dinheiro de contribuintes de muitos países que continuam a ajudar pontual e desinteressadamente a Guiné-Bissau.

 Este mesmo (des) governo sabe que a Comunidade Internacional está de olhos postos na Guiné-Bissau.

Este mesmo (des) governo também sabe que a guerra é sempre uma má opção, a pior das opções!

Porquê então a guerra?

A guerra, porque o país é dirigido por 2 generais de meia tigela, que só demonstram (não têm) coragem por terem batalhões sempre a escoltá-los!

A guerra, porque há contas a ajustar com a humilhação e o derrube do general ditador Nino Vieira em 1999.

A guerra, porque noticiou-se uma tentativa de golpe de Estado em Mansoa, o mês passado, o que fez reavivar a memória da cumplicidade dos rebeldes de Casamança com a Junta Militar de Ansumane Mané aquando do conflito militar de 98/99 na Guiné-Bissau.

A guerra, porque o anúncio do Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, o general iletrado, Tagme Na Waie, dando conta da elaboração de uma lista de militares guineenses a serem expulsos das Forças Armadas por terem feito campanha aquando das eleições presidenciais, no mesmo dia que se noticiou essa tentativa de golpe, fez com que algumas movimentações fossem interpretadas como indo ao encontro dessa notícia, comprometendo igualmente os rebeldes de Casamança, a facção armada de Salif Sadio, como parte desse golpe.

A guerra, porque o general ditador Nino Vieira deu ordens ao general iletrado Tagme Na Waie no sentido de controlar a fronteira e os rebeldes liderados por Salif Sadio, pois o suporte (homens e armas) para um possível golpe de Estado poderia estar nas áreas de movimentação dos rebeldes.

Há mais de vinte anos que todos sabemos que a região da fronteira norte da Guiné-Bissau e o sul do Senegal é uma zona de movimentações militares. Casamança, que outrora esteve vinculada ao espaço da Guiné dita portuguesa e que foi alvo de troca/venda (entre Portugal e a França ) em 1886 com Cacine, zona sul da Guiné-Bissau e outrora vinculada à Guiné, dita francesa, viu criado um Movimento de luta pela sua independência no longínquo ano de 1947.

 Sabemos igualmente que, a separação pela delimitação de um novo espaço fronteiriço entre o Senegal e a Guiné, dita portuguesa, na altura, não quebrou as raízes e afinidades fraternas das populações dessa mesma zona fronteiriça, o que nos dias de hoje ainda é uma realidade, que esta própria guerra confirma.

A guerra, porque a estratégia do general ditador Nino Vieira inclui igualmente o desgaste do general iletrado Tagme Na Waie, por forma a que seja sacrificado pela opinião pública guineense e, assim, mais facilmente poder substituí-lo das suas actuais funções por alguém de sua confiança, pois ainda que pareça, Tagme Na Waie não é da confiança de Nino Vieira! Há um misto de cinismo e de hipocrisia na forma como o general ditador se refere ao Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, porém, o momento de se desenvencilhar de Tagme Na Waie ainda espera por mais favores enumerados por Nino Vieira e que por força das circunstâncias, só Tagme Na Waie poderá dar ordens de execução ou executar pessoalmente esses favores já listados por Nino Vieira.

A guerra, porque é preciso sondar a reacção da Comunidade Internacional em relação aos argumentos justificados com o desencadear da guerra. Diz-se que está em causa a soberania nacional.

Se não houver críticas, nem reparos da Comunidade Internacional, os argumentos servirão para se fazer a "limpeza interna", e basta tomarmos em consideração as várias ameaças proferidas por Tagme Na Waie, quer a deputados, quer a jornalistas e a quem quer que seja, que tenha uma opinião contrária ao desencadear da guerra, para chegarmos à conclusão de que o ajuste de contas de Nino Vieira está em marcha.

Hoje, volto a reafirmar a minha discordância em relação aos elogios feitos por Kofi Annan, Secretário Geral da ONU ao Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas da Guiné-Bissau, Tagme Na Waie, devido ao seu empenho pessoal na reconciliação nacional dos guineenses em geral e dos militares guineenses em particular.

Por duas vezes Kofi Annan elogiou a acção de Tagme Na Waie. É caso para perguntar: que tipo de informações chegam a Kofi Annan sobre a situação na Guiné-Bissau?

Como pode alguém como Tagme Na Waie reconciliar os guineenses? Ou melhor seria perguntar: Como pode Kofi Annan elogiar Tagme Na Waie?!

Ah, ia me esquecendo também que, a guerra, porque há que retribuir favores ao Senegal e, por via disso, à França, dona dos maiores interesses económicos na região!


Movimento rebelde senegalês mata cerca de 60 soldados guineenses
         Ziguinchor, Senegal  (PANA) -  Pelo menos 60 soldados guineenses foram

mortos e vários outros ficaram feridos desde o início dos confrontos,

a 14 de Março, entre o Exército da Guiné-Bissau e os partidários do

chefe da ala armado da Movimento das Forças Democráticas de Casamança

(MFDC), Salif Sadio, soube a PANA no fim-de-semana de fontes

militares.



As fontes precisaram que alguns dos soldados foram mortos em combate

e os outros accionaram minas antipessoal.



Os confrontos, que decorrem na fronteira entre o Senegal e a Guiné-

Bissau, opõem duas facções dos rebeldes senegaleses do MFDC, a de

Salif Sadio e a de César Badiate apoiado pelo Exército guineense.



De acordo com as mesmas fontes, pelo menos 500 soldados guineenses

deixaram o campo de batalha entre quinta e sexta-feiras e regressaram

à sua base em São Domingos, cidade da Guiné-Bissau situada a cerca de

10 quilómetros da fronteira com o Senegal.
Ziguinchor - 03/04/2006
Forças Armadas guineenses queimam residências de refugiados
         Ziguinchor, Senegal (PANA) -  Casas de refugiados da província de

Casamança (sul do Senegal) que viviam nas aldeias situadas ao longo

da fronteira com a Guiné-Bissau foram queimadas pelo Exército

guineense, informaram à PANA fontes seguras.



Os militares guineenses acusam os refugiados de cumplicidade

com os rebeldes do Movimento das Forças Democráticas de Casamança

(MFDC) partidários do chefe da sua ala armada, Salif Sadio, contra a

qual combatem há cerca de duas semanas.



Mamadou Diémé, um dos refugiados de Casamança que vivia na

localidade guineense de Sunkutoto, disse que as habitações foram

queimadas pelos soldados da Guiné-Bissau.



"Quando eles chegaram mandaram-nos sair das nossas casas e depois

incendiaram-nas", afirmou Diémé, acrescentando que a maior parte

deles nem sequer tiveram tempo de tirar os seus bens.



"Eles pensam que apoiamos os rebeldes da facçã de Salif Sadio. Eles

acham que permitimos os elementos de Salif Sadio ocupar as aldeias

onde habitamos", disse, revelando que alguns dos seus camaradas foram

detidos e conduzidos a São Domingos (noroeste da Guiné-Bissau) como

prisioneiros de guerra.



Entretanto, vários refugiados guineenses continuam a atravessar a

fronteira para se refugiar no Senegal desde o início dos confrontos.



Por receio de detenção ou de accionamento de minas antipessoal que os

rebeldes colocaram na estrada que vai para São Domingos, os

refugiados preferem usar pirogas para entrar no Senegal.
Ziguinchor - 28/03/2006

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