Guiné-Bissau: Um desafio à Comunidade Internacional

          

O respeito pela não ingerência nos assuntos internos de cada país é um factor determinante no relacionamento entre Estados. Estando na moda falar-se de democracia, sem no entanto se reflectir sobre um conjunto de factores importantíssimos na sua definição, tem originado usos e abusos de interpretação desta palavra chave no dia-a-dia dos políticos de todo o mundo em geral e dos guineenses em particular.

 

Quando o presidente de um país com problemas económicos e sociais de fundo, resolve dissolver a Assembleia Nacional Popular e convocar eleições antecipadas para um período de 90 dias a contar da promulgação do decreto presidencial, sem ter em conta que: O país está falido tecnicamente há muito tempo e por isso não ter verbas no tesouro para avançar com nenhuma iniciativa na prática que possa concretizar essa pretensão.

 

Quando os partidos na oposição aparecem a louvar a iniciativa (salvo algumas reservas a nível de verbas para as suas campanhas) e, quando uma vez mais vejo a Comunidade Internacional, com as Nações Unidas à cabeça, comprometerem-se a apoiar a realização dessas referidas eleições sem fazerem reparos ou aconselhamentos, mas sim preocupados com a data da realização das mesmas, como se isso fosse resolver todos os problemas da Guiné-Bissau e dos guineenses, revejo toda a situação pós conflito militar 98/99 onde a Guiné-Bissau foi empurrada para a realização de eleições sem se dar tempo para que a situação se normalizasse e se saísse da euforia e dos  traumas do conflito.

A Comunidade Internacional (países e instituições)prestaram-se logo a apoiar a realização das mesmas e ninguém se lembrou, que o país estava mergulhado numa crise profunda e que, era preciso uma terapia mais cuidada, que fosse recuperar tanto as pessoas como o próprio país numa primeira fase, encorajando uma série de reformas e apoios com acompanhamento e assim, lançar bases sólidas para a realização de eleições gerais.

 

Realizaram-se as eleições, viveram-se as emoções e os guineenses foram entregues aos seus "legítimos representantes". Os que  tinham sido eleitos para dirigirem os destinos do país ...Desde essa altura, até então, o país foi decrescendo a olhos vistos, com irregularidades de toda a ordem, atingindo os patamares mais baixos nas estatísticas a nível mundial...

 

Sem se conseguir cumprir o calendário eleitoral, as eleições de 20 de Abril de 2003 foram adiadas para 06 de Julho do mesmo ano, com o aval das Nações Unidas, expressando o seu apoio, dos partidos da oposição, da CPLP, entre outros, tendo-se feito exigências mínimas de legalidade para questões pendentes como: A promulgação da Constituição, o acto eleitoral para o Supremo Tribunal de Justiça, a actualização dos cadernos eleitorais, a liberdade de imprensa entre outras...

 

Ficaram as promessas porque,  desde essa altura, nada foi feito, nem da parte de quem está no poder e criou toda esta situação, nem da parte da Comunidade Internacional que, jogando pelo seguro, não está disposta a financiar as eleições, quando o clima político, económico e social se vai degradando dia para dia. Os governantes guineenses acham que sendo a Guiné-Bissau, um Estado soberano, não pode tolerar ingerência externa nos seus assuntos internos mas, quase que atribuem a não definição ou realização das eleições à Comunidade Internacional, por alegada falta de apoios financeiros.

 

Como é que os governantes guineenses querem pedir apoios de toda a ordem, não aceitando conselhos de quem se ofereceu para ajudar? Só o dinheiro faz falta?!

 

À data de hoje, 10.05.03, é quase uma certeza que não haverá eleições a 06 de Julho 2003. Isto, em função do incumprimento até este momento, de situações como por exemplo: A actualização dos cadernos eleitorais, que já ultrapassou o seu período de calendário...  

 

 

Vendo o tempo a esgotar-se e sem entrada de financiamentos que fossem resolver outros problemas, que não os do povo, começa-se a engendrar o golpe final, que de  forma habilidosa já se está a executar, também a olhos de todos, sem no entanto, uma vez mais, a Comunidade Internacional se pronunciar em defesa do povo guineense, deixando simplesmente que se chegue ao extremo da humilhação e o clima de tensão que paira no ar acelere o ajuste de contas entre quem tem o poder e quer fazer dele um bem pessoal e vitalício, apesar de, também pronunciar a palavra democracia algumas vezes...e, quem por outro lado, aceita o poder como instrumento dirigente da sociedade e por isso precisa dele para se afirmar na sociedade...

 

À Comunidade Internacional deve-se perguntar em que é que ficámos quanto às eleições legislativas marcadas para 06 de Julho na Guiné-Bissau. É urgente esclarecer esta situação antes que se forjem insinuações que originem mais prisões, conflitos e, pior que isso, anuncie o cancelamento das eleições, alegando situações como: tentativa de golpe de Estado.

 

O povo guineense espera e desespera por aquilo a que tem direito, chega de tanta humilhação.

 

Fernando Casimiro (Didinho)

     

 11-05-2003 00:40

 

     

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