Sufoco na Guiné-BISSAU!

 

Celina Tavares Spencer *

04.05.2009 

Celina Tavares SpencerOlho para o meu país e não gosto do que vejo! Olho para o governo do meu país e sinto um aperto no peito! Oiço os candidatos presidenciais do meu país e fico com pena, sem saber se a pena é pelos candidatos presidenciais, ou pelos guineenses.

Olho para a Guine-Bissau. Paro e encaminho o meu olhar para o palácio, os ministérios, o parlamento. Dirijo os meus ouvidos para os discursos, para as entrevistas e náuseas advêm intempestivas, incontroláveis.

Existem valores que participam na minha vida, na vida dos meus filhos e que desejaria para os meus netos, que já nasceram e nascerão; desejo os mesmos valores para os filhos e netos dos meus amigos e amigas, para todo o guineense. São valores simples como a vida, a liberdade, a verdade, a justiça e a educação.

E o que acontece com a vida no meu país? Ela é violada todos os dias, todas as horas, abusivamente, com resultados impunes.

Quero a vida como valor inestimável, mas vejo os governantes a desprezarem-na de forma criminosa. Estamos indefesos!

Não temos ninguém que nos proteja. A rua é um lugar de perigo. É praça de guerra. Não quero ver amigos sendo mortos pela incompetência de governos corruptos que se sucedem, brincando com as esperanças e com a vida de um povo bom e enganado.

E o que acontece com a liberdade?

Ela tem sido consumida em todos os bairros. A insegurança tirou-nos o seu maior símbolo. É proibido sentar-se à varanda à noite, em frente às nossas casas, apreciando as nossas crianças, cumprimentando os vizinhos. Ao contrário, estamos atrás das grades construídas por nós mesmos. Estamos escondidos em casa. Temos medo de chegar e de partir.

Crianças!... Velhos tempos!...decidiram obrigá-las a prostituírem-se!

Fragilizam o chefe de família, negando-lhe o salário, para que perca o controle das filhas. Um dia de fome, dois dias... aí vem um "Pagero", buzina e carrega a ainda criança/jovem, em frente aos olhos do pai, mãe, que impotentes por nada terem, embrenham-se no pensamento dizendo: Djito ca tem!  


Os criminosos que assaltaram o poder impedem o nosso povo de ter acesso puro e limpo à Educação. Sem ela, não há como exercer a liberdade democrática, ou qualquer outra. Sem ela, não sabemos escolher e exigir.

Subordinámo-nos aos espertalhões que lutam apenas pelo poder pessoal. Eles sim, é que são "barrigas de meia", não como o Mário Cabral e a Carmen Pereira, um dia nos gritaram pela rádio “barrigas de meia”, isso nos velhos tempos de discursos baratos, obrigando-nos a lavar a cara para cima!

Quero a liberdade de volta. Quero sentir a brisa da noite entrar pela janela da minha casa, aberta, como aberto deve estar o conhecimento e a Educação, de forma plena e irrestrita porque é esse valor que permite exercer a liberdade de escolha ou de censura. Mas, infelizmente, estagnaram-na! Não há liberdade sem informação e conhecimento. E eles sabem disso!

E o que acontece com a Educação?

A Educação deixou de ter valor. As crianças e os jovens, andam com lâmpadas nas mãos, para nao torcerem ou partirem os pés, nas covas que os criminosos deixaram, na Rua Areolino Cruz, com as suas guerras de ajuste de contas, e luta pelo PODER! Os alunos sentam-se nas escadas à espera que acabem as greves, pedindo a Deus que os professores não percam as esperanças e regressem para ensiná-los! Os professores, batalhando dia-a-dia, deixando a família com fome em casa, e às vezes sem comerem, com sapatos furados, camisas encardidas, aí vão cambaleando, para cumprirem a missão de ensinar. O fim do mês, para o pagamento, estende-se para um ano, dois! Para eles não existe superação ou cursos de aperfeiçoamento, para refrescarem os seus conhecimentos e transmitirem-nos aos seus alunos! Deles….os crápulas não se lembram, tão entretidos a encherem os seus sacos!

E o que acontece com a verdade?


Ela foi prostituída! Foi posta na batedeira junto com a mentira. Formaram com ambas, a massa profunda da promiscuidade e da vileza. Quero de volta a verdade como valor indispensável de convívio e pureza.

Constrangida, sinto-me obrigada a explicar aos meus filhos, que a libertação e as palavras bonitas são mentiras. Forço-me a dizer o porquê destas mentiras. Estas explicações percorrem o leque do mal, da empulhação, do crime. E é a autoridade que faz uso da mentira!

Basta! Salvem este país da mentira. Ela está corroendo a alma cansada dos velhos e corrompendo a alma pura das crianças.

E o que acontece com a justiça?


É cega. Totalmente cega. Lenta. Irresponsavelmente lenta. Preguiçosa. Lamentavelmente preguiçosa. Assassina, porque tarda e falha. Seus mentores não vêem um palmo à frente dos seus narizes, tanto que a simbolizaram com a estátua vendada, segurando uma balança que ela própria nao vê.

Quero justiça, verdade, liberdade, vida! Quero ter orgulho de dizer aos meus filhos, aos meus netos: quietos! Prestem atenção, porque agora, o nosso Presidente vai falar. Oiçam e aprendam! - mas hoje, não me atreveria a ser tão irresponsável!

Quero que, num dia qualquer, às dez horas da noite eu atenda à campainha sem medo algum. E que, ao abrir a porta, veja um policial educado, feliz. Para que ele sorria e diga: minha senhora, desculpe o incómodo. Só quero avisar que acabamos de prender um intruso que estava a tentar pular o muro da sua casa. Vamos levá-lo para a delegacia para ser julgado pelo crime de violação de propriedade. Fique sossegada e tenha uma boa noite.

Não quero que alguém fardado com uniforme militar empunhando uma arma, assalte a minha casa, espancando-me, espancando a minha família, dizendo: temos o direito de entrar e levar tudo que aqui tens. Não contes com nenhuma justiça, porque a Guiné é nossa! Nós é que lutamos! A justiça é ditada por nós! Nós somos soberanos e autónomos!

Ao regressar do trabalho, quero poder contar em casa o que me aconteceu. Quando estava a caminhar, um sujeito armado, começou a puxar a minha carteira com a intenção de a roubar. A mão pesada de um polícia agarrou-o inesperadamente e tirou-lhe a arma antes que apertasse o gatilho. O polícia sorriu, meio sem graça, enquanto dava umas bordoadas no atrevido, e dizia: desculpe, minha senhora, por ter demorado tanto a perceber a intenção deste bandido. Um carro parou ao lado, guinchando os pneus. O assaltante foi levado à segunda esquadra. Eu continuei tranquila no caminho para a minha casa, saboreando a brisa fresca que me beijava a face.

Nha Ermons! No abri udju, no furanta boca, no fala elis cuma, pa é ca confundinu cu sanchos que é pui djintis na cumé, pa mata fomi, ou cu gatus, que é pui mininos na dá cu pô, pa é faci canfurbat pa brinca cu colegas, enquanto que elis, é na manda mata baca, pa é pui na se geladera, é na cumé bom bianda, garandis na passa fomi, pabia é ca pudi curri trás di sanchu cu gatu! N’tchut …..

VIVA PUBIS GUINEENSES! Nô dia na Tchiga!... 

Um abraço pa bôs tudo di,

Padida!

 * Licenciada em Psicologia

Texto adaptado do original de Airo Zamoner

http://www.verdestrigos.org/sitenovo/site/cronica_ver.asp?id=792

Airo Zamoner nasceu em Joaçaba, Santa Catarina, criou-se no Paraná e vive em Curitiba. É atualmente cronista do jornal O ESTADO DO PARANÁ e outros periódicos nacionais. Suas crônicas são densas de conteúdo sócio-político, de crítica instigante e bem humorada. Divide sua atividade literária entre o romance juvenil, o conto e a crônica, tendo conquistado inúmeros prêmios e honrosas citações.

 

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