O REFÉM

 

Alai Sidibé

Alai Sidibé

alt0154@londonmet.ac.uk

Londres, Dezembro 2007

 

1. É bom estar de volta. Após algum tempo, relativamente longo sem se fazer ouvir, nada mais refrescante do que voltar ao convívio da lusofonia (este espaço, que já não se limita exclusivamente ao convívio dos guineenses) em que este projecto se transformou. É importante sabermos reconhecer ao Didinho o feito alcançado no estabelecimento da ponte em que, sem dúvidas, se deve assentar a solidariedade Lusófona, isto embora reconhecendo que ainda há muito caminho a percorrer.

Voltando ao tema, diria que a minha ausência, também não se deve a um distanciamento em relação ao CONTRIBUTO (principal veículo crítico e livre para aceder à actualidade do meu país, a minha querida Guiné), nem tão pouco se deve ao facto de estar refém da escrita, até porque a haver hoje em dia uma figura que satisfaça essa condição (a de refém) esta é - sem dúvida - nada mais nada menos do que o senhor João Bernardo Vieira, outrora o deus e eterno ditador da Guiné-Bissau, hoje, nos dias que correm, o pai de todos os reféns.

Daí que, o título deste texto, que se vai buscar à famosa peça do não menos famoso Paul Claudel, espelha mais do que na perfeição as circunstâncias em que se encontram tanto o ditador Nino Vieira como o comum cidadão guineense.

Bissau, nos dias que correm, não passa duma trincheira político-militar disposta por dois gangs irreconciliáveis: de um lado, o senhor general Nino Vieira e os seus compinchas servidores, exímios no jogo da intriga, da corrupção e de crimes de sangue sem rosto; do outro lado, se posiciona um bando militar, encabeçado pelo radicalismo fanático-étnico de Baptista Tagme Na Waie, com uma mão obscura do volkista e agitador, Kumba(ro) Yalá.

O senhor Tagme, armado de um poder napoleónico, pelos vistos terá encontrado uma fórmula nova de relançar a política externa guineense, cujos últimos suspiros remontam às vésperas do fatídico 14 de Novembro de 1980, data da qual o povo guineense conhece mais as consequências do que as causas; uma ‘política’ assente num estreitar de relações cada vez mais promíscuo com os carteis de Medelin e Bogotá. Para levar a bom porto a sua nova forma de estreitar relações com o mundo da droga, o actual chefe máximo das forças armadas, ditas revolucionárias do povo, de repente se tornou no principal factor da estabilidade do país que um dia jurou servir, para isso usando e abusando nos já de si escassos recursos do Estado, para o transporte, armazenamento e evacuação da cocaína para os ‘mercados’ europeu e norte-americano.

Todo este abuso de poder leva o comum do guineense a interrogar-se: Para que serve o Presidente da República? Onde se encontra aquele que jurou ser o presidente de todos os guineenses, que prometeu ser o garante da estabilidade e da autonomia dos órgãos de soberania deste País que aos poucos sucumbe perante o olhar indiferente das Nações Unidas? Qual é o papel das Agências internacionais sedeadas no país, que assistem a todo este espectáculo de le lui c’est moi, l’ètat c’est moi? (Desculpem-me o meu francês ser pobre.

O novo barão da droga na Guiné-Bissau, o general Tagme sabe que detém o monopólio do aparelho bélico do país; sabe que se encontra em situação de vantagem (pelo menos aparentemente) em relação ao seu antigo carrasco, o senhor Nino; e que, por isso mesmo não teme o poder político (porque a este não se submete, como é imperativo em qualquer país civilizado) no que toca à proliferação da droga na Guiné que, de repente se transforma na principal actividade do poder castrense.

Por sua vez, reconhecendo a sua latente fraqueza, o co-presidente Nino Vieira - no que diz respeito à droga - se refugia, simplesmente, num silêncio ensurdecedor, se não mesmo numa rigidez cadavérica, abandonando os guineenses, submetidos à pior das ditaduras político-militares no actual contexto africano, sem esperanças e face à violência e à morte, próprios de um regime narco-militar.

 

2. Nunca é demais repeti-lo: a inclusão nesta página de um espaço dedicado à literatura, à poesia, à pintura e a outras formas de expressão artística made in Guiné-Bissau é de saudar e encorajar, pois deixa-nos a todos orgulhosos. Para alguém como eu, totalmente alheio à literatura produzida no meu próprio mundo - com todas as limitações e obstáculos que aquele país cria a quem trabalha no ramo do saber e da criação – o esforço do Didinho e dos seus colaboradores é de se lhe tirar o chapéu. A literatura não fazia (e apesar de tudo ainda não faz) parte das coisas porque a Guiné era mais conhecida. Daí que, esta iniciativa, apesar de todas as hostilidades por parte do poder institucionalizado, revela uma diáspora com vontade de virar uma página no que diz respeito às letras guineenses. É preciso encorajar talentos, até porque matéria-bruta não nos falta. Obrigado Filomena Embaló, obrigado Didinho, obrigado aos colaboradores, por nos proporcionarem sugestões de leitura tão ricas.  

 

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