“O PODER DE UMA TRADIÇÃO”

 

 

Nancy Schwarz (*)

15.05.2009

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nancy.schwarz73@googlemail.com

 

 

 

Aos opositores do “ritual do corte dos genitais femininos”, podem apostar que o artigo “Uma Leitura Sociológica da Prática da Excisão Clitoriana”, não foi esboçado com o intuito de defender/aprovar a “Circuncisão Feminina ou Faraónica”(**).

Digo mais, eu me auto-posiciono na fileira principal, onde se encontram os indivíduos que almejam ver ERRADICADA a “excisão do clítoris”.    

 

Gostaria que o artigo “Uma Leitura Sociológica da Prática da Excisão Clitoriana” fosse encarado como um ALERTA – criar Estratégias condignas de intervenção e Programas eficazes de consciencialização.

 

As Estratégias e Programas eficazes (que eu defendo), NÃO PODEM/NÃO DEVEM seguir uma linha de condenação ou imposição constante.

A “Nação Humana” deve pautar pelo diálogo. Penso que a comunicação (veiculo de entendimento) entre grupos diferentes, deve ser implementada com a maior urgência possível.

 

Cada cultura tem a sua especificidade. Vamos então procurar entender essas especificidades, a fim de se poder moldar ou erradicar os aspectos traumáticos de cada tradição.

 

A perpetuação do “corte do clítoris” é uma realidade e não uma utopia. Isso vem confirmar que os programas de sensibilização e as leis adoptadas por alguns países de punir os responsáveis pela prática (em questão), estão completamente obsoletas.

 

Atrevo a dizer mais, no caso guineense, apesar do governo e das restantes forças políticas “estacionadas” no nosso país terem perfeita consciência do assunto e terem assumido compromissos para a erradicação do “ritual do corte”, assiste-se a uma ausência de mecanismos eficazes de informação que alertem sobre as consequências deste ritual para a saúde da Mulher.

 

 

À falta de articulação (correcta) entre as Entidades Intervenientes no domínio com as Comunidades praticantes; à falta de meios e de conjuntura adequadas para a SENSIBILIZAÇÃO, o fenómeno tem vindo a assumir NOVOS CONTORNOS.

·            A excisão de crianças de tenra idade, omitindo a participação nas cerimónias tradicionais (de grande riqueza cultural e social), em que são transmitidos valores e saberes milenares.

 

·            A ida à Guiné-Bissau de Guineenses a residir no exterior para submeterem as filhas ao “fanado”.

 

Disse e não cansarei de repetir que estamos perante um ritual assente em argumentos de ordem cultural, religioso e social, muito bem elaborados.  

 

É evidente que no Corão não se encontra nenhum versículo a falar do “corte dos órgãos genitais femininos.

 

 

CONCORDO PLENAMENTE!

 

Na certeza porém, continuo a dizer que o SAGRADO tem sustentado esta prática. Não esqueçamos que a transferência de normas, valores e crenças, enraizadas no interior de uma colectividade, são efectuadas por indivíduos carismáticos – chefes religiosos, anciões, chefes da Comunidade, enfim, pessoas “distintas” detentoras de um estatuto social privilegiado e com acesso aos documentos escritos.

 

A maioria das Mulheres africanas são silenciadas pelo analfabetismo, pela pobreza e por um patriarcado que tudo abarca e controla.

 

As mulheres submetidas a este “ritual” jamais interrogaram o PORQUÊ DO CORTE DOS ÓRGÃOS GENITAIS , aceitaram-no tão-somente porque o homem, possuidor do saber, induziu-as a acreditarem no seu valor sagrado.

 

O facto da Circuncisão ser uma obrigação descrita no Corão - << um homem circuncidado é um homem limpo e puro >>, o homem sentiu-se no dever de a implementar (também) no seio das Mulheres.

 

<< (…) sempre disseram às mulheres que está escrito no Corão. A minha avó, a minha mãe

      e outras mulheres da Comunidade, disseram-me que temos que estar limpas e puras para

      que os homens não nos rejeitem >> (Depoimento de uma Senhora de Etnia fula).    

 

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(**) A Circuncisão Feminina” é também conhecida por “Circuncisão Faraónica”.

 

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(*) Licenciada em Sociologia pela Universidade Lusófona de Lisboa.

 

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