O perigo social que é fazer da Guiné-Bissau um tanque de “lixo”

 

Edson Incopté

edson_incopte@hotmail.com

12.07.2013

A Guiné-Bissau tem sido tratada por alguns pais guineenses residentes na europa, mais concretamente em Portugal, como um tanque de “lixo”. Perdoem-me que use o conceito “lixo”, mas o que me vai na alma não me permite usar qualquer tipo de eufemismo.

 

Todos sabemos que a vida que os pais levam na europa, saltando de trabalho em trabalho, não lhes permite dedicar muito tempo aos seus filhos. Por mais que o queiram fazer não conseguem. Existem pais que têm três trabalhos diferentes: um pela madrugada, outro pela manhã e outro pela tarde. Trabalham dessa forma para conseguir dar boas condições de vida aos seus filhos.

Contudo, existem filhos que não reconhecem o esforço dos pais, uma grande percentagem infelizmente. Filhos que não dão o devido valor a luta que os pais travam com o objectivo de lhes proporcionar o que eles não tiveram.

O resultado desse não reconhecimento por parte dos filhos é o enveredar por  caminhos menos dignos, escolhas menos acertadas.

Acontece com isso o inevitável: os pais acabam por perder mão sobre os filhos. E os tais caminhos, menos dignos, vão se estreitando; de tal forma que chegam a ter volta dificultada. Por outro lado, acontece os pais não assumirem que perderam mão sobre os filhos, para não terem que aceitar que os filhos entraram realmente por caminhos indignos.

Quando os pais, finalmente, assumem que perderam o controle dos filhos e que estes entraram por caminhos de delinquência, por vezes, é demasiado tarde. Pois estes já cometeram graves erros, difíceis de apagar ou camuflar, principalmente perante os agentes da autoridade.

E aí chega a hora de recorrer ao “tanque de lixo”. Os filhos são recambiados para a Guiné-Bissau, mais concretamente para Bissau. Onde acabam, muitas vezes, por “contaminar” os que lá estão (sem estar a aliviar a culpa destes). Criando dessa forma enormes problemas sociais, tais como os que temos vivido com grupos de jovens na capital guineense. Não é por acaso que os grupos têm os nomes como "Al-Qaeda", os "como é que é", os "tá-se bem", "Nantes", "Al Shabab" etc.

O mais irónico, daí utilizar o conceito lixo, é que enquanto os filhos andam pelo melhor caminho, reconhecendo os esforços dos pais e lutando para os honrar, a conversa quanto a mandá-los para Guiné-Bissau, nem que seja de férias, é vulgarmente: “pa i ba fasi ke? Pa é ba nhemen el?!” (para ir fazer o quê? Para me irem matar o filho?!) como se na Guiné-Bissau morressem só e só os bons filhos.  

Pretendo defender com estas breves linhas que os problemas sociais, nomeadamente, problemas de delinquência juvenil, que estamos a viver em Bissau, tem muito que ver com o facto de pais guineenses na europa olharem para o seu próprio país de origem como um tanque de “lixo”. Desde aqueles que enviam para lá os filhos querendo com isso castigá-los, imagine-se, aos que enviam para lá os filhos afugentando-os da polícia europeia/portuguesa ou de gangs.  

É compreensível que os pais queiram proteger os filhos. Assim como é compreensível que os tragam para a europa almejando dar-lhes melhores condições de vida. Mas é preciso que comecem a colocar outros pesos na balança quando pensam trazer os filhos. E quando os trazem, que comecem a pensar se as condições que lhes criam, ou procuram criar, compensam, verdadeiramente, o pouco tempo que lhes despendem.

A Guiné-Bissau não é e não tem de ser um tanque de “lixo” para onde os pais enviam os filhos quando estes não correspondem às suas expectativas. Quando assim tem que ser, que os pais os deixem pagar pelos seus erros. A solução não é e nunca será envia-los para a Bissau. Porque, hoje, cada jovem retornado/enviado nas condições acima descritas representa um perigo para a sociedade Bissau-guineense. É custoso dizê-lo, mas infelizmente assim é.

A construção da sociedade que queremos para a Guiné-Bissau passa por todos nós. Cada um tem um papel importante a desempenhar. E basta a negligência de alguns no cumprimento dos seus papéis para que as coisas sigam pelo caminho menos desejado.  

Estamos juntos!

 

 

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