O ÓDIO A AMILCAR LOPES CABRAL (2)

 

A Guiné-Bissau, a meu ver, tem na pessoa dos seus filhos que se julgam mais filhos de que todos os outros, o principal obstáculo à paz, estabilidade e desenvolvimento! Didinho

 

Fernando Casimiro (Didinho)

didinho@sapo.pt

23.01.2011

Fernando Casimiro (Didinho)Podem tirar-me a nacionalidade guineense, impedir-me ou desencorajar-me de regressar à Guiné, mas jamais apagarão do meu registo de nascimento, a minha naturalidade!

Retomo o tema sobre a naturalidade de Amilcar Cabral, depois de ter recebido diversos comentários enviados a título de correspondência privada, que por isso, não partilharei nesta abordagem. Porém, há um comentário em forma de ponto de vista destinado a sustentar o debate sobre o tema, que decidi trazer a público, por assim se justificar.

O comentário é do Dr. Silvestre Alves, cidadão guineense, Jurista e Presidente do Movimento Democrático Guineense (MDG).

Agradeço e elogio o gesto do Dr. Silvestre Alves, contudo, creio que a sua abordagem está desenquadrada com o conteúdo do meu trabalho intitulado "O ÓDIO A AMILCAR LOPES CABRAL".

Efectivamente, a minha abordagem tem no essencial, a questão da naturalidade de Amilcar Lopes Cabral e, por conseguinte, do país onde Amilcar Cabral nasceu. Respeito tudo o que sustenta o Dr. Silvestre Alves no seu comentário, mas não me vou pronunciar sobre o grosso da sua opinião em relação aos pontos que apresentou, limitando-me ao debate do tema da naturalidade de Amilcar Cabral.

Quero dizer ao meu amigo Dr. Silvestre Alves que, a verdade, na vertente bíblica e partilhada por D. Settimio Ferrazzetta, é a verdade que também defendo.

É a Verdade dos factos, a Verdade que dá a todos a possibilidade de se pronunciarem, quer acusando, quer defendendo.

Questionar, é um exercício diário para mim. Questiono e incentivo outros a questionarem, pois só assim estaremos a trilhar o caminho da obtenção de respostas e soluções.

Questionar, caro Dr. Silvestre Alves, não é o mesmo que afirmar, ou insinuar de forma conclusiva. Questiona quem desconhece. Afirma quem se julga na posse de dados/factos.

Se alguém afirma que Amilcar Lopes Cabral não nasceu em Bafatá, esse alguém não está a questionar se Amilcar Lopes Cabral nasceu ou não em Bafatá. Esse alguém está a mostrar que tem provas de que o que se sabe sobre a naturalidade de Amilcar Cabral, não corresponde à verdade.

Quem afirma que Cabral não nasceu em Bafatá, que mostre o registo de onde efectivamente Cabral nasceu!

Quando vejo que o meu amigo Dr. Silvestre Alves, que é Jurista, não põe em causa as afirmações de quem, com o argumento de que: " se Amilcar Cabral tivesse nascido em Bafata teria ainda lá alguém que pudesse conhecer, pelo menos, filhos ou netos dos seus colegas que estudaram com ele o ensino primario em Bafatá.", fico com a sensação de que a Verdade referenciada pelo Dr. Silvestre Alves é uma Verdade de conveniência, que passa por cima dos princípios e valores da Verdade bíblica ou de D. Settimio Ferrazzetta.

Serão os argumentos de Felix Siga elementos dignos de consideração, a nível judicial, académico ou social?

A meu ver não!

Quantos milhares de cidadãos portugueses não nasceram na Guiné e noutras ex-colónias, ao longo de cinco séculos, tendo sido registados nesses ex-territórios ultramarinos, com a naturalidade da localidade onde realmente nasceram e que não têm nos colegas de infância prova do reconhecimento de suas naturalidades?

Será pelo testemunho de colegas de infância que se reconhece o registo de nascimento de alguém?

Eu Didinho, nascido e criado em Bissau, que estudei com muita gente, de quantas pessoas me lembro dos meus tempos da escola primária e o mesmo vale para todos esses colegas, ao ponto disso servir para ajuizar onde nasceu quem?

Quem sabia a naturalidade de cada um, com 6, 7 ou 8 anos de idade, só por estudarem na mesma escola e por fazerem parte da mesma turma?

O Amilcar Lopes Cabral, com 6, 7 anos de idade em Bafatá, sabia alguém que viria a ser uma grande figura mundial, para que fosse desde logo "marcado"?

A minha filha mais velha nasceu em Bissau a 30 de Outubro de 1984, tendo sido lá registada. Viveu lá até aos 4 anos de idade e há 22 que se encontra em Portugal, sem ter regressado à Guiné. Será que a sua naturalidade também foi forjada, porque não tem colegas de escola/infância que possam testemunhar a seu favor?

Por que devemos acreditar que Rafael Barbosa forjou a naturalidade de Amilcar Cabral, tal como afirma Felix Siga: " Amilcar Cabral nao é guineense. Pois, o seu boletim de nascimento é falso e foi forjado por Rafael Barbosa para convencer o ex-Presidente da Guiné-Conacri Ahmed Sekou Turé aceita-lo residir em Conacri."

Quando Amilcar Cabral se fixou em Conacri, já era maior, casado, Engenheiro Agrónomo e tinha sido alto funcionário da Administração portuguesa.

Como podia Rafael Barbosa forjar o boletim de nascimento de Amilcar Cabral, quando Amilcar era já tudo menos um menor de idade?

Caro Dr. Silvestre Alves, na sua qualidade de Jurista, se quisesse comentar de forma pedagógica a questão da naturalidade de Amilcar Cabral, poderia explicar-nos que um registo de nascimento não se altera de qualquer maneira.

Podemos requerer as nacionalidades que quisermos, pedir-nos-ão sempre a certidão/boletim ou outro, de nascimento do país/localidade de origem.

É com esse documento que se faz a transcrição para um novo registo, que nos contempla a nacionalidade adquirida, mas que não altera, nem elimina o local onde nascemos.

A Guiné-Conacri teria emitido um novo registo de nascimento a Amilcar Lopes Cabral, a pedido do seu "tutor" Rafael Barbosa?

Se assim foi, tem a palavra Felix Siga. A bem da Verdade, que apresente esse boletim de nascimento!

O Dr. Silvestre Alves não acha isso tudo muito vago e de má fé?

Por que razão, o Dr. Silvestre Alves, na qualidade de Jurista, não fez até agora uma investigação de fundo sobre a naturalidade de Amilcar Cabral, para apresentar provas de que Amilcar Cabral não nasceu em Bafatá?

É a família de Amilcar Cabral que tem que apresentar provas, quando não é obrigada a isso, tal como o Dr. Silvestre Alves ou eu não somos obrigados a fazer prova da nossa naturalidade publicamente?

Que Felix Sigá, assim como todos quantos se acham na posse de provas que dizem que Amilcar Lopes Cabral não nasceu em Bafatá, Guiné-Bissau, tenham a coragem de comunicar e apresentar ao Mundo, essas provas, para que se corrija a História, atribuindo ao país do seu nascimento esse grande orgulho, já que, pelos vistos, não sendo uma questão isolada, tal como referiu o Dr. Silvestre Alves, muitos guineenses não gostariam de continuar a ter Amilcar Cabral como referência primeira do país.

Caro amigo Dr. Silvestre Alves, muito obrigado. A bem da verdade, que prossiga o debate! 

Aos que me enviaram seus comentários a título privado, caso queiram partilhá-los neste trabalho, agradeço que me autorizem a fazê-lo.

O ÓDIO A AMILCAR LOPES CABRAL 21.01.2011

VAMOS CONTINUAR A TRABALHAR!

 

COMENTÁRIO do Dr. Silvestre Alves, Jurista e Presidente do Movimento Democrático Guineense (MDG).



Meu Caro Didinho,

Já é bastante tarde, não sei se faço bem em tentar reagir, tendo lido, apenas na diagonal, o material que me enviaste. Se o faço, será por alguma questões de princípio. Ou somos guineenses ou não somos. Ou a Biblia e Dom Septtimio têm razão ao apregoar que a verdade vos libertará, ou não. Os Guineenses de hoje, vivendo o desespero da independência que Cabral nos legou, creio, têm o direito de indagar, sem receio de ser menos guineense que ninguém, sobre as verdades que o PAIGC e Cabral nunca disseram.
A meu ver, mais vale mil discordâncias e dez mil questões intelectualmente honestas que uma falsa verdade ou uma verdade mal partilhada e mal contada, porque se mal contada, haverá alguma coisa a incomodar... Ninguém poderá amordaçar ninguém. E não será por isso que deixaremos de chegar a algum lado...

Se a história do PAIGC fosse tão autêntica e bonita, porque é que o PAIGC nada fez para encorajar os nossos investigadores a estudá-la e escreve-la para que as novas gerações a conheçam? Infelizmente, a nova geração nada sabe da nossa história. Até hoje, ninguém teve coragem de falar abertamente sobre aspectos essencias da nossa história. Evitam deliberadamente. Porque não tentar com o senhor Luciano Indau, por exemplo? De longe a longe, um ou outro vai dizendo alguma coisa que não nos autorizamos a fazer eco. Na sequência de algumas conversas, tomei a liberdade de sugerir ao INEP, através do seu Director, em conversa informal que distribua gravadores a um bom número de Combatentes da Liberdae da Pátria para que gravem as suas memórias, dando-lhes a liberdade de decidir o momento de devolver ou não o material, como forma de os descontrair.
Ninguém sabe como e porque foi fuzilado Honório Sanches Vaz. Ninguém sabe como e porque morreu Osvaldo Vieira. Castanheira Neves não sabe dizer quantas (largas) dezenas de guineenses (que outros não exitam a contar às centenas) na purga que se seguiu à morte de Amilcar Cabral.

Dirigentes de origem cabo-verdeana até dizem que tomaram posição firme para contrariar o massacre. Afinal quem a ordenou? Porque é que se matou tanta gente? Ninguém sabe como e porque morreu Francisco Mendes. Delfim da Silva limita-se a dizer no seu livro Guiné-Bissau - Páginas de história política, rumos da democracia, a pp. 189 "Vi aquele automóvel branco (Peugeot 504) que capotou fora de estrada, numa espécie de ravina, local íngreme, com algum declive, o tejadilho do carro estava de tal modo amolgado para dentro, que me tornou fácil perceber o estado em que ficou a nuca (machucada) do malogrado Chico Té. Voltei a não poder conter as lágrimas. Aquele golpe sobre a nuca com a cabeça a bater-se ao volante parecia-me que também poderia provocar lesões na face, pelo menos na testa do malogrado. A verdade é que eu não tinha reparado em qualquer lesão na fronte do Chico Mendes."

Na altura em que o livro foi escrito, Setembro de 2003, todas as especulações já eram conhecidas e a música de Zé manel retomou a questão afirmando que os camaradas é que o mataram...
Delfim prefere insinuar alcolismo, mas nada diz sobre as especulações que a praça produziu, tão pouco da sentença de Zé manel, quando o natural, para um intelectual, na falta de dados, seria indagar, suscitar reflexão.

Porque tanta meia verdade? Porque é que nos disseram que o PAIGC foi fundado por Cabral e mais cinco companheiros? Porque é que tiveram vergonha de nos dizerem quem eram? O que é que justifica o ditado "Guiné, má mãe, boa madrasta? De onde veio o ditado "Nô oça morto no mede bardade"? O que é que justifica o ditado? Qual foi a utilidade da luta? A situação em que o país se encontra justifica a luta? Porque é que Amilcar Cabral avançou com o projecto de independência, através da Luta Armada de Libertação Nacional, sem os "garandes" de Bissau, de entre eles João Rosa, Duarte N'baná, José Lacerda e Godofredo, sendo estes últimos de ascendência estrangeira, mas pessoas que se identificavam profundamente com o sentimento da "guinendadi"? Será verdade que esses homens foram denunciados por cartas anónimas à Pide? A quem interessaria a sua morte, se for verdade a denúncia? Será verdae que José Leitão da Graça foi vítima de intriga, conforme sugere o livro de José Vicente Lopes?
Cabral diz que lutamos para cada um mandar na sua própria cabeça, andar com os seus próprios pés, construir, ele próprio o seu futuro e a sua prosperidade. Sábias palavras! Mas quem havia de pensar pelos guineenses se, em 1974, Rui Araújo era um dos dez únicos finalistas?

Porque não tinhamos uma elite intelectual, tão pouco uma massa crítica, em número e em qualidade que justificasse, o país está como está. Para quê então a guerra. Pela sua soberba inteligência, Amilcar Cabral não estava obrigado a compreender que a independência era precoce para a Guiné? Se admitirmos que pela sua inteligência ele podia admitir a possibilidade de efeitos indesejáveis, será ou não natural que se duvide dos reais móbeis da LALN? A situação em que o país se encontra não será a prova acabada de que a Guiné não estava preparada para a independência?
Justificar-se-á falarmos de ódio a Amilcar Cabral? Teremos o direito de desencorajar a indagação da parte de quem julga que ainda não sabe a verdade? Não será preferível analisar o que cada um diz e convidá-lo a confrontar-se com as suas eventuais incongruências, contradições ou hipotéticas faltas à verdade? A desenvolver melhor os seus argumentos? Não seria melhor refutá-lo metodologicamente na sua argumentação, demonstrando os vícios de raciocínio e a desinformação?

A meu ver, quanto mais evitarmos a discussão, quanto mais nos alarmarmos com a indagação, mais ficará a sensação de insatisfação e mais estaremos a alimentar a suspeição. Saudemos Felix Siga e todos quantos têm a coragem de manifestar a sua dúvida. Abramos e estimulemos o debate. Tentemos, pedagogicamente, ajudarmo-nos uns aos outros a apurar e a estabelecer os factos verídicos e a trilhar os caminhos objectivos do raciocínio e da análise, em busca de uma verdade autêntica, ainda que possa ser dolorosa, pois só com a verdade, poderemos construir o futuro em bases sãs e sólidas. Doutro modo, creio, estaremos, simplesmente, a adiar o processo.

Escrevi espontaneamente, sem grandes preocupações, porque o tema é de sobeja importância. Humildemente, quis deixar um contributo, essenciamente, de cariz pedagógico. Não sou senhor de nenhuma verdade, embora tenha reflectido e indagado junto de certas figuras, tentando pôr à prova informações que me chegaram na minha tenra adolescência, uma pesquisa que, de certa maneira, fui levado a retomar, por um militante do PAIGC, da primeira hora que se tornou meu amigo, mas que não tenho que tomar por fonte segura apesar de todo o respeito e credibilidade que me parece merecer.

A preocupação de Félix Siga não é, nem de perto, nem de longe, isolada. Em Setembro passado, fui ao Porto com o livro de Castanheira Neves em mãos. Fui lendo durante a viagem. Um médico guineense interpela-me: Andas a ler isso? Dentro de algum tempo, vamos publicar um livro para acabar com a mentira. Nem esperou a minha resposta. Deixando no ar um certo sentimento de indignação.
Tenho nas mãos um projecto de seiscentas páginas, ainda no prelo, obra de uma testemunha privilegiada, porque esteve lá e foi, de alguma maneira, o guardião dos arquivos e tem formação vocacionada.

Enfim, cá estaremos todos, se Deus Quiser, para discutir os estudos que forem dados à estampa.
Um abraço e bom trabalho, com muita coragem.

 

VAMOS CONTINUAR A TRABALHAR!

 

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