Fernando Casimiro (Didinho)

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28.09.2010

Fernando Casimiro (Didinho)Texto enviado para publicação e assinado por "Cidadão de Boa Vontade". Por saber quem se trata e por me ter sido solicitado, assumo total responsabilidade pelo artigo em questão, por razões que se prendem com a salvaguarda da integridade física do autor, que reside em Bissau, onde exerce a sua actividade profissional.

 

O envio da força de estabilização para a Guiné-Bissau: entre a incerteza e o protagonismo político

 

Como é do conhecimento de todos, em Agosto do corrente ano foi tornada pública através de uma reunião do Conselho Superior da Defesa sob presidência do Presidente da República, Malam Bacai Sanhá, a ideia da vinda de uma missão ou força de estabilização para a Guiné-Bissau como parte das recomendações feitas pela comunidade internacional.

Desta data para cá, iniciou-se um processo de debate inconclusivo sobre a vinda desta missão de estabilização para o país, para consolidar a precária paz e estabilidade e assistir as autoridades na reforma do sector da defesa e segurança. Dentro das instituições estatais formaram-se dois blocos: de um lado o do presidente da república, amplamente favorável à vinda desta força; do outro lado, o do primeiro-ministro, muito reticente senão mesmo contra a ideia.

Porquanto, a sociedade civil organizada pronunciou-se favorável e exigiu a sua concretização por ir ao encontro das suas preocupações há muito tempo. Associado a estes apoios, está a opinião pública, cuja maioria aprova efectivamente a vinda de uma missão ou força de estabilização, como forma de estancar as arbitrariedades que têm sido cometidas pelos senhores das armas com a cumplicidade dos diferentes dirigentes políticos.

Convêm no entanto dizer que, o envio de uma força de estabilização foi uma recomendação vigorosa da comunidade internacional, sobretudo, a CEDEAO, UA, e a CLP. Não é uma iniciativa isolada de alguma autoridade pública do nosso país. Alias, foi uma hipótese admitida em 2009 na cidade da Praia depois dos assassinatos deliberados de altas figuras do estado e as consequentes ondas de ataques às liberdades de expressão e de imprensa.

À semelhança de hoje, o Sr. Carlos Gomes júnior e o seu delfim, o Vice-Almirante José Zamora Induta, recusaram liminarmente a possibilidade de concretização dessa ideia em defesa dos seus próprios interesses pessoais, claro, as razões da recusa dessa altura e as de hoje, são completamente opostas.

Mas porque é que Gomes júnior que, aparentemente, é o beneficiário directo enquanto primeiro-ministro, desta hipotética missão de estabilização, tendo atenção os acontecimentos de 1 de Abril, tem bloqueado este assunto?

As respostas são várias, mas se quisermos ser concisos podem resumir-se em três a saber:

v O Sr. Carlos Gomes júnior enquanto político, tem travado sistematicamente uma guerra frenética contra tudo e todos aqueles que, no seu entender, ensombram as suas ambições para o poder, e para fazer face a estes supostos adversários não poupa os meios, para ele, estes justificam os fins. Na senda destas lutas, ele perdeu um aliado importante que é o Vice-almirante Induta, em consequência, ficou politicamente fragilizado. Nesta perspectiva, o facto de ser o presidente Sanhá o protagonista e interlocutor chave neste debate, vê nisso uma forma deste projectar-se ainda mais quer no seio do partido assim como na sociedade, porque é uma matéria bastante apoiada pela opinião pública. 

v Gomes júnior acredita que com a vinda de uma missão de estabilização ao país, certas instituições, sobretudo judiciais, tornar-se-ão fortes e habilitadas para investigar seriamente os contornos dos assassinatos de 2009 alguns dos quais ele é acusado de ser forte cúmplice moral.

v Preocupado com a actual situação frágil em que se encontra, e aproveitando-se da perplexidade de alguns sectores das chefias militares que opõem frontalmente a vinda desta missão, Gomes Júnior procura a todo o custo novas alianças nas forças armadas na estratégia de contrariar a maré que, pelos vistos, rema do lado do presidente Sanhá. Encontros secretos com altas patentes militares neste sentido, foram efectuados pelos seus sucessivos emissários, aliás o discurso da classe castrense em como discordaria da vinda da missão mas, se o governo desse o seu aval aceitariam, é um exemplo desse facto.

 

Portanto, com estas e demais razões pessoais, o Sr. Carlos Gomes Júnior e os seus correligionários têm feito tudo para impedir a vinda da força de estabilização nos moldes em que foi pensado pela comunidade internacional, prejudicando mais uma vez os interesses superiores do país em detrimento dos caprichos políticos e guerras de protagonismo desnecessário. Foram várias as declarações públicas de ministros e personalidades próximas ao chefe do governo pronunciando-se contra a vinda de qualquer força. Foi o caso do Ministro da defesa, Aristides Ocante da Silva numa recente visita a Luanda onde considerou a vinda da força de estabilização como uma questão dispensável.

A dimensão e a importância deste assunto para a estabilização política, social e económica da Guiné-Bissau estão acima de pequenos erros de formalismos procedimentais que eventualmente teriam sido cometidos, pois está em causa a sobrevivência de um estado ultrajado e profanado pelos seus próprios responsáveis políticos e militares estando na eminência da falência.

Hoje, é internacionalmente reconhecido que a Guiné-Bissau é um paradigma dos estados frágeis que necessita de uma assistência da comunidade internacional, mas as sucessivas intrigas políticas e as guerras para o controlo do poder, têm minado os esforços dos parceiros internacionais para pacificar o país e modernizar as suas instituições. Aliás, a cimeira da CEDEAO especialmente convocada para debater esta questão a semana passada, caiu num fracasso, devido à irresponsabilidade das autoridades políticas guineenses.   

Não é dúvida para ninguém que a vinda de uma missão ou força de estabilização não é um fim em si mesma, e nem é uma receita mágica para a resolução de todos os problemas da Guiné-Bissau, mas sim, é uma necessidade vital para ressuscitar a credibilidade do país profundamente abalada neste momento, devido ao ciclo vicioso de assassinatos e de graves violações dos direitos humanos cobertos pelo sindicato de impunidade.

Quando redigia este artigo, uma enorme satisfação encheu o meu coração ao ter conhecimento através dos órgãos de comunicação, das declarações do Presidente da Comissão Europeia, Dr. Durão Barroso, ao afirmar na presença de Carlos Gomes Júnior cito «espero que as autoridades da Guiné-Bissau aceitam a vinda de uma missão de estabilização, não é uma questão apenas de segurança, mas também de reatar a confiança da comunidade internacional» fim da citação.

Espero que este puxão de orelhas ao Gomes Júnior resulte numa mudança de atitudes, caso contrário, a nossa Guiné ficará isolada numa ilha desabitada onde reina a indisciplina, o ódio, a mentira, a corrupção e o clientelismo político.

Cidadão de Boa vontade

 


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