INSÓNIA (INSOMNIA)

 

Prof. Joaquim Tavares

J.TAVARES, MD, FCCP, FAASM

joaquim.tavares15@gmail.com

06.07.2008

 

Lembro-me dos tempos da Faculdade de Medicina em que ia treinar ou jogar à noite (depois das 6 da tarde) e voltava ao lar de estudantes todo cansado, indo para a cama por volta das 10/11 da noite, não conseguindo dormir até para lá da meia-noite!

Para mim, esse fenómeno foi sempre um paradoxo: se estava cansado depois dos treinos, devia estar mais predisposto a dormir, logicamente.

 

 Só depois de me envolver directamente no mundo das doenças do sono (sleep disorders) é que comecei a perceber o erro dessa lógica: ao praticarmos exercício estrenuoso (jogar futebol, levantar pesos, etc.) depois das 6 da tarde, o nosso organismo começa a produzir certas hormonas que designamos em linguagem comum de hormonas de stress (catecolaminas: dopamina, epinefrina, norepinefrina, acetilcolina, serotonina e hypocretina); estas hormonas vão estimular o centro responsável por estarmos acordados e podem continuar a estimular esse centro por mais de 4 horas; enquanto isso acontece, ficamos sem poder dormir; só depois do nível destas hormonas baixar e as hormonas responsáveis pelo sono subirem (gaba/galanina, adenosina, moduladores imunológicos), é que, finalmente podemos cair nas mantas do Orfeu.

 

O mundo das doenças de sono evoluiu tremendamente nos últimos 20 anos; no ano 2000, em Las Vegas, eu e mais 5 colegas éramos os únicos especialistas diplomados nas doenças do sono; em 2008, já temos mais de vinte diplomados; isto para realçar a importância das doenças do sono na saúde (apnéia do sono, insónia, sonambulismo, movimentos periódicos dos membros, convulsões nocturnas, etc.).

 

 

Respondendo às questões que me foram colocadas quanto à insomnia:

 

Por definição, insónia é a dificuldade em iniciar e/ou manter o estado do sono.

 

Temos 11 tipos de insónia, dos quais os mais relevantes são:

 

1-      Insónia de adaptação (adjustment insomnia): geralmente dura menos de 3 meses e factores desencadeantes são: período intenso de estudo para exames importantes; preparação de uma entrevista para obter emprego; morte de um familiar.

A maioria das pessoas ultrapassa esta fase sem problemas, outras, necessitam de um pequeno período de administração de medicamentos para dormir; uma pequena percentagem desenvolve o segundo tipo de insónia de que vamos falar de seguida (é este tipo que penso que um dos nossos leitores, que fez perguntas muito interessantes e que me pareceu extremamente preocupado, tem);

 

2-      Insónia psicofisiológica (psychophysiological insomnia):

  Este tipo de insónia dura pelo menos 1 mês e é caracterizada por concentração excessiva/anxiedade acerca do assunto do sono; dificuldade em dormir quando queremos dormir, mas sem dificuldade em dormir quando não se quer.

Estes indivíduos geralmente não têm problemas em dormir em hotéis ou em casas de amigos.

Têm dificuldade em relaxar, músculos sempre sob tensão, etc;

 

3-      Insónia paradoxical (paradoxical insomnia)

  Onde temos discrepância entre o paciente se queixar de insónia, mas quando fazemos o estudo do sono no laboratório, o doente dorme normalmente; este tipo de insónia é ainda mal percebido (uma teoria, é que estes indivíduos dormem toda a noite no estádio 1 do sono e por isso, ”mesmo a dormir, ainda estão cientes do que se passa à volta deles). Como informação: temos 5 estádios de sono: NREM ou seja, non rapid eye movements (1, 2, 3, 4; os estádios 3 e 4 agora estão agrupados no estádio nº3) e o estádio REM (5) em que os olhos estão constantemente a mover-se; alguns designam este estádio como sendo o estádio do sonho;

 

4-      Insónia idiopática

  Estes indivíduos têm insónia desde crianças (genético?);

 

5-      Insónia devido a perturbações mentais (depressão, esquizofrenia, etc.);

 

6-      Falta de higiene do sono (exemplos: exercício vigoroso depois das 6 da tarde; beber café ou álcool depois das 6 da tarde; ver televisão na cama; ficar na cama a pensar nos problemas do dia-a-dia);

 

7-      Insónia devido a drogas (cocaína, anfetaminas, etc.);

 

 

Tratamento

 

Vou exemplificar com o tratamento dum dos casos mais difíceis de tratar e que penso, será o problema do conterrâneo que mencionei acima - insónia psicofisiológica (no caso dele, foi desencadeada pelas noites que perdeu a estudar).

 

Os 3 factores em que se focam os tratamentos são:

 

A-    Factores predisponentes (predisposing factors):

    Teoreticamente, estes indivíduos produzem naturalmente muitas hormonas que os mantêm acordados (catecolaminas, cortisol);

 

B-    Factores desencadeadores (precipitant factors):

   Stress (guerra civil da Guiné - 1998; stress dos exames, morte de familiares, etc.);

 

C-    Factores perpetuadores (perpetuating factors);

 

  Comportamento: dormir em diferentes horas do dia; estar muito tempo na cama; muita cafeína (bica, coca cola, outras bebidas gasosas); actividades estrenuantes próximo da hora de ir para a cama; persistência em olhar para o relógio à noite quando se está a tentar dormir.

 

Cognitivo: constante preocupação sobre o sono/dormir; medo de não dormir.

 

Tratamento próprio:

A-    Educação sobre a higiene do sono (ir para a cama só quando estamos com sono; utilizar a cama só para dormir ou ter sexo; não ver televisão na cama, não ler na cama; evitar café, álcool, exercício estrenuoso depois das 6 da tarde);

 

 

B-    Se não conseguirmos dormir 15 minutes depois de irmos para a cama, devemos sair do quarto e fazer uma outra coisa qualquer, até estarmos outra vez com sono (para evitar o reflexo condicionado de Pavlov: cama = sinónimo de não poder dormir);

 

C-    Restrição do sono/dormir (sleep restriction therapy):

   Não importa a que horas vamos para a cama, devemos ter sempre uma hora certa para acordar e não se quedar na cama depois dessa hora.

 

D-    Técnicas de relaxar (relaxation techniques)

 

    Relaxação muscular progressiva (sentados, fechamos os olhos; abrindo e fechando as mãos contamos devagarinho de 1 até 10 e depois de 10 a 1; pode-se repetir. Ver vídeos que nos relaxam, etc.

 

 

Quando os tratamentos acima referidos não são eficazes, pode-se fazer o tratamento farmacológico (pode-se também fazer os dois concomitantemente):

 

Há dois grupos principais de medicamentos: os hipnóticos que não pertencem à classe das benzodiazepinas: menos riscos de nos habituarmos a eles e são de acção curta (zolpidem, zaleplom, eszoplicone — nomes químicos, porque se vos der nomes comerciais vai ser muita confusão; cada país usa nomes diferentes) e as benzodiazepinas (temazepam, alprazolam, diazepam) que podem causar problemas de habituação, tornando-se difícil fazer o “desmame”.

 

Um outro medicamento que tem visto o seu uso aumentar nos últimos anos, por ser mais de tipo natural é a melatonina, que devem considerar e perguntar aos vossos médicos de família se é adequada para casos particulares de insónia.

 

Obrigado pela atenção!


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