HÉLDER PROENÇA OU O POETA LIBERTADOR
Foto: Hélder Proença - Autoria: António Aly Silva - http://www.ditaduradoconsenso.blogspot.com/
Alai Sidibé [*]
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Londres, 09 Junho 2009
Boa noite ‘nha terra’ Guiné-Bissau,
Foi em 2002/03 que pela primeira vez estabeleci um contacto literário com Hélder Proença. Tinha-me deslocado à Biblioteca Municipal de Algés, em Lisboa, para uma recolha bibliográfica que me permitisse concluir o último capítulo do relatório final de licenciatura. Ao vasculhar as prateleiras, de repente me deparei com uma obra que logo me despertou a atenção: “História da Guiné-Bissau” de René Pélissier, Vol. II, - com prefácio de Leopold Sedhar Senghor – que logo “arrebatei”. Um pouco mais à frente, dei-me com um outro título que, de igual modo, me despertou os sentidos: “Antologia Poética da Guiné-Bissau”, compilando poemas de Amilcar Cabral, Vasco Cabral e outros. Li e reli as duas obras pela noite dentro… incessantemente, tão apaixonante eram as duas obras-primas (para glosear Leopold Senghor).
Os poemas tinham todos um ponto em comum: um sentimento telúrico apaixonado e apaixonante, impelido por os poetas se sentirem alienados na sua própria nação, condição que recusavam, valentemente lutando para serem homens livres. Notavelmente, de entre todos os poetas ali constantes, Hélder Proença era, de longe, aquele que mais me despertou a atenção, fazendo bailar o leitor, tanto pela imagem e beleza das palavras como pelo fio condutor, ou ‘leitmotiv’ das suas criações. Como eu não era (e, contudo, ainda não sou) muito familiarizado com as letras guineenses, procurei saber quem era a figura em causa, junto de alguns amigos; e porque não escrevia com assiduidade! As razões porque este autor se afastara - pelo menos publicamente - da escrita não sei responder porque as desconheço. Mas sei que Hélder Proença era um mestre-poeta; um poeta que nos deu voz; um poeta que é a nossa voz…!
Vamos escutá-lo:
“Quando te propus
um amanhecer diferente
a terra ainda fervia em lavas
e os homens ainda eram bestas ferozes
Quando te propus
a conquista do futuro
vazias eram as mãos
negras como breu o silêncio da resposta
Quando te propus
o acumular de forças
o sangue nómada e igual
coagulava em todos os cárceres
em toda a terra
e em todos os homens
Quando te propus
um amanhecer diferente, amor
a eternidade voraz das nossas dores
era igual a «Deus Pai todo poderoso criador dos céus e da terra»
Quando te propus
olhos secos, pés na terra, e convicção firme
surdos eram os céus e a terra
receptivos as balas e punhais
as amaldiçoavam cada existência nossa
Quando te propus
abraçar a história, amor
tantas foram as esperanças comidas
insondável a fé forjada
no extenso breu de canto e morte
Foi assim que te propus
no circuito de lágrimas e fogo, Povo meu
o hastear eterno do nosso sangue
para um amanhecer diferente!”
Hélder Proença (poeta e político guineense)
É preciso pensar melhor Hélder Proença para melhor podermos ligar o passado ao futuro, para que tudo aquilo por que ele tanto lutou valha a pena; para que a nossa condição de povo livre não seja em vão.
P. S.: Foi-se o político, ficou o poeta. Foi-se o homem, ficou o doce sopro das palavras.
Agora que estás às portas do paraíso, irmão Hélder, reza por todos nós, Guineenses que por ca deixaste, teus Irmãos… apesar de tudo.
Até um dia.
[*] Mestre em Estudos Europeus (União Europeia)
Nota do editor
Caro
Alai Sidibé,
Hélder Proença foi meu professor no Liceu Nacional Kwame N´Krumah em Bissau.
Fazia parte de um grupo de jovens promessas guineenses, um grupo de jovens com muita capacidade, visão, amor e compromisso para com a Guiné-Bissau e os guineenses.
Dessa geração de que o Hélder Proença fazia parte, acreditei, pela primeira vez, que o futuro da Guiné-Bissau estava garantido, porque tínhamos jovens valores que a nível da consciencialização e do compromisso patriótico, davam as melhores garantias nesse sentido.
Hélder Proença dominava os manuais da política! Sempre vi nele um grande estratega político; um dos melhores ideólogos que a Guiné-Bissau teve até agora!
Acreditei sempre que ele poderia tornar-se num elemento de referência quer na cena política, quer na área literária.
Desde que me ausentei da Guiné-Bissau, nunca mais nos vimos pessoalmente.
Entretanto, ele esteve sempre no topo, pois era na verdade, um grande estratega, um predestinado para a política.
Infelizmente, o Hélder Proença que era uma das minhas grandes esperanças para a Guiné-Bissau, tinha-se descomprometido com o país e com os seus irmãos.
Fiquei profundamente triste e decepcionado ao constatar que ele, que era dos BONS, tinha decidido passar para o lado dos MAUS...
O momento não é para julgamentos, mas a Guiné-Bissau, há muito que perdera um dos seus mais conceituados políticos e poetas...Hélder Proença!
Que a sua alma descanse em Paz!
Sinceras condolências à família.
Fernando Casimiro (Didinho)
11.06.2009
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