GUINÉ-BISSAU: QUE IMAGEM? (4)

UM DEBATE NECESSÁRIO E OPORTUNO!

Por: Fernando Casimiro (Didinho)

didinho@sapo.pt

27.03.2009

Fernando Casimiro (Didinho)"Ser humanitarista é ser seguidor do humanitarismo, a doutrina que visa desenvolver no homem e na mulher o amor pelos seus semelhantes e eliminar as injustiças reinantes, a fim de se alcançar a felicidade humana. Significa igualmente ser filantropo, ter e dar amor à Humanidade". Texto Editores - Dicionário da língua portuguesa.

Ser humanitarista, e ao contrário do que alguns pensam, não é ser contrário à Justiça nem à Verdade e muito menos transforma em pessoas de 2 faces aquelas que, ousando dar a cara, enfrentando os ditadores e todo-poderosos dos regimes violentos e corruptos que dirigiram a Guiné-Bissau ao longo dos anos, sempre demonstraram ser, em primeiro lugar, defensores dos direitos, liberdades e garantias dos seus concidadãos e, quiçá, sempre se posicionaram de forma patriótica nesse sentido, arriscando suas vidas e as dos seus familiares, porquanto verdadeiramente comprometidos com a Guiné-Bissau!

Um humanitarista não precisa, não tem que, não deve preocupar-se em agradar a este ou aquele, senão a si próprio com base na defesa dos ideais que sustentam o conceito teórico e prático do humanitarismo.

Ser humanitarista é saber distinguir a essência da Justiça estabelecida, ou seja, a Justiça definida como a igualdade entre os cidadãos, ou melhor, entre TODOS os cidadãos e, também, ser capaz de distinguir um posicionamento imparcial perante a lógica do que se tem ou se considera por Verdade.

Um humanitarista não pode ser apologista de 2 pesos e 2 medidas para situações semelhantes. Um humanitarista deve ser justo e honesto nas suas avaliações!

Se defendo o respeito pela vida humana, não tenho que escolher nomes de pessoas a quem devo defender terem direito à vida e outros a quem referenciar como alvos a abater. Todos temos direito à vida!

Se alguém tira a vida a outro, condeno o acto e exijo que se faça Justiça, que se aplique a lei em relação ao crime praticado. Não cabe a mim, nem a outros numa iniciativa pessoal ou de equipa, agir em nome de uma Justiça pessoal ou de grupo. Deve ser a estrutura judicial da República, ainda que não se acredite nela, a decidir pela aplicabilidade das leis.

Não devo tornar-me num criminoso, simplesmente porque não acredito no poder judiciário do país. Não devo fazer Justiça pelas minhas próprias mãos, ou contratar terceiros para o fazerem por mim. Devo-me esforçar, sempre, no sentido de demonstrar (denunciando, criticando) que a Justiça, que deve assentar na igualdade dos cidadãos não funciona, por carecer de mecanismos legais que permitam a argumentação da pretensão dessa igualdade entre os cidadãos, na aplicabilidade das leis e, na observância da defesa dos direitos, liberdades e garantias de todos os cidadãos.

Tomando em consideração as mortes de Tagme Na Waie, a 1 de Março e de Nino Vieira, a 2 de Março, volto a posicionar-me contra crimes desta natureza, tal como sempre me posicionei em relação a muitos outros crimes do género, inclusive, alguns por acções directas ou a mando quer de Tagme Na Waie, quer de Nino Vieira.

Isto não é hipocrisia! É a consistência de um princípio de igualdade na avaliação de situações da mesma natureza. Isto é ser justo, honesto e, acima de tudo, humano!

Isto não é ter 2 caras, numa suposta acção de criticar, denunciar os crimes que por exemplo, Nino Vieira cometeu ao longo dos anos e, agora, aparentemente, na visão de alguns, haver da minha parte, uma certa compaixão perante a sua morte.

Caros amigos e leitores,

Só quem odeia alguém pode ser insensível a qualquer morte e eu, nunca disse que odiava alguém, nunca demonstrei ódio por alguém, nem mesmo por alguém que se chamava João Bernardo Vieira!

Não posso, de maneira nenhuma, deixar de considerar criminosos quer Nino Vieira, quer Tagme Na Waie, pelos crimes que cometeram na Guiné-Bissau. Não posso ter 2 pesos e 2 medidas na avaliação das suas mortes, tal como me posicionei, no passado, em relação a outras mortes.

Temos tentado transmitir mensagens de sensibilização no intuito de ajudar na consciencialização dos nossos irmãos sobre os seus direitos e deveres, mas também, sobre princípios morais, enquadrados no conceito do humanitarismo.

Não contem connosco na promoção do ódio, da vingança e da Justiça pelas próprias mãos. Não é com estes elementos do mal que conseguiremos formar uma mentalidade sã entre os guineenses.

 

A DECÊNCIA TAMBÉM PASSA POR DENUNCIAR O QUE ESTÁ MAL E NÃO EM OCULTAR ESSE MAL, PENSANDO QUE SE ESTÁ A PROMOVER UMA IMAGEM POSITIVA DO PAÍS!

 

Posso dizer que desde que iniciei esta luta a 10 de Maio de 2003, várias foram as pessoas, na Guiné-Bissau, entre governantes, jornalistas e activistas dos direitos humanos que, de uma forma ou de outra, ajudei a proteger perante ameaças sérias em relação às suas vidas. Uma forma de proteger baseada na denúncia atempada dessas ameaças, através do site www.didinho.org como também, fazendo chegar essas denúncias a diversas Instituições Internacionais que trabalham na área dos Direitos Humanos.

Estaria eu a manchar a imagem da Guiné-Bissau?

Ou foi assim que consegui ajudar a salvar umas quantas vidas?

Repare-se o actual momento na Guiné-Bissau. Quantos jornalistas têm trabalhado no sentido de dar a conhecer o que se passa no país?

Os milhares de guineenses que estão fora do país não têm direito a ser informados do que por lá se passa?

Tendo esse direito, as informações devem ser com base na mentira e não na verdade dos factos?

 Ainda que se possa questionar a ética numa  avaliação pessoal, sobre a forma como essas informações, incluindo imagens fotográficas e outras, são apresentadas, deve-se impor a lei da rolha aos que pondo em risco suas vidas e as dos seus familiares, tentam dar o seu melhor mostrando o mal, no sentido de se mudar para o bem, ou o bem no sentido de se procurar fazer mais e melhor, em relação à Guiné-Bissau?

Imaginem, caros amigos e leitores se todos os que diariamente transmitem pela Internet, pelas rádios, jornais e televisões matérias sobre a Guiné-Bissau, o deixassem de fazer?

Quem ganharia com isso?

Poucos. Só mesmo o regime no poder!

Quem perderia com isso?

Todos! Guineenses e amigos da Guiné-Bissau!

Ao longo das últimas semanas o jornalista guineense António Aly Silva  "Ticha" tem publicado diversos conteúdos no seu blog. Goste-se ou não da forma de ser do "Ticha", concorde-se ou não com os conteúdos publicados, o certo é que, são milhares de pessoas que clicam no seu blog para saber o que se passa na Guiné-Bissau, até porque o "Ticha" vive em Bissau, arrisca a sua vida para obter informações que, patrioticamente, partilha no seu blog, ciente de que há guineenses em toda a parte do mundo e ansiosos por saber o que se passa no país, para além dos que residem na Guiné-Bissau.

Ontem, 26 de Março, um grupo de militares dirigiu-se por 4 vezes à residência do jornalista António Aly Silva em Bissau, sem que tivessem conseguido localizá-lo. Não foram lá fazer nenhuma visita de amigos ao "Ticha" e, agora pergunto:

Os que defendem a verdade da mentira através de imagens "consensuais" estarão à espera que alguém venha anunciar que mataram um jornalista?

Estarão à espera, esses defensores da verdade da mentira que um tal acto criminoso aconteça, para dizerem "bem feito" escrevias o que não devias?

Hoje, uma pessoa amiga enviou-me mais uma opinião de Zinda Pinto Cardoso, digamos que um reforço do seu anterior texto "BASTA".

Vou partilhar o texto em questão e agora, de forma directa, aproveito para dizer à Zinda Pinto Cardoso que nada de novo deu a conhecer na sua nova mensagem.

Entretanto, gostaria de saber porque é que a Zinda Pinto Cardoso nunca se pronunciou publicamente, nunca redigiu nenhum texto dizendo "BASTA DE MATANÇAS" quando a 23 de Abril de 2006 o Engenheiro Fernando Varela Casimiro, foi barbaramente espancado e assassinado no interior da sua residência em Bissau, alegadamente por militares guineenses, a mando de altas chefias militares?

O Engenheiro Fernando Varela Casimiro é só um exemplo entre muitos, mas tem o seu quê de oportuno na referência que faço e a Zinda Pinto Cardoso saberá perfeitamente onde quero chegar...!

Seria por hipoteticamente estar a defender a verdade da mentira sobre a cruel realidade do que se passa no país?

Não compreendo quem quer  e como quer contribuir para uma melhor imagem da Guiné-Bissau no Mundo!

Para mim, os que se refugiaram no silêncio durante estes anos e acordaram agora depois das mortes de Nino Vieira e Tagme Na Waie, "disparando" contra os que têm dado a conhecer o bem e o mal existente na Guiné-Bissau, devem repensar as suas atitudes, sobretudo, evitando criar animosidades nas relações entre guineenses e amigos da Guiné-Bissau.

A questão da imagem que se pretende transmitir sobre a Guiné-Bissau não deve ser colocada trazendo como argumento as fotos dos cadáveres de quem quer que seja. Os problemas da Guiné-Bissau não se resumem aos cadáveres que são mostrados, tenham lá paciência!

A grande casa que é a Guiné-Bissau é de todos os guineenses, seus filhos, bem como de todos os que se interessam por essa mesma casa e pelos filhos dessa casa, ainda que não sejam guineenses de nascença, mas por opção e de coração!

Vamos continuar a trabalhar!


 

Guiné-Bissau: um Estado falhado?

(...) Dos cinco PALOP (Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa), Cabo Verde é o que ostenta os maiores índices de desenvolvimento humano e há um par de anos que foi tirado da lista dos países menos desenvolvidos do mundo. Cabo Verde caminha seguramente para a modernidade e o progresso.

A Guiné-Bissau é uma tragédia. Mas é uma reflexão para todos aqueles que deram um passo em frente para pôr fim ao anacronismo colonial.

Para todos os vindouros, os que teimosamente cantam "sinto-me orgulhoso de ser africano", a Guiné-Bissau é um mau exemplo que faz partilhar a nódoa por todos os que querem ver o continente marchar em frente.

A Guiné-Bissau e os seus dirigentes falhados, reforçam o estereótipo e o ferrete que persegue o continente. (...)

Termina desta forma mais um artigo sobre a Guiné-Bissau, desta feita vindo de Maputo – do Jornal SAVANA  com o título: ” Guiné-Bissau: um Estado falhado”.

Entre depoimentos, entrevistas e imagens sobre a Guiné-Bissau, este artigo vem confirmar a extrema urgência de se fazer algo, não só pelo que tem circulado, mas porque de facto, tudo isto reflecte a mais pura e dura das realidades: a nossa realidade.

O facto de se querer combater esta vaga de divulgação da pior imagem da Guiné-Bissau, por mais que nos doa, não significa estar de acordo com o que se passa neste país, porquanto estas imagens são de facto o que parecem: reflectem simplesmente a terra que os guineenses de mais tenra idade correm o risco de herdar. E pelo que vem sendo hábito, até os inquéritos relativos aos acontecimentos hão-de ser tão inconclusivos quanto os inúmeros casos anteriores da história recente da Guiné e são, por conseguinte, o reflexo do que foi e tem sido a nossa governação e a impunidade dos actos até aqui cometidos.

Citando o artigo “Basta de Imagens chocantes sobre a Guiné-Bissau”, desde 7 de Junho de 1998, tem sido esta a nossa imagem de marca: ruas esburacadas, o único Hospital digno de nome sem condições, ausência de água, a divulgação de imagens mostrando o cadáver de figuras como Ansumane Mané, Veríssimo Seabra e agora a forma cruel como os guineenses são capazes de se matar à catanada, etc. Afinal o que queremos mostrar ao mundo? Que somos primitivos? Que somos capazes de nos liquidar uns aos outros da forma mais bárbara? E nada acontece? (...), o que se pretende não é denunciar propriamente as imagens negativas que são veiculadas sobre o país, mas um certo tipo de imagens que não nos são dadas a ver quando se trata de acontecimentos, também negativos, que têm lugar noutras paragens. Afinal, queremos mostrar os problemas políticos com os quais o país está confrontado, a instabilidade crónica, a confrontação entre os poderes político e militar ou cadáveres e corpos despedaçados? Note-se que aquando do ataque às Torres gémeas de Nova Iorque, do atentado à bomba em Madrid, ou em Londres, os canais de televisão e a imprensa mundial, tiveram o pudor de não exibir nenhuma imagem de corpos despedaçados ou em estado de degradação. E nem por isso essas notícias deixaram de ter o impacto que tiveram. Por que razão temos nós de exibir os nossos cadáveres? Se hoje a Guiné-Bissau perdeu o respeito que tinha nos anos 70, deve-se à forma como tem sido “des”governada e, as vinganças e os ajustes de conta que se têm verificado neste país são consequências dos inúmeros atentados aos direitos humanos ocorridos ao longo dos últimos trinta anos. Estas e outras práticas vão deixando marcas que têm contribuído para manchar sobremaneira o nosso bom nome.

Em consequência disso, divulgam-se imagens de um país agora marginal, onde tudo é possível; qualquer um pode fazer o que bem entender. Quem em nossa casa entra, e da nossa casa fala ou especula, se não somos os primeiros responsáveis, então algo está errado. Aliás, estamos a pagar um preço muito caro pela nossa arte de bem receber. Seja ele jornalista ou não, um estrangeiro na Guiné-Bissau é sempre bem recebido. Entra convencido de que, sem audiência prévia, será recebido no mesmo dia pelo chefe e nunca pelo assessor, pelo ministro e nunca pelo chefe de gabinete; da mesma forma que um taxista senegalês se vangloria de ser próximo de um ministro guineense com quem passa tardes no bar da Lenox- porque somos simples e ingénuos.

E, também em consequência disto, não deixou de ser notória a ausência de um único Chefe de Estado nos funerais do Chefe de Estado-Maior e do Presidente João Bernardo Vieira. O que pode, entre outras, provar o total desprezo que nutrem pela Guiné-Bissau. A própria ausência dos Presidentes dos PALOP revela uma coincidência no mínimo chocante. Durante o dia do funeral de Nino Vieira, as televisões portuguesas estavam mais interessadas na cobertura da visita de José Eduardo dos Santos a Portugal. Negócios “oblige”!

É de facto revoltante que assistamos impotentes à imagem humilhante veiculada de uma Guiné-Bissau denegrida, figurando como um dos países mais pobres do mundo, não pelos tradicionais indicadores de desenvolvimento humano, mas porque optou, entre outras, por vias de enriquecimento fácil, de “affaires” ilícitos e de nomeações não baseadas em mérito, mas em alianças políticas, ou compensações, que em nada beneficiam o país.

 Sabe-se que o narcotráfico não é um fenómeno novo na nossa sub-região, mas infelizmente só a Guiné-Bissau ficou rotulada como sendo a placa giratória deste negócio há muito conhecido e praticado nos países vizinhos porque, mais uma vez, esta arte que os outros dominam, nomeadamente a de projectar uma imagem idílica e paradisíaca do seu pais, apesar dos problemas que existem, não faz parte da nossa preocupação.

Esperemos que este seja o fim de um longo ciclo que possa contribuir para despertar nos nossos políticos, governantes e militares o sentimento de que a Guiné-Bissau é um país viável bastando para tal que se invista, entre outras, na Educação e que se entenda de uma vez por todas que o que está em causa é um projecto chamado Guiné-Bissau.

 

 Zinda Pinto Cardoso

 ZINDATenha coragem para mudar o que pode ser mudado, paciência para aceitar o que não pode ser mudado e sabedoria para distinguir uma coisa da outra. 
 

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