COISAS NOSSAS...(5)

"Coisas Nossas, Muito Nossas" é uma expressão que ficou célebre entre os guineenses no pós-independência. É da autoria do nosso saudoso, ilustre intelectual, Jorge Ampa Cumelerbo, a quem prestamos homenagem com os artigos "COISAS NOSSAS" .

Jorge Ampa Cumelerbo foi jornalista, escritor, investigador do INDE (Instituto Nacional para o Desenvolvimento da Educação) e Director do Centro de Formação e Superação de Professores "Máximo Gorki" em Có.

 

 

CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA DA GUINÉ-BISSAU

TÍTULO II

DOS DIREITOS, LIBERDADES, GARANTIAS E DEVERES FUNDAMENTAIS

ARTIGO 37°

4 -       A responsabilidade criminal é pessoal e intransmissível.

 

Guiné-Bissau: Mulher de Bubo Na Tchuto detida em Bissau
 
sexta-feira, 15 de Janeiro de 2010 | 10:59


A mulher do ex-chefe da Armada da Guiné-Bissau Bubo Na Tchuto, refugiado nas instalações da ONU em Bissau, foi detida há mais de duas semanas, disseram hoje fontes familiares.

Responsáveis do Movimento Nacional da Sociedade Civil disseram entretanto aos jornalistas que a mulher foi detida na qualidade de militar (alferes), por «assuntos ligados à segurança» e por «ter desertado».

As mesmas fontes garantiram, por seu lado, que a senhora se encontra bem e numa unidade militar em Bissau.

Diário Digital / Lusa
 

 

Fernando Casimiro (Didinho)

didinho@sapo.pt

18.01.2010

Fernando Casimiro (Didinho)

O Presidente da República é, segundo a Constituição da República da Guiné-Bissau, o Chefe do Estado, símbolo da unidade, garante da independência nacional e da Constituição e Comandante Supremo das Forças Armadas.

A Assembleia Nacional Popular é, segundo a Constituição da República da Guiné-Bissau,  o supremo órgão legislativo e de fiscalização política representativo de todos os cidadãos guineenses. Ela decide sobre as questões fundamentais da política interna e externa do Estado.

O Governo é, segundo a Constituição da República da Guiné-Bissau, o órgão executivo e administrativo supremo da República da Guiné-Bissau.

Os Tribunais, segundo a Constituição da República da Guiné-Bissau, são órgãos de soberania com competência para administrar a Justiça em nome do povo.

O Supremo Tribunal de Justiça é,  segundo a Constituição da República da Guiné-Bissau, a instância judicial suprema da República.

O Conselho Superior de Magistratura Judicial é, segundo a Constituição da República da Guiné-Bissau, o órgão superior de gestão e disciplina da magistratura judicial.

O Ministério Público é, segundo a Constituição da República da Guiné-Bissau, o órgão do Estado encarregado de, junto dos tribunais, fiscalizar a legalidade e representar o interesse público e social e é o titular da acção penal.

Seguindo o caso Bubo Na Tchuto, ficamos a saber, por estes dias, que sua esposa encontra-se detida há mais de duas semanas, na qualidade de militar e por «assuntos ligados à segurança» e por «ter desertado».

Começa a ser preocupante a dita estabilidade que se apregoa existir no país, visto que, ninguém sabe realmente, quais são as competências de cada órgão de soberania da República. Há, claramente, usurpações de competências; há claramente um clima de indiferença e conformismo dos órgãos de soberania afectados pela violação das suas competências pois, o medo, continua a reinar na Guiné-Bissau!

Quem tem competência para julgar na Guiné-Bissau? Esta é a principal questão que se coloca em relação ao caso Bubo Na Tchuto e sua esposa, pois oficialmente, nenhuma das acusações quer a Bubo Na Tchuto, quer à sua esposa foram proferidas por nenhuma instância judicial, civil ou militar da República da Guiné-Bissau.

São ambos militares, melhor ainda, para esclarecer que, segundo a Lei 2/78, LEI DA JUSTIÇA MILITAR, promulgada no regime monopartidário do PAIGC,

no seu Artigo 1.º, O poder judicial militar é exercido em todo o território nacional por um Tribunal Militar Superior e por Tribunais Militares Regionais.

Certo é que até hoje, não se ouviu nenhum pronunciamento do Tribunal Militar Superior sobre o caso Bubo Na Tchuto e da sua esposa, bem como de muitas outras acusações graves feitas a outros militares alegadamente por tentativa de golpe de Estado.

Atenção que, apesar desta Lei da Justiça Militar ter sido promulgada a 18 de Maio de 1978, ela continua a ser referência da Justiça Militar da Guiné-Bissau, no entanto, se houver outra Lei actualizada e "engavetada", solicitamos a quem de direito que a disponibilize para consulta pública.

No seu Artigo  7.° encontramos o seguinte:

  1. Junto do Tribunal Militar Superior funciona um Promotor de Justiça que representa a República da Guiné-Bissau e a quem, incumbe a acusação pública.

Quem mandou deter a esposa de Bubo Na Tchuto, alegadamente por ser militar, sem que houvesse um processo validado por um juiz do Tribunal Militar Superior?

Até quando continuaremos a permitir que qualquer um mande deter um cidadão, civil ou militar?

Não está à vista de todos que esta detenção é uma forma de "obrigar" Bubo Na Tchuto a sair da representação das Nações Unidas em Bissau, onde se encontra refugiado?

O Senhor Presidente da República não vê isso?

A Senhora Presidente do Supremo Tribunal de Justiça não vê isso?

O Senhor Procurador-Geral da República não vê isso?

O Senhor Presidente do Tribunal Militar Superior não vê isso?

A Sociedade Civil não vê isso?

Será difícil constatar que a Justiça, no caso Bubo Na Tchuto, não está a ser processada pelo órgão de soberania competente para o efeito?

Queremos realmente construir um Estado de Direito Democrático, continuando a promover ilegalidades, entre elas, detenções arbitrárias?

A detenção da esposa de Bubo Na Tchuto é um acto indecente e qualquer dia, sob torturas e várias outras formas de pressão, será obrigada a dizer mentiras sobre o marido, para a efectivação de provas que o incriminem.

A detenção da esposa de Bubo Na Tchuto, também significa o início de uma campanha de represálias contra familiares de todos aqueles que são incómodos ao Primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior e ao Chefe do Estado-Maior General das Forças Armadas, José Zamora Induta, os novos  "donos" do poder na Guiné-Bissau, principalmente os incómodos que se encontram fora do espaço geográfico da Guiné-Bissau...

É preciso pôr ordem na República, Senhor Presidente Malam Bacai Sanhá, ou será que está refém de um poder paralelo?!

Estamos, como sempre, a cometer os mesmos erros, os mesmos atropelos, por isso, sabemos e bem que caminho estamos a trilhar, infelizmente...

Já todos vimos que ninguém é imortal; que ninguém é dono da Guiné-Bissau; que abusando de outros e seus familiares, chega o dia de outros abusarem de nós e dos nossos familiares. Sabemos de tudo isso e também que continuamos a hipotecar o desenvolvimento da Guiné-Bissau e o futuro das gerações vindouras, mas, teimosos que somos, continuamos a ignorar as lições do passado.

Recentemente, o Senhor Presidente da República, na cerimónia de cumprimentos de Ano Novo afirmou de forma categórica que " não permitiremos que ninguém, mas ninguém mesmo, devido às suas ambições ou seus compromissos, quaisquer que estes sejam, ponha em causa as conquistas tão arduamente”alcançadas."

Quero dizer ao Senhor Presidente Malam Bacai Sanhá que, a última grande conquista do nosso povo foi, a meu ver, a proclamação do Estado da Guiné-Bissau. Desde então e até aos dias de hoje, temos vindo a destruir essa e tantas outras conquistas obtidas à custa de sangue, suor e lágrimas dos melhores filhos do nosso povo.

Senhor Presidente Malam Bacai Sanhá, era suposto construirmos uma Nação, no pós-independência, mas, volvidos 36 anos, continuamos a cavar a nossa própria sepultura. Quais são as referências das conquistas do pós-independência?!

Golpes de Estado, Ditaduras, Matanças, Corrupção, Impunidade, Narcotráfico, Pobreza extrema etc. etc.

Senhor Presidente Malam Bacai Sanhá, a Guiné-Bissau deve ser encarada com realismo, o que não significa pessimismo e, muito menos, falta de patriotismo. Temos que assumir a real situação do país, quer se goste ou não da imagem que cada um faz da Guiné-Bissau, mas acredite, nós os críticos, sempre fomos e continuaremos a ser optimistas em relação a uma Guiné-Bissau Positiva!

VAMOS CONTINUAR A TRABALHAR!

 

LEI DA JUSTIÇA MILITAR

LEI N.º 2/78

Do poder Judicial Militar

PREÂMBULO

 A nossa Lei de Justiça Militar contém disposições que se justificaram durante a gloriosa Luta de Libertação Nacional e que hoje deixaram de ter actualidade no quadro de Reconstrução Nacional.
Indica-nos a prática que, enquanto não for feita a actualização geral da Lei de Justiça Militar, é aconselhável a publicação de algumas reformulações das suas disposições para melhor se adaptar à nossa realidade actual.
Assim, a Assembleia Nacional Popular, no uso das vacuidades atribuídas pelos artigos 28.º e 29.º da Constituição, decreta, e eu promulgo, para valer como lei, o seguinte:

Artigo 1.º

O poder judicial militar é exercido em todo o território nacional por um Tribunal Militar Superior e por Tribunais Militares Regionais.

Art. 2.°

Só podem fazer parte do Tribunal Militar Superior ou dos Tribunais Militares Regionais os cidadãos nacionais com mais de 18 anos de idade em pleno gozo dos seus direitos civis e políticos.

Art. 3.º

Os militares dás FARP, os elementos da Milícia quando devidamente enquadrados em missão militar, de segurança ou de manutenção da ordem, e os elementos da Policia e Ordem Pública, estão sujeitos ao foro militar.

Do Tribunal Militar Superior

Art. 4.°

1. O Tribunal Militar Superior tem a sua sede na capital da República da Guiné-Bissau e jurisdição militar sobre todo ò território nacional,

2. O Tribunal Militar Superior poderá reunir em qualquer ponto do território nacional, se assim o entender mais conveniente para boa administração da Justiça.

Art. 5.°

O Tribunal Militar Superior é constituído por 5 juízes sendo 1 presidente e 4 vogais.
1. O presidente é sempre um comandante, membro do Estado Maior das FARP.
2. Sempre que possível, um dos juízes deverá ser licenciado em Direito, que será o auditor.
3. Haverá sempre uma representação popular entre os juízes e, na hipótese de julgamento de um soldado, um dos juízes vogais, que não o auditor, será outro militar da mesma patente.

Art. 6.°

 Sob proposta do Comissário de Estado da Justiça, o Conselho de Estado nomeia para cada processo ou série de julgamentos os juízes doTribunal

Militar Superior.

Art. 7.°

  1. Junto do Tribunal Militar Superior funciona um Promotor de Justiça que representa a República da Guiné-Bissau e a quem, incumbe a acusação pública.


2. O Promotor de Justiça é nomeado nos termos previstos no artigo 6.°.

 

COMPETÊNCIA

 

Art. 8.º  

Compete exclusivamente ao Tribunal Militar Superior o julgamento dos seguintes crimes:
a) os de atentado contra a vida dos membros dirigentes do PAIGC;
b) os contra a segurança interior e exterior do Estado, previstos nas leis vigentes;
c) os de revelação dos segredos do Estado;
d) os de ataque armado contra locais fortificados;
e) os de mercenariato;
f) os de pirataria;
g) os de roubo, quando praticados à mão armada ou com uso de uniforme das Forças Armadas;
h) os de homicídio voluntário com requintes de malvadez; e
i) os de envenenamento.

Art. 9.°

1. Os crimes previstos no artigo anterior serão punidos com trabalho, produtivo obrigatório de 2 a 8 anos, de 8 a 12, de 12 a 15 anos ou morte por fuzilamento, segundo a sua gravidade.
2. A tentativa e a frustração dos crimes previstos no artigo anterior são equiparadas ao crime consumado.
3. A pena de morte por fuzilamento, em nenhum caso poderá ser aplicada a menores ou a mulheres grávidas.
4. Mesmo que o menor, aquando de juramento, tenha já atingido a maioridade, não, lhe será aplicada a pena de morte por fuzilamento por factos que haja perpetrado na menoridade.

Dos Tribunais Militares Regionais

Art. 10.°

Na sede de cada Região Administrativa é instituído um Tribunal Militar com jurisdição sobre toda a Região.

Art. 11.°

 O Tribunal Militar Regional, é constituído por 5 juízes, sendo um presidente e 4 vogais.
1 — O presidente é o Comandante Militar da Região 2 — Os vogais serão:
a) O Presidente do Comité de Estado da Região
b) Um juiz auditor de preferência licenciado em Direito
c) Dois elementos da população.
3 — Na hipótese de julgamento de um soldado, um dos juízes vogais previstos na alínea c) do número anterior será outro militar da mesma patente.

Art. 12.°

Junto do Tribunal Militar Regional funciona um Promotor da Justiça que representa a República da Guiné-Bissau e a quem incumbe a acusação pública.

Art. 13.º

 

Sob proposta do Comissário de Estado da Justiça, o Conselho de Comissários de Estado nomeia os Juízes do Tribunal Militar Regional e o Promotor de Justiça.

 

COMPETÊNCIA

Art. 14.°

 

Compete aos Tribunais Militares Regionais o julgamento dos seguintes crimes:
a) Os essencialmente militares;
b) Os comuns praticados pelos indivíduos referidos no art.º 3.°.

 

QUADRO DE PENAS

 

 

Art. 15.°

 

É fixado o seguinte quadro das penas de trabalho produtivo obrigatório a aplicar nos Tribunais.
a) De 30 dias a 2 anos
b) De 2 anos a 8 anos
c) De 8 anos a 12 anos
d) De 12 anos a 15 anos 2 — A expressão «pena de prisão» referida nas leis em vigor é substituída por «trabalho produtivo obrigatório».

 

DOS RECURSOS

Art. 16.°

 

1. Das decisões dos Tribunais Militares Regionais cabe recurso a interpor, dentro do prazo de 5 dias a contar da data em que o réu for notificado da sentença para o Tribunal Superior Militar que decidirá definitivamente.
2. Das decisões do Tribunal Militar Superior, com excepção, das que aplicarem pena de morte por fuzilamento, cabe recurso, a interpor dentro do prazo de 5 dias a contar da data em que o réu for notificado da sentença, para o Supremo Tribunal de Justiça, que decidirá definitivamente.
3. O condenado a pena de morte, pode, no prazo de três dias a contar da data em que for notificado da sentença, solicitar graça ao Conselho de Estado.
4. A sentença que aplicar a pena de morte, só será executada após decisão de recusa de graça pelo Conselho de Estado, ou decorrido o prazo a que se refere o número anterior, sem que tenha havido solicitação da graça.

 

Art. 17.°

 

Ficam revogadas todas as disposições da Lei de Justiça Militar e outras que contrariem a presente Lei.

 

Art. 18.°

 

Esta lei entra imediatamente em vigor.
Aprovada na sessão de 18 de Maio de 1978.
A Vice-Presidente da Assembleia Nacional Popular, em exercício Carmen Pereira.
Promulgada em 18 de Maio de 1978.
Presidente do Conselho de Estado, Luiz Cabral.

 

COISAS NOSSAS...(4) 15.01.2010

COISAS NOSSAS... (3) 04.01.2010

COISAS NOSSAS... (2) 01.01.2010

COISAS NOSSAS... 30.12.2009

 

COMENTÁRIOS AOS TEXTOS DA SECÇÃO EDITORIAL


Cultivamos e incentivamos o exercício da mente, desafiamos e exigimos a liberdade de expressão, pois é através da manifestação e divulgação do pensamento (ideias e opiniões), que qualquer ser humano começa por ser útil à sociedade! Fernando Casimiro (Didinho)

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