BACAI SANHÁ, O EQUÍVOCO II

 

Malam Bacai Sanhá

 

 

Por: Alai Sidibé

Alai Sidibé

 

alt0154@londonmet.ac.uk

 Londres, 04 Abril 2007

 

O meu prezado compatriota, Domingos Pereira, desculpar-me-á o ter-lhe roubado este título, mas a verdade é que nenhum outro assentaria melhor ao súbito pretendente à chefia do PAIGC, do que aquele que foi escolhido pelo senhor para caracterizar Bacai. O senhor Pereira, autor de artigos sempre inteligentes e profundos, tem-nos presenteado com textos que constituem sem dúvida lufadas de ar fresco para a nossa jovem mas aprisionada democracia. Por conseguinte, o artigo ‘MALAM BACAI, UM EQUÍVOCO POLÍTICO’ consegue fazer uma radiografia cabal e completa do senhor Sanhá enquanto aspirante a dirigente político, mas cuja característica principal não passa a de um personagem com uma inabilidade política pasmante. Mas vamos por partes.

 

O processo tem início em 1999 aquando das primeiras eleições presidenciais pós Nino Vieira. No escrutínio em causa, como é de domínio público, o senhor Bacai consegue fazer história ao estar associado ao pior resultado do PAIGC desde a sua criação na década de cinquenta, quase levando o glorioso partido de Cabral à desonra total.

O leitor alegará que ‘nas referidas eleições o partido se encontrava tão desacreditado e desgastado, em consequência da incompetência e da corrupção ninista que qualquer outra força política constituiria uma alternativa credível’. Obviamente, dada a conjuntura de então, esta não deixa de ser uma argumentação válida. Mas é igualmente verdade que não se vislumbrou nenhuma vontade da parte de Bacai e da respectiva entourage, nenhuma estratégia que pudesse convencer o eleitorado a não virar as costas ao partido. Ou seja, perante o abismo provocado pelo general, com consequências muito dolorosas para o partido, podia ter-se optado por uma estratégia que se demarcasse do ancien règime. Esta estratégia não foi assumida, pelo menos no âmbito da campanha presidencial de 1999, porque Malam não teve (nem tem) visão suficiente que pudesse evitar a derrocada que o partido veio a sofrer, face ao radicalismo de Kumba e do seu grupo.

 

Após o abismo só restava ao PAIGC a inevitável travessia no deserto. A este propósito torna-se relevante referir a manifesta incapacidade dos políticos ditos «profissionais», entre eles o Bacai, de pegarem no partido. Para evitar uma situação que bem podia ser de estrangulamento interno, eis que entra em cena o senhor Gomes Júnior para evitar que o partido caísse em mãos ortodoxas. Chegando à presidência num momento particularmente difícil, e não sem indisfarçáveis resistências internas, o empresário consegue lavar a face do partido, restituir-lhe a sua honra e prepará-lo para os embates que se avizinhavam. Quer se queira quer não, Gome Júnior consegue restituir ao PAIGC a sua vocação de partido virado para o poder, até porque é o único com cabal conhecimento das reais necessidades da população guineense.

 

Após a ascensão do actual presidente do partido ao poder, eis que ressurge o inevitável Bacai na arena política activa para, apesar da costela de perdedor nato, implorar a sua nomeação para as presidenciais de 2005, que sabia de antemão que ia perder por crónica falta de carisma, entre outros defeitos. O cândido Carlos Gomes, desconhecendo o que mais caracteriza o político dos nossos tempos: o calculismo, estende a sua mão ao eterno candidato presidencial. Na verdade Malam Bacai, aproveitava-se de um governo em forma, e de um primeiro-ministro que tinha ganho a simpatia dos guineenses e a credibilidade junto da comunidade internacional, para assim ser levado ao colo rumo ao altar presidencial. Mais uma vez, conseguiu o impossível: perder o duelo com uma natureza morta. Pois apesar dos recursos financeiros de que dispunha o ditador, um Malam minimamente hábil seria capaz de explorar as fraquezas ninistas.

 

Assim, apesar de levado ao colo pelo seu agora arqui-rival, mas aliado indissociável de então, o Bacai foi, por manifesta incompetência, incapaz de nos livrar duma situação que todos já previam como bem provável, ou seja, a reincidência da ditadura ninista, agora com um estilo narcótico e gangster que, curiosamente e de noite para dia volta a ser o seu principal confidente.

 

A actual situação de Bacai Sanhá revela que toda a política guineense é baseada no método celebrizado por aquele florentino, amigo da família dos MEDICI, autor de, entre outros escritos, La Prima Decca de Titto Livio e  de La Arte de La Guerra; aquele que é o pai da ciência política moderna, da ciência política empírica, precisamente aquele que não olha a meios para atingir fins, e, aliás como veio a confessar, para cair nas boas graças dos MEDICI, na ocasião novos donos florentinos, teve de forjar a obra, EL Principe. Talvez por isso mesmo, por ignorar os meios quando se trata de alcançar os objectivos é que, após longas temporadas em prisões da cidade de Florença - já sob a regência de outras famílias conquistadoras - passa os últimos anos da suas vida pobre e desprezado, a prestar serviços numa biblioteca de terceira categoria da cidade. Fim trágico para alguém que fora aquilo que hoje se equivaleria a embaixador. Claro que falo de Niccolo Machiavelli (1469-1527). Isto deve servir de exemplo para a classe política da Guiné-Bissau, para a qual salvo raras e honrosas excepções, o que conta é o dá-cá-toma-lá.

 

Para não perder o fio à meada, diria que, eis o mesmo Bacai que, numa situação de clara afronta à inteligência de todos os guineenses, tem a ousadia de se colocar na corrida a presidência daquele que era o partido de Cabral, para servir o povo - mas que agora não se sabe de quem é, nem para quem é - alegando a necessidade de o partido se reunificar, quando se sabe que o PAIGC já esteve em situação bem pior sem que na altura fizesse nada para a contrariar. A indecisão e falta de timing resultam perigosos na política.

 

Politicamente, agrada-me que os combates se façam com clivagens, com campos bem definidos, até porque não gosto de promiscuidade, pois não me agrada a falta de definição de fronteiras. Pessoalmente entendo que a política não é compatível com ligeireza nem leviandade. Do mesmo modo, não me agradou nada o acto de vassalagem que recentemente o Bacai Sanhá foi prestar ao general. Actos destes só contribuem para desacreditar ainda mais o já de si pobre ambiente político do nosso país. No futuro político do nosso país, Sanhá é uma figura ultrapassada porque não tem ideias nem frescura política. Só espero que não transforme o próximo congresso de Gabú em mais um carnaval do PAIGC.

 

Como observa Inácio Valentim,  ‘conspiração’ é o que mais define o partido de Cabral, aliás este sentiu bem na pele a principal vocação do partido que criou e incutiu uma certa cultura, mas que optou por uma outra completamente diferente. O mesmo partido, que apesar de meio século de existência acabado de celebrar não consegue ser um partido maduro, muito menos um partido africano de referência como era suposto afirmar-se.

 

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