Fernando Casimiro (Didinho)

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02.11.2010

Fernando Casimiro (Didinho)Texto enviado para publicação e assinado por "Cidadão de Boa Vontade". Por saber quem se trata e por me ter sido solicitado, assumo total responsabilidade pelo artigo em questão, por razões que se prendem com a salvaguarda da integridade física do autor, que reside em Bissau, onde exerce a sua actividade profissional.

 

 

AS IMPLICAÇÕES JURÍDICO-POLÍTICAS DO EPISÓDIO ADJA VS CADOGO

 

O país foi mais uma vez surpreendido com um vergonhoso episódio que opõe o primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior e a sua Ministra do Interior Adja Satu Camara, tendo como base, a discordância do primeiro na nomeação de altos dirigentes na hierarquia deste Ministério.

Numa primeira análise, este episódio espelha o nível da banalidade da função do estado e da responsabilidade política dos actuais inquilinos do poder. Enquanto conhecedor da realidade política da Guiné-Bissau, não me resta dúvidas que, o que esta subjacente neste incidente é apenas o controlo do poder, no âmbito da incessante guerra fratricida existente no seio do partido no poder se não vejamos:

v A nova legislação aprovada pela ANP, promulgada e publicada no boletim oficial, prevê novos postos para a hierarquia do Ministério do Interior designadamente três subcomissários contra um do actual, para alem da figura do Comissário Nacional. Este último disse a lei, é nomeado pelo Conselho do ministro sob proposta do Ministro do Interior, sendo que os três subcomissários a saber: de Operações e Segurança, Recursos Humanos e por último, Logística e Finanças são nomeados pelo Ministro do Interior, conforme procedeu a actual titular da pasta no seu polémico despacho. Portanto, ela agiu em princípio com base numa legislação que lhe habilite de levar a cabo as nomeações. 

v Todos os cargos dirigentes cujas nomeações não acarretam o despacho do Primeiro-ministro são da competência exclusiva dos respectivos titulares exercer os poderes que a lei lhes confere, podendo no entanto se o entenderem, informar o chefe do governo.

v A polémica não tem nada que ver com os nomes propostos até porque são pessoas aparentemente idóneas e bem conhecidas no meandro da corporação policial guineense, contrariamente os nomes ligados ao narcotráfico, avançados por diferentes órgãos de informação.

v Os directores gerais, de iure são nomeados pelo Conselho de Ministros sob proposta do ministro da área e por despacho do primeiro-ministro, mas de facto a prática mostra-nos que estes são nomeados por despacho dos Ministros competente e só mais tarde levados ao conselho de ministros.

v Fala-se na praça pública que a Sra. Adja não foi uma escolha de CADOGO mas sim uma imposição do Presidente da Republica o que é inaceitável, não obstante este ter sido sempre uma aliada importante do Gomes júnior para fazer face aos seus adversários políticos no interior do partido.

v As lutas pelo controlo do poder entre o Presidente Sanha e Gomes Júnior, traduz-se na tentativa de cada uma das alas de apoderar e controlar as Forças Armadas e os Serviços de Informação do estado. Nesta perspectiva, com a perda de influência de CADOGO nas FA, ele não pode aceitar ter uma pessoa no Ministério do interior da confiança absoluta do PR.

 

Portanto, não havia motivos suficientes para toda esta bronca se não tivesse predisposição de ambas em travar combates políticos mútuos, conforme aponta os indicadores.

Do ponto de vista político, a Adja perdeu confiança do primeiro-ministro a única coisa que lhe resta é apresentar a sua demissão conforme manda as regras da ética, ao invés de entrar em infantilidades que afecta a sua imagem enquanto mulher incontornável na vida política guineense. Ela não percebeu que tem duas opções que são: ser demitida pelo PR sob proposta do PM quando perder a confiança deste, ou apresentar a sua demissão quando não existe condições objectivas para continuar no cargo como é o caso. Aliás, o PM não pode impor aos seus ministros os dirigentes que não querem, e ele não pode ser imposto pessoas como ministros contra a sua vontade.

As atitudes da Ministra Adja são típicas daqueles que não têm uma mínima noção da ética política e da necessidade de preservação da postura de dignidade pessoal. Agem por interesses próprios e de determinados grupos.

No entanto, Juridicamente, o Gomes júnior foi infeliz na sua medida, pois o despacho que suspende a Ministra do interior é manifestamente ilegal. De um lado, usurpou as competências do PR que nomeia os ministros e secretários do Estado através de um decreto presidencial sob proposta do PM. A figura de suspensão não existe entre o primeiro-ministro e os ministros porque não há hierarquia entre eles, mas sim confiança política, equivale dizer que o PM não é superior hierárquico dos ministros consequentemente, não tem poder de direcção nem disciplinar contra eles. Contudo, havendo perda de confiança no desempenho de um determinado ministro ou secretário do estado, ele só tem uma única opção, propor a exoneração imediata deste membro do governo. Aliás, a força jurídica de um decreto presidencial é superior a de um despacho mesmo nos casos de conflitos entre o decreto do PR e o seu próprio despacho prevalece o primeiro. Do outro lado, este despacho do PM inverteu a pirâmide por ter ordenado a comunicação da suspensão ao PR como se na realidade, é ele quem nomeia e exonera os ministros.

Os efeitos de uma suspensão, figura jurídica do direito administrativo, é mesmo da demissão ou exoneração, ou seja, ambas acarretam a cessão imediata da função, por isso só podem ser exercidas por entidade que por lei, tem a competência de nomear, neste caso em concreto o PR. Dai ser precipitado e ilegal o despacho do PM que pode até ser visto como um acto de provocação que poderá desembocar numa crise política com contornos imprevisíveis.

O poder de coordenação do PM sobre a actividade governativa prevista na constituição, é meramente política sobretudo de controlar a execução do programa do governo sufragado pelo povo cuja avaliação, ele responde primariamente perante os eleitores. Assim, acho forçado e uma aberração jurídica retirar daí as competências de suspensão por parte do PM. Aliás, é bom recordar que na sede do direito público, a competência não se presume, nele a lei é o fundamento, o limite e o critério de actuação dos titulares dos cargos públicos. Porquanto, mesmo o principio de inferência lógica quem pode o mais pode o menos não se aplica neste caso, porque o mais seria a nomeação e esta é feita por PR e não o PM. No caso de lacuna da lei sobre se o PR pode suspender recorria a este principio.

Para concluir, chamo atenção sobre a necessidade de acabar com as intrigas e disputas politicas incompreensíveis que minam os esforços da comunidade internacional para democratizar o país rumo ao desenvolvimento sustentado. Portanto, parem e reflectem sobre o futuro das crianças e de uma geração que está a ser comprometido pela ganância e ambição desmedida de um punhado de pessoas que apoderam dos recursos colectivos para os proveitos pessoais.

Cidadão de Boa vontade

 


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