A Guiné-Bissau pelos caminhos que a fragilidade do Estado a conduz

 

Edson Incopté

edson_incopte@hotmail.com

16.12.2013

Procurei, até agora, conservar-me em silêncio sobre o caso dos sírios que chegaram a Portugal num voo da TAP proveniente de Bissau, porque senti essa necessidade. Senti que tinha de perceber, minimamente, o que realmente se tinha passado, não me fiando só nas notícias e “grotícias” (informações grotescas que não são notícias, não são nada) que constantemente bombardeiam o nome da Guiné-Bissau.  

Embora sem perceber ainda, cabalmente, o que verdadeiramente aconteceu, sinto-me neste momento capaz de emitir uma OPINIÃO.

E a minha opinião é: não se pode culpar (condenar) só a Guiné-Bissau, e no seu todo!

Começo por recuar no tempo, para que todos compreendamos que nem tudo o que acontece pode ser analisado apenas à luz do momento. Aliás, como em quase tudo na história da Guiné-Bissau, foram-se abrindo precedentes que nunca se fecharam.

Depois do conflito armado de 1998, a TAP teve um papel na (re)construção do aeroporto que a guerra tinha danificado. A partir dessa altura esta Companhia Aérea passou a fazer o que queria e bem entendesse no referido aeroporto. (Na minha última viagem com a TAP, por exemplo, em 2012, fazendo o caminho de volta para Lisboa, os funcionários do aeroporto reclamavam dos horários de voo da TAP. “Já nos sentamos com eles e já pedimos mil vezes para que alterassem os horários, para que não viessem a estas horas, acima das duas/três da manhã; conhecem bem as nossas limitações, mas não nos ligam nenhuma e continuam”).

Como dizia o funcionário, a TAP conhecia como mais nenhuma outra companhia, a situação do Aeroporto Internacional Osvaldo Vieira. Mas nunca fez caso. Interessava-lhe, apenas e só o dinheiro que fazia. Tinha o monopólio da rota e fazia o que bem queria. Paga-se o mesmo, mais coisa, menos coisa, para se fazer um voo de, aproximadamente, onze horas para Moçambique (Maputo) e um voo de menos de cinco horas para a Guiné-Bissau (Bissau), sem qualquer contrapartida que justifique tão elevado preço para os passageiros que voam para Bissau.

Mas o que importa aqui realçar, e é esse o meu ponto para não aceitar que se culpabilize e se condene apenas e só a Guiné-Bissau, por mais no seu todo, é que a TAP conhecia bem o aeroporto de Bissau que utilizava. Conhecia e não confiava em ninguém. Não confiava nos seus funcionários aeroportuários e nem nos próprios serviços da Embaixada portuguesa.  

Se não vejamos: depois de passar todos os postos de segurança, à porta do avião, o passageiro tem que, novamente, apresentar todos os documentos e se sujeitar a um “questionário” e ser focado com uma lanterna na cara para confrontar com o documento apresentado. (Aconteceu-me em 2012, mesmo à porta do avião, depois de subir as escadas, onde supostamente mostraria a base do bilhete  e me indicariam o lugar). 

Ora, se a TAP conhecia as condições do aeroporto de Bissau, trabalhava sob elas, não exigindo, desde então, pelo menos que se conheça, do Estado Guineense, a melhoria das condições, porquê então da surpresa do acontecido e porquê da atitude, quanto a mim radical, da companhia? Eu entendo que seja, apenas e só, numa tentativa de se desvincular do acontecido e aparecer como vítima.

Pergunto:

A TAP não tem, igualmente, a sua quota-parte no que aconteceu, por ter ignorado durante anos as condições de segurança que agora julga e condena?

Os números agora apresentados pelo SEF, relativos a tentativas de emigração ilegal de Bissau para Lisboa, eram números que a Transportadora Aérea Portuguesa desconhecia?

Porque razão a imprensa portuguesa, que às vezes funciona por um arrasto cego, não pede, igualmente, explicações a Embaixada de Portugal em Bissau, onde se emitem, sistematicamente, vistos por cunha e/ou a quem tem dinheiro?

E mais, o que ainda não percebi completamente, é se os passaportes, “comprovadamente falsos” tinham ou não vistos de entrada em Portugal. Quem tiver essa informação, que ma forneça.

Porque se tinham, naturalmente, a Embaixada portuguesa em Bissau, mais do que nunca, tem que assumir, igualmente a sua culpa. Se não tinham, então temos ainda muito por saber, até chegarmos à tripulação que diz ter sido coagida, primeiro com armas de fogo, depois sem armas, apenas verbalmente, começando a cair em contradições. Coação que, importa referir, ainda não foi comprovada.

Não me queiram fazer acreditar que a TAP não tem contacto DIRECTO com a representação diplomática portuguesa em Bissau; a ponto de com uma chamada resolver toda a contenda e não transportar, ilegalmente, quem quer que seja para onde quer que seja. Não queiram fazer-me acreditar, porque não conseguirão. Até porque, não acredito, igualmente, que todos os Governantes guineenses com responsabilidade em matéria de emigração estejam implicados para que nenhum queira resolver o caso.   

Não pretendo com tudo o que disse, “passar a mão pela cabeça” do Estado da Guiné-Bissau. Até porque, como indica o título do texto, tudo o que está a acontecer, tem que ver com a fragilidade do Estado, culpa de muitos dos nossos Governantes e políticos. Só isso permite que o nome do país continue a ser publicamente enxovalhado. E só isso dá à TAP capacidade de, com UMA ACÇÃO, prejudicar quase todo um país.

Do passado ao presente, é necessário que os Governantes guineenses percebam que o país não pode continuar no lamaçal em que se encontra.

É completamente inadmissível e revoltante o descrédito que o Estado guineense vem acumulando. Nem imaginam o trabalho que estão a acumular nos ombros das próximas gerações.

Agora, o que eu não aceito e não quero aceitar, a qualquer custo, é todo um país aos pés de uma transportadora aérea que, estrangeira ou não, o desrespeita.

Como dizia a minha avó “ninguin kana pati nha fidjus bianda na mon, n’kuantu n’bibu nunka!” (jamais alguém oferecerá aos meus filhos comida na mão, enquanto viver nunca!). A pobreza não tem que ser sinonima de desonra.

Sejamos orgulhosos sim! Um orgulho sã e esclarecido, mas sejamos!

Assumamos os nossos erros e preparemo-nos para fazer melhor no futuro, mas não aceitemos calados e empinados toda a culpa, quando ela deve ser partilhada. Não engulamos qualquer desrespeito que venha da comunicação social ou de algum político que desconhece do que fala.  

 

 COMENTÁRIOS AOS DIVERSOS ARTIGOS DO ESPAÇO LIBERDADES


VAMOS CONTINUAR A TRABALHAR!

associacaocontributo@gmail.com

www.didinho.org

   CIDADANIA  -  DIREITOS HUMANOS  -  DESENVOLVIMENTO SOCIAL