À GUINÉ-BISSAU (2)

 

 Entre o golpe político e judicial e o golpe militar, o passo curto da mentira

 

Rómulo Rosa  

rosaromulo1@gmail.com

10.05.2012

Denunciáramos o golpe constitucional, civil-político e judicial anti-Constituição, dos decisores políticos e institucionais, quer na apresentação da candidatura quer na corrupta e incompetente decisão dos juízes do Supremo Tribunal de Justiça, na parte que admite a elegibilidade da candidatura do presidente do PAIGC e Primeiro-ministro em exercício de funções, Senhor Carlos Gomes Júnior, e as consequências imediatas no funcionamento do sistema político, democrático e institucional do país.

Manifestáramos, no nosso Ponto de Honra, na questão C), a questão democrática, a nossa indignação perante o erro civilizacional, histórico, democrático e nacional, que acontecia no país, com a ilegal e inconstitucional candidatura oficial, apresentada pelo partido político no poder, no Governo da República, o PAIGC, na pessoa do seu presidente e Primeiro-ministro em exercício de funções, ao órgão soberano Presidente da República da Guiné-Bissau.

Estávamos perante uma situação real e factual de desrespeito flagrante de regras fundamentais da convivência democrática, institucional e política, assim como, do ordenamento jurídico nacional, de regras constitucionais que, pelo menos, existem há mais de uma década e do conhecimento prévio de todos, apenas porque sobreveio uma “oportunidade” que se não podia deixar passar, sem “tentar qualquer coisa”.

O “tentar qualquer coisa”, era e é a nossa conhecida corrupção e impunidade nacional, resumida na nossa língua crioula, de nada ka na sai la. Precisamente, porque se sabe que nada ka na sai la, é que se não deixou de tentar a prevaricação e a impunidade. E conseguiu-se, o erro estava à vista.

Quiseram todos os decisores políticos e institucionais, em conluio com a comunidade internacional mundial, a começar pela Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, a Comunidade Económica dos Estados do Oeste Africano, a União Africana e a Organização das Nações Unidas, sediada no nosso país, coagir, intimidar e substituir, o entendimento nacional livre, e implicar e sujar as mãos de todos os candidatos intervenientes na eleição presidencial de 18-03-2012, tal qual as suas mãos estão sujas, e legitimar o candidato oficial do PAIGC e Primeiro-ministro em exercício de funções, na acéfala e insensata ambição pessoal de chegar ao órgão soberano de Presidente da República, em detrimento do interesse nacional.

Os candidatos intervenientes menos votados em termos relativos, na eleição presidencial referida, numa inteligente estratégia de juntarem-se e reivindicar em conjunto, através da reclamação nos termos da Lei Eleitoral para Presidente da República e Assembleia Nacional Popular, após a confusa votação eleitoral, reintroduziram, no que podiam fazer, o PAIGC e o seu candidato oficial, o Governo da República e o seu candidato oficial, a Comissão Nacional de Eleições e o seu candidato oficial e o STJ e o seu candidato oficial, na legalidade da ordem jurídica nacional e baralharam as contas do candidato oficial. O processo eleitoral e a eleição deixaram de ser um passeio e passou a ser levado a sério.

A manipulação dos factos e a desinformação dos cidadãos nacionais no país e estrangeiros fora do país, que o PAIGC, o Governo da República, a comunidade internacional, através dos denominados observadores internacionais e os órgãos de comunicação social públicos e privados, nacionais e estrangeiros, levaram a cabo, e o assassínio no dia das votações do funcionário público, o Coronel Samba Djaló, contribuiram sobremaneira para a existência do stress eleitoral que se verificou sobre uma população maioritariamente analfabeta e que sofre de iliteracia, após o acto eleitoral do dia 18-04-2012.

A Televisão da Guiné-Bissau ( http://www.televisao-gb.net/ ), a Rádio Nacional e o jornal Nô Pintcha, quer na edição impressa (facto que confirmámos) quer na edição electrónica (http://www.jornalnopintcha.com/), os órgãos de comunicação social portugueses, por exemplo, a Rádio e Televisão de Portugal, no canal África, através da delegação na Guiné-Bissau, a Radiodifusão Portuguesa, através da RDP – África, os jornais portugueses Diário de Notícias, Correio da Manhã, o jornal diário desportivo A Bola, o semanário Sol, todos sem excepção, contribuiram com conteúdos factuais para a desinformação, a manipulação e o branqueamento dos factos reais, a favor do candidato lusófono, num primeiro momento (antes do dia da eleição), e em prejuízo dos candidatos reclamantes menos votados e a favor do candidato oficial lusófono, num segundo momento (depois do dia da votação). Por exemplo, todos referiam-se ao Primeiro-ministro Carlos Gomes Júnior, como ex-Primeiro-ministro, e candidato, sem questionar como, sabendo todos que o país estava numa situação de excepção constitucional, devido à morte do PR Malam Bacai Sanhá.

Os candidatos menos votados conseguiram, não obstante o tamanho confinamento e isolamento na opinião publicada lusófona, a uma só voz e antes que fossem pulverizados individualmente pelo esquema montado, apresentar as suas reclamações em relação ao processo e ao acto eleitoral, de acordo com os trâmites legais, e obter das instituições da República afectas ao processo eleitoral, a confirmação oficial da farsa eleitoral montada.

A tentativa da consumação do golpe civil, político e judicial anti-Constituição da República, estava em marcha. Todos os actos materiais conscientes, activos e omissivos, foram praticados para o fim querido, restando a consumação da inconstitucionalidade, com a realização da segunda volta do acto eleitoral e a tomada de posse do candidato oficial do PAIGC e do Governo da República, o Primeiro-ministro em exercício de funções.

 

Golpe militar de Estado

Para sermos o mais transparente possível no entendimento dos vários e sucessivos acontecimentos, eis a sequência dos factos que dispomos, sendo que uns foram anteriores, outros simultâneos e outros posteriores, a todo o período que começa com o desaparecimento físico do Presidente da República, o Senhor  Malam Bacai Sanhá, sem, contudo, olvidar as relações informais de conveniência à volta da mesa do poder.

O propósito, nesta análise, é o de “entender” a situação de golpe militar de Estado, que sobreveio ao país, a 12-04-2012.

A) Assunto de Estado: Governo, Ministério da Defesa Nacional, as Forças Armadas Revolucionárias do Povo (FARP) e a cooperação com Angola - rearmamento da MISSANG.

B) Falecimento por doença do Presidente da República Malam Bacai Sanhá; e

 Assumpção da presidência da República, por via constitucional, do presidente da ANP, o Senhor Raimundo Pereira.

C) Processo eleitoral:

a)    Preparação do processo eleitoral no âmbito da lei eleitoral do país (Lei Eleitoral para Presidente da República e Assembleia Nacional Popular, Lei nº. 3, de 23 de Abril de 1998, publicada no Suplemento ao Boletim Oficial, nº. 17, de 28 de Abril de 1998);

b)    Dia de voto: um candidato vencedor destacado.

c)    Reclamações:

- 5 candidatos reclamantes;

- Período das reclamações;

- Comportamento da CNE.

d)  - Convocação pelo PR Interino de uma reunião entre órgãos de soberania e de entre eles, um candidato, as FARP, os candidatos reclamantes e mais convidados, para análise da situação do momento no país;

- Comunicado do Conselho de Ministros;

- Comunicados do PAIGC.

D) A carta secreta e o golpe militar de Estado.

Outros factos temos presente, mas desconhecemos os momentos respectivos em que aconteceram, por exemplo, o acordo de cooperação militar entre Angola e Guiné-Bissau, a chegada das armas pesadas ao território nacional para a Missang, a detecção das mesmas pelas FARP, todas as situações e comunicações despoletadas por tais acontecimentos, o comportamento atrevido e irresponsável do embaixador de Angola na Guiné-Bissau e a informação de tal comportamento, pelo CEMGFA, ao PR interino, e a data da carta secreta.

 

Temos que, o Presidente da República interino tinha perante si, em sua mesa de trabalho, dois assuntos de Estado, fundamentais e decisivos, que o momento político, o país e os governantes tinham que encarar e decidir, a saber: o rearmamento da Missang à margem do acordo e que, aparentemente, havia sido já denunciado pelo Estado-Maior General das FARP, e que o Governo aparentava ignorar ou ia protelando, e a questão da substituição do Presidente da República Malam Bacai Sanhá, por via de eleição presidencial.

A decisão por que opta o PR interino é misturar os dois assuntos de Estado e lançar a confusão, à semelhança do que havia feito, quando decidiu, patética e inconstitucionalmente, comparecer na reunião partidária e votar na eleição da escolha do candidato do partido político a que pertence para a eleição presidencial. Ao invés de honrar e dignificar o órgão Presidente da República e manter a equidistância constitucional exigida e exigível, preferiu ser militante de partido político interessado e exercer o voto partidário.

Tal comportamento permitiu constatar que, uma vez mais, os governantes nacionais não concentram as suas energias e saberes na busca e apresentação de respostas para a resolução de problemas nacionais, de maneira razoável e de acordo com o interesse nacional mas, focam-se em comportamentos banais, errantes e egoístas, criadores de mais problemas, de desconfiança e de ódio, entre as instituições e os cidadãos nacionais na sociedade.

 

Os dirigentes políticos, governantes nacionais e institucionais, não percebem que a evolução aconteceu na sociedade nacional e que, por causa do sistema democrático, político e partidário nacional vigente, à semelhança que acontece em outras democracias representativas do globo, isto é, a atrofia dos partidos políticos às sociedades, estas actualmente sentem-se sufocadas, precisam de respirar e exigem outras respostas, exigem Liberdade, mas também Responsabilidade e Responsabilização.

Ainda este Presidente da República interino, para um mandato de pouco mais que dois meses, inventou mais de uma dezena de cargos para conselheiros, à custa do erário público, tamanha era a responsabilidade para si.

A inteligência crítica nacional, interna e externa, que o país dispõe actualmente, apesar das elevadas taxas de analfabetismo interno, é de tal maneira diversa e acentuada que, de longe, a classe política toda em conjunto não está à altura de aproveitar, representar ou servir. O desnível entre essa inteligência crítica nacional e a classe de políticos e de dirigentes, e o conjunto de exigências que se requer e o escrutínio a que os dirigentes e a classe de políticos, hoje, estão sujeitos, através de todos os meios e formas imaginários, é de tal ordem, que os mesmos não estão em condições de dar resposta ou de absorver. Por isso, os dirigentes continuam a governar para a maioria da população analfabeta e com iliteracia, e aos quais vão sempre pedir o voto, comprando e iludindo-os.

A resposta que os mesmos dirigentes e a classe de políticos nacionais oferecem ao país, às suas gentes, às suas aspirações de vida e de futuro e às suas esperanças, é a confrontação, a criação do clima do medo, o enraizamento da desconfiança entre cidadãos e o obscurantismo, a instrumentalização ilegal dos órgãos do Estado, a agressão, psicológica e física, a prisão e o assassínio sumário de colegas políticos e de funcionários públicos de que outrora se serviram. É esta a resposta dada à pretensão e à busca da participação livre no processo de desenvolvimento político, social, económico e cultural do país, que o cidadão simples ávido de respostas e de Liberdade recebe em troca.

Como procurámos demonstrar em outro lugar, a origem e a natureza do nosso Estado político é monolítica, e é exactamente, a nosso ver, por onde devemos começar a cuidar da ideia de mudança de paradigma e do que pretendemos para o aparelho do Estado e uma sociedade livre. O que até agora temos, é o monolitismo e o Grande Irmão, que sabe o que é bom para todos e a cada momento decide por nossa conta, apesar da roupagem democrata. A escola e o exemplo políticos dos dirigentes políticos actuais é o monolitismo. Essa é a escola e a prática do Estado político da República da Guiné-Bissau. É a democracia do Boé que manda.

Decerto, haverá outras áreas de governação do país problemáticas para atender, mas se não resolvemos a questão política crucial da convivência e da violência na política entre os governantes, e entre estes e os governados, estaremos até ao próximo século para entendermo-nos e não teremos evoluído no essencial.

A nosso ver, e regressando ao primeiro assunto de Estado acima mencionado, o rearmamento da Missang é anterior ao falecimento do PR Malam Sanhá, apesar do próprio estar debilitado pela doença, e o Governo era o único órgão de soberania neste período temporal, em pleno exercício de funções, com atribuições para decidir sobre um e outro problemas fundamentais do país. Porém, o que fez e onde estava o mesmo?

Aquele preferiu furtar-se conscientemente às suas atribuições e candidatar-se oportunisticamente a outro órgão de soberania, entretanto vago. Com este comportamento, o Governo, por um lado, em relação ao problema do rearmamento da Missang, deixou as FARP à sua sorte, e, por outro lado, em relação ao processo eleitoral iniciado, passou a ser árbitro e jogador, simultaneamente.

Em qualquer dos dois assuntos, o Primeiro-ministro simulou ausência e sacudiu para o lado: num, porque não interessa resolver, ou tem um plano B e, no outro, porque lhe interessa e é candidato, furta-se à governação. Se não era tão ridícula a candidatura, porque não concorrer na qualidade de Primeiro-ministro, ao invés de simular nomeação de nomear outrem, ilegal e inconstitucionalmente, para a respectiva substituição?

Como vemos, é nesta conjuntura e contexto governativo, com assuntos importantíssimos do país por resolver, para não mencionar outros, que acontece o golpe militar de Estado.

A nossa postura quanto ao golpe militar de Estado, levado a cabo pela sub-instituição do Estado, o Estado-Maior General das FARP, auto-intitulado “Comando Militar”, não é de ilusões, e gostaríamos de afirmar que, se é que a nossa opinião importa, a censura política que dispensamos ao mesmo é exactamente igual e proporcional à censura jurídica e política ao golpe civil, político e judicial, de Estado e anti-Constituição da República, que neste espaço, www.didinho.org , tivemos a oportunidade de, juridicamente, denunciar e que se consubstanciou na apresentação da candidatura oficial do Primeiro-ministro em exercício de funções da República da Guiné-Bissau e presidente do PAIGC, e a respectiva apreciação e juízo “jurídico” da sua elegibilidade pelo STJ.

Particularmente, preferiríamos que tudo se realizasse conforme o guião preparado pelo Governo candidato e o candidato oficial do PAIGC, e continuar a denunciar, juridicamente, as várias fases, os momentos, do processo de inconstitucionalidade em curso, até ao momento da consumação da violação consciente da Constituição política da República da Guiné-Bissau, a montante, pelo Primeiro-ministro em exercício de funções e, a jusante, pelo novo Presidente da República eleito, simultaneamente, uma e a mesma pessoa, senhor Carlos Gomes Júnior, num mesmo Estado político e num mesmo período de tempo, em pleno século XXI. Seria um facto inédito no mundo contemporâneo “democrático”.

Estava toda a gente, o Governo da República e parte do partido que legitimamente o apoia na ANP, o PAIGC, e os seus apoiantes, a “andar com os pés a um palmo do chão” (ver www.didinho.org , Nô djunta mon, Filomeno Pina, a 09-02-2012,), e a furtarem-se consciente e oportunisticamente aos cargos e às funções governativas, em favor dos interesses pessoais e partidários, em detrimento do colectivo e do nacional, para o qual o Governo, Primeiro-ministro e ministros, havia sido investido constitucionalmente, pelo Presidente da República, o General João Bernardo Vieira, quando acontece, “do nada”, o golpe militar, e as mesmas gentes, quais inocentes, voltaram aos seus lugares ou foram obrigados a colocar os pés no chão, e às respectivas legitimidades democráticas.

As condenações ao golpe militar de Estado foram tantas e tão hipócritas, a nosso ver, que gostaríamos de interrogar àqueles que vociferaram  a bandeiras despregadas a sua indignação, se a legitimidade política e democrática, obtida nas urnas eleitorais por partidos políticos, quando não adulteradas, comporta ou pressupõe a intimidação pública, a perseguição de toda a espécie, a agressão e o assassínio político de concidadãos que participam, através do seu entendimento político diferente do partido político no poder, no debate sobre a governação e nos destinos opcionais do país, ou ainda, se aqueles comportamentos e práticas constam do programa político de governação, apresentado pelos partidos políticos e sufragado pelos eleitores.

Assim como, gostaríamos de interrogar ainda, se a legitimidade política e democrática, obtida na urna eleitoral por partidos políticos, comporta ou pressupõe também tamanha desgovernação, como o abandono  consciente, ilegal e inconstitucional, de funções da chefia do Governo da República, para ilegal e inconstitucionalmente, nomear outrem, e ilegal e inconstitucionalmente, apresentar candidatura ao órgão soberano Presidente da República e, ilegal e inconstitucionalmente, a elegibilidade do mesmo candidato ser “homologada”, pelos juízes do Supremo Tribunal de Justiça.

O que está em causa, cremos, por responsabilidade política e jurídica dos dirigentes políticos do nosso país, mais que o respeito pela diferença de pensar e defesa do mesmo pensamento, é o respeito pela Pessoa Humana, pela Vida e sua dignidade. Infelizmente, tamanha é a ganância e o apego ao poder.

Lamentamos que, no período de uma legislatura parlamentar e de mandato governamental do país pelo PAIGC, tenham acontecido dezenas de perseguições, agressões e assassinatos de políticos e militares, assim como violações da Constituição política nacional, pelos mesmos protagonistas políticos. Repudiamos convictamente estas práticas. Se a isto afirmamos governança pública, por causa dos salários pagos, então, obrigado.

As manifestações, as campanhas e as declarações, a favor da reposição da (des)ordem legal e constitucional, eram o reflexo da domesticação, do oportunismo momentâneo e do egoísmo, dos que estavam prontos para fazer o assalto ao poder e o saque aos recursos públicos do país.

Dois exemplos de reacções ao golpe militar de Estado, para não sermos exaustivos:

a) as associações sindicais de vários sectores de actividade profissional, como os dos professores, do pessoal de saúde, dos juízes e outros, que,  perante o cenário de abandono do Governo pelo Primeiro-ministro para a candidatura presidencial, e durante o processo eleitoral todo, iniciaram paralisações generalizadas e prolongadas em vários sectores de actividade, com o golpe militar, e com o país paralisado, não deixaram de manifestar posicionamentos hipócritas, oportunísticas e egoístas, de reivindicação do salário, perante o problema nacional que sobreveio;

b) o Hospital Nacional Simão Mendes, uma vergonha em todos os sentidos de instituição hospitalar de referência nacional e de falta de competência e autoridade de Estado, com pouco mais de dois dias depois do golpe militar, começou a ser alvo de aproveitamento popular oportunístico com campanhas e ofertas de gente que, em condições normais, viaja para o exterior do país, para ser consultada, ao invés de exigir mais e melhor hospitais em tempos de acalmia. Mas o sintomático é que, com três anos e meio de mandato governamental cumpridos, nada de comprovável melhorou nesse hospital, como as próprias campanhas confirmaram.

Em relação à motivação do golpe militar de Estado propriamente dito, o que sabemos hoje é que, afinal, a carta secreta existiu e não passou pela ANP, em matéria da sua competência exclusiva, e o seu conteúdo encerra inverdades e oportunismos.

Os seus autores, mandantes e executantes, existem, assim como, o seu secretismo é flagrante, sendo que, a posteriori, haveria o facto consumado para os militares e o país. O conteúdo justificativo da missiva, em nosso entender, é ignóbil, porque tem o objectivo de mudar a modalidade e a natureza da força militar Missang no terreno, sem passar pela ANP, num problema que é anterior à morte do Presidente Malam Sanhá e, consequentemente, ao processo eleitoral, mas apanha a boleia do processo eleitoral em curso.

Se a caravana governamental oficial do candidato oficial havia feito o percurso presidencial na prepotência, na ilegalidade e na inconstitucionalidade, sem qualquer impedimento dos demais candidatos, como poderiam esses mesmos candidatos serem os desestabilizadores e a causa da instabilidade institucional, política, social e militar, no país? Acaso a reivindicação e as reclamações foram realizadas à margem das leis vigentes e das instituições no país?

Se isto é verdade, por um lado, não menos verdade, foram os comunicados agressivos e violentos, próprios de trincheira e guerrilha, quer do Conselho de Ministros quer do partido político no Governo, o PAIGC, em relação às FARP. Notória era a falta de confiança e de diálogo mútuos, pois, o Governo estava em campanha política para o mundo internacional, como gostava, e não para o mundo nacional.

O que sabemos hoje também, é que o passo curto da mentira não demorou a ser descoberto e desmascarado, porque os protagonistas verdadeiros já se acusam mutuamente, mentem e desmentem-se e contradizem-se. Pena é que, pelo caminho, procuram implicar e sujar as mão de cidadãos que, pelo facto simples de quererem participar no processo de desenvolvimento nacional, não pactuam com as farsas oficiais e as denunciam.

Neste contexto, quando tomámos conhecimento da suposição mentirosa, difamatória e criminosa, da autoria do ex-ministro da República, o Senhor Mamadu Djaló Pires, veiculada pela RTP, como órgão oficioso de propaganda do candidato governamental, em relação ao Senhor Henrique Pereira Rosa, nosso familiar, sabíamos que se agia em desespero e na impotência perante um facto consumado, o golpe militar de Estado. Era a tentativa, outra vez, de sujar as mãos de terceiros aos olhos da audiência distraída, em responsabilidades governativas próprias.

Não tardou que, um dos protagonistas do momento da actual situação dramática do país e alvo da declaração do ex-ministro, o conselheiro para a área jurídica do Primeiro-ministro, o Senhor Carlos Pinto Pereira, viesse defender-se e, de caminho, falar a verdade em relação ao cidadão Henrique Pereira Rosa. Porém, acto contínuo, o senhor conselheiro não deixou de vitimizar-se da situação, reclamar inocência e censura, no seu “direito de resposta”, publicado no sítio www.didinho.org , relativamente aos órgãos de comunicação social nacionais, agora, nas mãos do novo poder.

O que importa notar e questionar, por agora, entre comentários, cartas secretas, notinhas publicadas e “direito de resposta”, é o seguinte: por onde andou o conselheiro jurídico quando, com o início do processo eleitoral e à margem da Lei Eleitoral para Presidente da República e Assembleia Nacional Popular, todos os candidatos presidenciais, com excepção do candidato oficial governamental e aconselhado por si, foram objecto de censura nos órgãos de comunicação social públicos do país (Televisão, Rádio Nacional e Imprensa, escrita e electrónica), sem que tivesse denunciado tal situação de ilegalidade e de censura. Se tivesse denunciado tal ilegalidade e censura naquele momento e contexto, compreenderíamos e aceitaríamos, hoje, a sua denúncia de censura. Mas como afirmou em relação à OA, no seu Comentários ao Parecer Jurídico da Ordem de Advogados da Guiné-Bissau (v. www.didinho.org, Nô djunta mon, Carlos Pinto Pereira, 22-02-2012), procurando, em nosso entender, desacreditar a instituição, “trata-se apenas de uma opinião, como qualquer outra”, “e como opinião que é, vale o que vale, e apenas isso”, ou pretende “influenciar” o juízo popular? Porém, mantenhamos o princípio jurídico da presunção de inocência que anunciou, até prova judicial em contrário.

Hoje, prevalece uma situação de incerteza quanto ao futuro político e militar imediato do país, e sabemos que parte da responsabilidade é resultante da decisão corrupta e incompetente dos juízes do STJ, mas também daqueles que furtaram-se, conscientemente, às suas responsabilidades, uma vez mais. É o que assistimos no país e apostamos ainda que outros se colocarão no lugar de vítimas e lamuriarão, para o gáudio do povo. Ao tempo o seu tempo.

 A questão importante é que os órgãos de soberania, o Presidente da República, a Assembleia Nacional Popular, o Governo da República e o Supremo Tribunal de Justiça, e os seus titulares temporários, estão íntima e directamente vinculados à Constituição política da República, no que às suas atribuições e competências jurídicas e políticas diz respeito, e os seus comportamentos políticos e institucionais têm a extensão e o limite que a própria Lei Fundamental estabelece e permite, mas também reflexo directo na nossa sociedade e na vida das pessoas. Quando há desrespeito às suas regras, há disfuncionamento na governança na Republica.

Permitam-nos, agora, os leitores que, excepcionalmente, façamos um parênteses, no âmbito da nossa participação no debate público sobre o país e o processo eleitoral presidencial, resultante do desaparecimento físico do Presidente da República Malam Bacai Sanhá, para respondermos à expressão do pensamento do nosso amigo Teotónio Silva (Eng. Porto, Portugal), e as ideias veiculadas no seu artigo “Terra queimada”, publicado no www.ditaduradoconsenso.blogspot.com , no dia 29-04-2012. Tomámos esta opção, porque a pessoa identificou-se e conhecemos a pessoa, assim como ela a nós.

Salvaguardando o direito individual que assiste a Teotónio Silva, de pensar e expressar o pensamento, gostaríamos de, directamente, dizer e recomendar-lhe o seguinte:

1) que assistimos aos mesmos acontecimentos que afirma ter assistido no país, à excepção da presidência Luis Cabral;

2) que se informe melhor sobre a pouca vergonha por que passou o processo eleitoral presidencial de 18-03-2012, depois da morte do PR Malam B. Sanhá;

3) que se informe da situação vergonhosa de cumulação de cargos e funções, de incompatibilidade e conflito de interesses, do seu familiar nos órgãos judiciais do aparelho do Estado da Guiné-Bissau; neste caso, dirigimo-nos nestes termos, porque há consciência e aproveitamento profissional, social e material, a exemplo de muitos no nosso país pelos respectivos protagonistas, em detrimento de conterrâneos igualmente qualificados, mas sem igualdade de oportunidades. A nosso ver, isso é que é “terra queimada” para o país;

4) Questão: se lhe “limpassem”, sumariamente ou não, algum membro da sua família, ficaria acrítico e conivente com a situação, na sociedade onde vive ou tal não seria “terra queimada”, em seu entender?

5) que pense pela própria cabeça e não viesse para o debate público com estados de alma, próprios de momentos, mas com factos e argumentos consistentes, e evitasse ser objecto de desinformação, manipulação e de branqueamento dos factos.

Não resistimos à tentação de recomendar-lhe mais e melhor informação sobre o país e sobre o percurso de vida privada-laboral e de serviço público ao país do cidadão, o senhor Henrique Rosa, ainda que este espaço não seja o apropriado nem nós devamos ser o seu representante. Conhecemos o nosso humilde lugar e daí não saímos.

O serviço público ao País não deve ser um acto de desespero, do tudo ou nada, mas sim, como o senhor Henrique Rosa procurou demonstrar quando serviu o país, no período temporal de 28 de Setembro de 2003 a 01 de Outubro de 2005, um acto de honestidade, de humildade, de patriotismo, de honra ao compromisso e à palavra dada. Quando terminou o mandato com que lhe honraram, no exercício da mais alta magistratura nacional, voltou para a sua vida de trabalho e de família. Pessoalmente, agradecemos o exemplo excepcional, que pudemos acompanhar, na qualidade de cidadão do país e na qualidade de seu familiar.

A nossa palavra é, neste momento, de serenidade, de verdade e de confiança, nos Homens e no nosso país.

O país que preconizamos edificar em cada oportunidade com a nossa intervenção, enquanto cidadão livre do nosso país e do mundo, é um país de Liberdade, de Justiça real e factual, de Verdade, de Ordem e de Prosperidade, onde o cumprimento de regras públicas, a transparência e a busca da igualdade de oportunidades sejam iguais para todos, e não apenas para uns tantos “craques” ou filiados em partidos políticos A ou B.

De exemplo mundial de inteligência e coragem, na luta de libertação nacional contra o poder colonial português,  na manifestação da autodeterminação do nosso povo e país, somos hoje, enquanto país e cidadãos, objectos de decisão de terceiros e de interesses alheios ao interesse nacional verdadeiro. Trazemos gente para casa, mas não sabemos quem trazemos.

Estamos certos que, apesar da encruzilhada por que o país actualmente passa, por causa dos egoísmos de uns, iremos emergir mais fortes enquanto povo que busca o seu horizonte, com os espinhos todos que o caminho dessa busca encerra, e com uma certeza: se há lição nacional que devemos retirar e reter ilações, é aquela respeitante à situação de guerra civil que vivemos e sofremos, enquanto povo em 1998-1999. Por isso, por mais CPLP’s, CEDEAO’s, UA’s e ONU’s, com certeza, não gostam mais de nós, que nós de nós próprios, e como guineenses recusemos a opção da beligerância, interna ou externa, e resolvamos a situação nacional pela ousadia da responsabilidade e responsabilização dos protagonistas, através dos órgãos de Estado existentes e do diálogo político honesto e decisor.

Por fim, gostaríamos de manifestar, de forma pública, a nossa gratidão pessoal aos inúmeros colegas, amigos e familiares, que, através de telefonemas e e-mails, não hesitaram em manifestar a sua indignação e solidariedade, perante a difamação criminosa a que foi sujeito o senhor Henrique Rosa, nosso familiar, e um dos candidatos para a eleição presidencial antecipada, realizada no país a 18-03-2012, pelo ex-ministro da República, o senhor Mamadú Djaló Pires. Infelizmente, este senhor só existe na sociedade quando é poder, e à custa de todos nós, assim como outros seus colegas da política nacional.

A incivilidade dos homens fez-nos chegar onde estamos, esperemos e votemos que o nosso país alcance melhor sorte no seu futuro, com todos os seus filhos e instituições em Liberdade e Justiça real e factual.

 

Rómulo Pereira Rosa

 

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